Opinião

Saída temporária: dilema entre segurança e ressocialização

Autor

  • Arlei da Costa

    é advogado mestre em Direito e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas desde 2008.

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15 de janeiro de 2024, 6h31

A notícia sobre presos que foram beneficiados com a saída temporária nas festas de final de ano e não retornaram se repete a cada início de ano. A compreensível indignação da sociedade também. Afinal, não seria mais simples e correto impedir essas saídas?

A situação do sistema carcerário brasileiro, terceiro maior do mundo, é complexa e, infelizmente, não comporta soluções simples. Quando o Estado impõe uma pena de prisão ao indivíduo pelo cometimento de um crime, espera-se que ela desempenhe algumas funções: a retribuição pelo mal causado por meio do sofrimento que advém da perda da liberdade; a prevenção, seja pela “neutralização” pelo tempo em que estiver preso, seja pelo exemplo para que outros não ajam como o apenado agiu; e a ressocialização, que seria a sua reinserção na sociedade como indivíduo apto a nela conviver, vez que aprendeu a seguir suas regras. A única função alcançada é a retribuição.

Antônio Cruz/Agência Brasil

As saídas temporárias constituem estratégia para alcance da ressocialização. A ideia é reinserir o indivíduo de forma gradual, com data e hora para retornar à unidade prisional. Não há vigilância, e o retorno voluntário constitui prova de que ele aprendeu a seguir regras, de aptidão para retornar à vida em sociedade. Para isso, alguns requisitos são analisados por juízes após manifestação do Ministério Público. O preso precisa ter cumprido um percentual da pena imposta, que varia de acordo com a gravidade do crime cometido entre 16% a 70%,  vedada para aqueles que cometeram crime hediondo com resultado morte. Além disso, o detento/a deve ter bom comportamento carcerário atestado pela direção do presídio em que se encontra.

No estado de São Paulo, que registra a maior população carcerária do País, 4% dos beneficiados na última saída (1.397 de um total de 33.749) não voltaram para a prisão, índice pouco abaixo da média nacional de 4,66% de não retorno, conforme Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Considerando um índice de acerto de 96%, o Poder Judiciário demonstra ser cuidadoso na concessão. Não se discute que o ideal seria que todos tivessem retornado, mas é preciso lembrar que também não temos o sistema carcerário ideal, com oportunização de estudo, formação profissional e trabalho para aqueles que quisessem seguir um caminho diferente quando voltassem à liberdade.

No mundo real, extinguir a saída temporária resolveria o problema dos 4%, mas nem de longe seria a solução para o também complexo problema da reincidência criminal, que, no Brasil, é de 62,8%, contra média mundial de 55%, conforme dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). A questão, portanto, está longe de ser resolvida.

Autores

  • é advogado, mestre em Direito e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas desde 2008.

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