Opinião

Impactos tributários no desinternamento de mercadorias para consumo interno na ZFM

Autor

7 de março de 2024, 13h13

A Zona Franca de Manaus (ZFM), criada pelo Decreto-Lei nº 288/1967, tem como objetivo incentivar o desenvolvimento de um centro industrial, comercial e agropecuário na região amazônica. Desde sua criação, testemunhou o estabelecimento de um parque industrial sofisticado e moderno, com diversas empresas operando na localidade.

Entre os benefícios concedidos pela ZFM, destaca-se a isenção e redução de impostos sobre produtos e mercadorias destinadas ao consumo interno, dentro da circunscrição da ZFM.

No âmbito federal, o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) são reduzidos a zero sobre as receitas de vendas para consumo interno na ZFM, conforme o artigo 2º da Lei 10.996/2004. O Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) é isento quando destinado ao consumo interno ou industrialização, segundo o artigo 81, III do RIPI [1].

No âmbito estadual, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é isento na saída de produtos destinados à comercialização ou industrialização na ZFM, conforme o Convênio ICMS nº 065/1988 e Ato Declaratório nº 008/1988.

Para usufruir desses incentivos fiscais, as empresas devem seguir um procedimento administrativo denominado “internamento da nota fiscal”, conforme estabelecido na Portaria Suframa nº 834/2019. Esse procedimento, iniciado mediante solicitação no sistema eletrônico do SIMNAC, antecede o envio da mercadoria à ZFM, permitindo à Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) fiscalizar se o produto será efetivamente comercializado internamente.

Entretanto, os artigos 32 [2] e 33 [3] da Portaria Suframa nº 834/2019 preveem a possibilidade de desinternamento da nota fiscal quando a mercadoria é reintroduzida no mercado interno antes do prazo de cinco anos para o ICMS ou três anos para o IPI.

Spacca

Por sua vez, para PIS/Cofins, não há um prazo mínimo de permanência. A redução a zero da alíquota está condicionada à efetiva comercialização interna.

A Portaria Suframa nº 834/2019 [4] dispõe também que o estabelecimento que tiver dado causa ao desinternamento recolherá o imposto. Portanto, a empresa que desejar retirar sua mercadoria antes de observada as condicionantes impostas terá que proceder o recolhimento dos respectivos tributos.

No caso do IPI, a responsabilidade pelo pagamento recai sobre a empresa que destina o produto de maneira divergente da exigida para a conversão em isenção, conforme os artigos 33, II da Portaria Suframa nº 834/2019 [5] e 42 do Decreto nº 7.212/2010 [6]. Em relação ao ICMS, a reintrodução da mercadoria ao mercado interno sujeitará a empresa ao pagamento do imposto ao estado de origem, conforme cláusula décima nona do Convênio ICMS nº 134/2019:

Cláusula décima nona: Na hipótese de o produto internado vir a ser reintroduzido no mercado interno, antes de decorrido o prazo de 5 (cinco) anos de sua remessa, o estabelecimento que tiver dado causa ao desinternamento recolherá o imposto, com atualização monetária, em favor da unidade federada de origem.

Não cumulatividade

É importante destacar a lacuna normativa inerente a possibilidade de aproveitamento de créditos decorrentes da situação de afastamento da isenção, em conformidade com o princípio da não cumulatividade. Nesta hipótese, caso o Estado do Amazonas determine a glosa do crédito, seria possível o questionamento judicial da legalidade ou constitucionalidade vinculada a vedação ao crédito, por ferir cristalinamente o princípio da não cumulatividade.

Quanto às contribuições ao PIS e à Cofins, a desinternação da mercadoria, considerada desvio de finalidade, sujeita a empresa ao pagamento dos tributos e penalidades previstas, conforme o artigo 22 da Lei nº 11.945/2009 [7].

Entretanto, em alguns casos, decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) indicam que o impacto real da empresa resulta apenas no pagamento da multa e juros de mora, posto que o efetivo recolhimento permitirá o aproveitamento do crédito decorrente da não cumulatividade:

[…] Ora, se a recorrente não pagou o PIS e a Cofins por ocasião das entradas (primeira infração), não há crédito a ser aproveitado na seguinte. Não obstante, caso não obtenha êxito na contestação da primeira infração e venha a pagar as contribuições ao fim do litígio, a partir de então terá direito a compensá-los. […] (Acórdão nº 3301-006.498 — 3ª Seção de Julgamento / 3ª Câmara / 1ª Turma Ordinária — Sessão de 23/07/2019 — relator conselheiro Marcelo Costa Marques d’Oliveira).

Em resumo, embora o recolhimento dos tributos seja claramente estabelecido pela legislação quando do desinternamento, é possível mitigar os impactos tributários relativos a ICMS e PIS/Cofins, especialmente em virtude da não cumulatividade.

 


[1] Art. 81.  São isentos do imposto (Decreto-Lei n o 288, de 28 de fevereiro de 1967, art. 9 o , e Lei n o 8.387, de 1991, art. 1 o ):

III – os produtos nacionais entrados na Zona Franca de Manaus, para seu consumo interno, utilização ou industrialização, ou ainda, para serem remetidos, por intermédio de seus entrepostos, à Amazônia Ocidental, excluídos as armas e munições, perfumes, fumo, automóveis de passageiros e bebidas alcoólicas, classificados, respectivamente, nos Capítulos 93, 33 e 24, nas Posições 87.03 e 22.03 a 22.06 e nos Códigos 2208.20.00 a 2208.70.00 e 2208.90.00 (exceto o Ex 01) da TIPI (Decreto-Lei nº 288, de 1967, art. 4º , Decreto-Lei n o 340, de 22 de dezembro de 1967, art. 1 o , e Decreto-Lei n o 355, de 6 de agosto de 1968, art. 1 o ).

[2] Art. 32 Considera-se desinternada a NF-e com incentivo de ICMS, cujo produto: I – for reintroduzido no mercado interno, antes de decorrido o prazo de 5 (cinco) anos de sua remessa;

[3] Art. 33 Considera-se desinternada a NF-e com incentivo de IPI, cujo produto: I – for reintroduzido no mercado interno, antes de decorrido o prazo de 3 (três) anos de sua remessa;

[4] https://www.gov.br/suframa/pt-br/sistemas/simnac/legislacao/portaria-no-834-de-16-de-outubro-de-2019-que-revoga-a-portaria-no-529-2006/@@download/file

[5] Art. 33 Considera-se desinternada a NF-e com incentivo de IPI, cujo produto: II – tiver saído das áreas incentivadas administradas pela Suframa para ns de transferência, locação, comodato ou outra forma jurídica de cessão.

[6] Art. 42.  Quando não forem satisfeitos os requisitos que condicionaram a suspensão, o imposto tornar-se-á imediatamente exigível, como se a suspensão não existisse (Lei nº 4.502, de 1964, art. 9º, § 1º, e Lei nº 9.532, de 1997, art. 37, inciso II ). § 1 o Se a suspensão estiver condicionada à destinação do produto e a este for dado destino diverso do previsto, estará o responsável pelo fato sujeito ao pagamento do imposto e da penalidade cabível, como se a suspensão não existisse.

[7] Art. 22.  Salvo disposição expressa em contrário, caso a não-incidência, a isenção, a suspensão ou a redução das alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep, da Cofins, da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação for condicionada à destinação do bem ou do serviço, e a este for dado destino diverso, ficará o responsável pelo fato sujeito ao pagamento das contribuições e das penalidades cabíveis, como se a não-incidência, a isenção, a suspensão ou a redução das alíquotas não existisse.

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!