Opinião

Análise sobre revisão disciplinar de ofício pelo CNJ

Autor

  • Alexandre Pontieri

    é advogado com atuação nos Tribunais Superiores (STF STJ TST e TSE) no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) consultor da área tributária com foco principalmente no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) pós-graduado em Direito Tributário pelo Centro de Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU (CPPG) em São Paulo e pós- graduado em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo (ESMP-SP).

30 de janeiro de 2024, 21h17

Em 16 de setembro de 2022, tivemos a oportunidade de publicar um artigo no portal da ConJur com o seguinte título: “Revisão disciplinar e rito de julgamentos das classes processuais do CNJ” [1].

No referido artigo destacamos à época que “uma das classes processuais mais utilizadas no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é a revisão disciplinar — que tem previsão regimental nos artigos 82 a 88” [2].

Destacamos, assim como fizemos anteriormente, que o artigo 82 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) dispõe que “poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano do pedido de revisão”.

Condições para a revisão
Já em relação à admissão de revisão disciplinar, o artigo 83 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ), dispõe que a revisão dos processos disciplinares será admitida:

  1. Quando a decisão for contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normativa do CNJ;
  2. Quando a decisão se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
  3. Quando, após a decisão, surgirem fatos novos ou novas provas ou circunstânccias que determinem ou autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem.

O artigo 86 do RICNJ dispõe sobre a possibilidade da instauração de ofício da revisão disciplinar, tendo o seguinte teor o dispositivo regimental: “a instauração de ofício da revisão de processo disciplinar poderá ser determinada pela maioria absoluta do Plenário do CNJ, mediante proposição de qualquer um dos Conselheiros, do Procurador-Geral da República ou do Presidente do Conselho Federal da OAB”.

Limitação temporal
Como cediço, o CNJ possui competência disciplinar originária e concorrente, podendo instaurar de ofício, avocar ou revisar procedimentos disciplinares, sem prejuízo da atuação das corregedorias locais.

Pois bem. Como já havíamos indicado anteriormente, o artigo 82 do RICNJ dispõe que “poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano do pedido de revisão”.

Ou seja, em relação ao conhecimento da revisão disciplinar, a limitação temporal é do prazo decadencial de um (01) ano, sendo essa limitação, salvo melhor juízo, tanto para a parte que pretende propor uma revisão disciplinar perante o Conselho Nacional de Justiça, bem como ao próprio CNJ, quando pretende instaurar tal procedimento de ofício.

Todavia, temos acompanhado julgamentos do plenário do CNJ e observamos que a questão do prazo decadencial para a instauração de ofício de revisões disciplinares pelo Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) sofreu um “alargamento” em relação ao prazo decadencial.

Quando do julgamento do Pedido de Providências (PP) nº 10349-91.2020 na 352ª Sessão Ordinária — julgado em 07.06.2022 — o plenário do CNJ entendeu que “mesmo tendo decorrido mais de um ano da decisão de arquivamento no Tribunal de origem, o Conselho Nacional de Justiça pode analisar a matéria disciplinar, visto que (a) o prazo decadencial (artigo 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição) só se aplica se houve instauração de processo administrativo disciplinar na origem e, ainda que assim não se entenda, (b) a decisão que determina a notificação do reclamado para defesa inicia o procedimento de revisão de ofício”[3].

Já no julgamento da Revisão Disciplinar 1932-81.2022 na 4ª Sessão Ordinária de 2023 — julgado em 28.02.2023 —, o plenário do CNJ entendeu que “uma vez preenchidos os requisitos regimentais, não há falar em juízo recursal e/ou em utilização indevida da revisional como sucedâneo recursal”, e ainda, que, “o prazo decadencial estabelecido no artigo 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição, replicado no artigo 82 do RICNJ, é para a instauração da revisão disciplinar e não para a instauração de processo administrativo disciplinar”[4].

Vejamos, como exemplo, o entendimento do CNJ sobre a questão da tempestividade em revisão disciplinar proposta por magistrado: “o acórdão em face do qual são inadmissíveis recursos se torna definitivo no momento de sua publicação, de modo que a insatisfação do Magistrado com o resultado do julgamento e a sucessiva interposição de recursos incabíveis e protelatórios não têm o condão de postergar a data de trânsito em julgado da decisão” (CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0005339-32.2021.2.00.0000 – Rel. GIOVANNI OLSSON – 5ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 11/04/2023).

