Nem com DDT

Surto de moscas provocado por usina gera indenização a produtor

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28 de outubro de 2023, 14h54

Pela conexão de causa e efeito entre a prática da empresa e os prejuízos alegados na ação, a 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve o reconhecimento da responsabilidade de uma usina de cana-de-açúcar de Ouroeste (SP) em um surto de "moscas-dos-estábulos" que culminou nas mortes de 13 bois de uma propriedade rural vizinha. A companhia deverá indenizar por danos morais e materiais o produtor rural responsável pelo espaço.

Vincent Noel/Shutterstock
Vincent Noel/ShutterstockProdutor relatou que 13 animais morreram em decorrência da infestação

A doença surge quando os insetos colocam seus ovos na pele de outros animais (e até pessoas), que resultam em larvas que crescem na pele, causando dor, inchaço e coceira.

Ao ingressar com a ação, o produtor rural indicou que a infestação acontecia em decorrência do uso inadequado de vinhaça na fertilização do solo da usina. Quando o manejo e armazenamento do subproduto da cana é mal manuseado e armazenado, pode ocorrer a proliferação descontrolada de moscas-dos-estábulos. Tal prática acontecia desde 2008, mas seu ápice foi registrado em um surto entre 2017 e 2018. 

Em primeira instância, a companhia foi condenada a pagar ao produtor rural R$ 18,8 mil por danos materiais, R$ 204,5 mil por lucros cessantes e R$ 100 mil por danos morais. No recurso julgado pela 27ª Câmara de Direito Privado, a usina alegou que a condenação foi feita sem base de fundamentação, com cerceamento de defesa e atendeu a um pedido feito por um produtor sem legitimidade. Além disso, sustentou que atualização do montante da indenização não poderia ser feito a partir de 2008, pois extrapolou os limites do pedido inicial.

De início, a relatora do recurso, a desembargadora Celina Dietrich e Trigueiros Teixeira Pinto afastou as teses de falta de fundamentação na decisão e de ilegitimidade do produtor. Para a magistrada, o fato de o nome do autor estar inscrito no CNPJ como produtor rural não caracteriza a constituição de pessoa jurídica e não afasta a possibilidade de que figure no polo ativo da demanda, porque a inscrição atende a fins meramente administrativos e tributários.

Com base no laudo técnico apresentado, a relatora também negou que houve cerceamento da defesa da usina.

"O simples fato de que a conclusão pericial foi desfavorável aos interesses da requerida não constitui indício de parcialidade do perito, tampouco afasta a idoneidade da prova, não tendo sido demonstrada, ademais, a necessidade de mais esclarecimentos que justificasse a intimação do perito para comparecimento em audiência de instrução e julgamento."

Contudo, a magistrada compreendeu que, por excessos da sentença de primeiro grau, as indenizações por danos morais e lucros cessantes deveriam ser ajustadas.

Na decisão de primeiro grau, os danos morais se caracterizaram em razão da preocupação excessiva do autor com os impactos negativos ao desempenho de sua atividade agropecuária gerados pelo uso inadequado de vinhaça, o que lhe causou abalo moral suficiente a configurar violação a direitos da personalidade.

"O valor da indenização extrapatrimonial fixado pela sentença, todavia, mostra-se excessivo, de modo que comporta redução para R$ 50.000,00, diante dos critérios da proporcionalidade, razoabilidade, das circunstâncias do caso concreto, como a duração das infestações, além da vedação ao enriquecimento sem causa e os precedentes jurisprudenciais."

Sobre os lucros cessantes, a magistrada entendeu que a correção monetária deveria ser calculada a partir de agosto de 2018, já que foi a época indicada no boletim de ocorrência pelo produtor como do início da infestação.

O produtor foi representado pelos advogados Newley Alexandre da Silva Amarilla e Rodrigo Tesser Pontes, do escritório Newley Advogados.

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Processo 1000356-63.2019.8.26.0696

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