Competência questionada

TJ-SP não podia ter julgado norma do CNJ, dizem juízas de concurso suspenso

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8 de abril de 2024, 16h05

As juízas que se inscreveram no concurso de promoção voltado para as mulheres da magistratura paulista reiteraram que o Tribunal de Justiça de São Paulo não tinha competência para julgar a resolução do CNJ que instituía as cotas. Essa atribuição cabe apenas ao Supremo Tribunal Federal.

TJ-SP suspendeu aplicação de resolução do CNJ

O argumento é a espinha dorsal da manifestação enviada pelo grupo das mulheres no âmbito do mandado de segurança que debate o tema na corte paulista. Na semana passada, após um empate por 11 a 11, a Corte Especial decidiu, com o voto de Minerva do presidente, suspender o concurso que aplicaria a resolução do CNJ.

O que está em jogo é a Resolução 525/2023 do CNJ, que determinou a instituição de concursos exclusivos para mulheres nas promoções por merecimento. O TJ-SP, aplicando a resolução, abriu edital para um concurso respeitando os parâmetros determinados pelo CNJ — meses depois, o certame foi suspenso, a pedido de um grupo de juízes.

A posição pela inconstitucionalidade se baseia em grande parte em parecer do jurista Ives Gandra Martins, que resumiu o assunto em artigo publicado pela ConJur: “A Resolução do Conselho Nacional de Justiça 525/2023 dispôs não só além do que determina a legislação própria que versa sobre tal matéria — Estatuto da Magistratura — mas também do próprio Texto Constitucional”.

Segundo a defesa das mulheres, no entanto, o questionamento da resolução não poderia ter sido apresentado em mandado de segurança, nem direcionado ao Tribunal de Justiça, já que se trata de questão constitucional.

“Para evitar que o questionamento fosse dirigido ao foro competente (o STF), os impetrantes adotaram uma estratégia processual tão conhecida como rechaçada pelo Supremo, baseada na afirmação de que não estão questionando a Resolução CNJ nº 525/2023, mas, sim, seus ‘efeitos concretos'”, expõe a petição.

A petição pinça trechos da inicial dos magistrados que mostram que o alvo da irresignação é a resolução do CNJ, como quando eles afirmam, por exemplo, que “considerando-se a competência original estabelecida na Carta Magna, o CNJ não podia ter baixado a Resolução 525/2023”.

Segundo as juízas, na peça assinada por Saul Tourinho Leal e Rebeca Drummond de Andrade, os juízes apontaram o presidente do TJ-SP como autoridade coatora, quando ele não tinha nenhuma opção exceto abrir o edital instituindo o concurso. Tratou-se de um drible para não apontar o CNJ como autoridade coatora, sustenta a defesa.

Competência usurpada

O agravo apresenta jurisprudência do Supremo assentando que cabe à Corte Constitucional julgar reclamações, ações contra o CNJ e ações que envolvam toda a magistratura.

Ao estabelecer que a resolução do CNJ não vale para si próprio, a defesa questiona se o TJ-SP estaria retirando do mundo jurídico, em todo o estado (com efeito erga omnes, como aponta a defesa), a própria resolução do CNJ.

“Se sim, o mandado de segurança nada mais foi do que uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada no TJSP contra o CNJ. Isso é vedado. A jurisprudência conhecida do STF proíbe que decisão jurisdicional e incidental de inconstitucionalidade de juiz ou tribunal em um caso concreto extrapole seus efeitos entre as partes e passe a gerar reflexos erga omnes, sob pena de usurpação de sua competência constitucional (Rcl. nº 4.238-MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 4/4/2006).”

O documento ainda cita outro precedente, de relatoria da ministra Cármen Lúcia, em uma situação análoga, em que o TJ-DF tinha julgado ato de seu presidente que apenas executava resolução do CNJ (RCL 4.731).

O próprio presidente Torres Garcia chegou a afirmar, durante o julgamento, não ter tido alternativa além de aplicar a norma: “A mim não restava outra alternativa a não ser cumprir a resolução. Então, com todas as vênias, eu tenho para mim, e a minha posição pessoal, que a matéria é constitucional, deveria estar sendo discutida em outro tribunal e não aqui.”

Pedidos

Assim, as juízas pedem, na ordem: que os advogados possam fazer sustentação oral quando o agravo for julgado; que o agravo interno questionado seja declarado “manifestamente inadmissível”, e seus impetrantes condenados a pagar multa; se isso não ocorrer, que seja ao menos julgado improcedente.

Uma vez o agravo julgado improcedente, que o TJ-SP retome o concurso de promoção para as mulheres; e, se nem isso se concretizar, que ao menos o caso seja mandado ao Supremo, que é a instância competente para julgar a questão.

MS 2079924-89.2024.8.26.0000

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