Pensamos, com as vênias de praxe, que é necessária uma paridade de armas para a defesa — pois, salvo melhor juízo, a parte não pode ser prejudicada pelo entendimento que “alarga” o prazo decadencial quando a revisão disciplinar é proposta de ofício pelo órgão censor.

Via estreita
Outro ponto que temos tentado superar diz respeito à admissão da revisão disciplinar com a superação dos requisitos do artigo 83 do RICNJ.

Não é incomum como defesa militante perante o CNJ vermos acórdãos seguindo o entendimento de que “o Conselho Nacional de Justiça não é instância recursal ordinária dos julgamentos de natureza disciplinar realizados pelos Tribunais” [5] o que, para nós que atuamos como advogados perante o CNJ, acaba, em nossa visão, limitando que as partes que optam pelo caminho da revisão disciplinar encontre(m) uma via mais estreita (seja pela necessidade de superação do artigo 83 do RICNJ, ou pela obrigatória observância do prazo decadedencial do artigo 86 do RICNJ).

Ao contrário, pelo menos em nossa opinião, é que, quando as revisões disciplinares são instauradas de ofício pelo próprio CNJ, o órgão de controle do Poder Judiciário vem formando sua jurisprudência no sentido de que se “admite a instauração de revisão disciplinar, quando da análise das informações prestadas pelo órgão censor local constata-se que a sanção aplicada é inadequada ao contexto fático-probatório ventilado nos autos” (CNJ – PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0006185-83.2020.2.00.0000  – Rel. LUIS FELIPE SALOMÃO – 12ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 22/08/2023).

Sobre essa questão — revisão disciplinar de ofício pelo CNJ —, temos defendido perante o plenário do CNJ como advogados atuantes que se evite um bis in idem de natureza persecutória sancionadora, pois, em nossa análise, as revisões disciplinares de ofício acabam trazendo todo um desgaste com a abertura processos de natureza disciplinar(es).

Conclusão
Mas essas são apenas algumas poucas reflexões sobre o tema da revisão disciplinar de ofício pelo próprio CNJ — tema que é estudado, trabalhado e discutido sempre a cada novo julgamento — para que o equilíbrio de forças da defesa e do CNJ encontre a paridade de armas e o equilíbrio necessários nesse trilhar de natureza técnico processual.

São pontos de nossas preocupações: a paridade de armas entre as partes em litígio ou em contraponto processual; a eternização da condição do(s) investigado(s) ou réu(s); a possibilidade de antecipação implícita e por vezes, injusta, do cumprimento de sanção / pena que sequer se sabe se será, ao final, aplicada, a razoável duração do processo (CF/88, artigo 5º, LXXVIII), devido processo legal (CF/88, artigo 5º, LIV), contraditório e ampla defesa (CF/88, artigo 5º, LV), observância dos prazos prescricionais e decadenciais para o(s) réu(s) e sua(s) defesa(s) — de modo a se prestigiar a estabilidade garantida constitucionalmente e legalmente pelo princípio da segurança jurídica, etc.


[1] https://www.conjur.com.br/2022-set-16/alexandre-pontieri-revisao-disciplinar-cnj

[2] https://www.conjur.com.br/2022-set-16/alexandre-pontieri-revisao-disciplinar-cnj

[3] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam?jurisprudenciaIdJuris=53540&indiceListaJurisprudencia=2&tipoPesquisa=LUCENE&firstResult=0

[4] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=3C2CD73608DCA62A5F78C88D8976165A?jurisprudenciaIdJuris=54226&indiceListaJurisprudencia=5&firstResult=10275&tipoPesquisa=BANCO

[5] (CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0001145-52.2022.2.00.0000 – Rel. VIEIRA DE MELLO FILHO – 117ª Sessão Virtual – julgado em 16/12/2022 ).

Autores

  • é advogado com atuação nos Tribunais Superiores (STF, STJ, TST e TSE), no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), pós-graduado em Direito Tributário pelo Centro de Pesquisas e pós-graduação da UniFMU-SP, em Direito Penal pela ESMP-SP e aluno do mestrado em Direito da UnB.

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