Licitações e Contratos

Diferenças básicas entre edital de licitação nacional e internacional

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

6 de outubro de 2023, 19h49

Em razão da limitada definição de licitação internacional do artigo 6º, inciso XXXV, da Lei nº 14.133/21, pode parecer que se trata apenas de uma "licitação processada em território nacional na qual é admitida a participação de licitantes estrangeiros, com a possibilidade de cotação de preços em moeda estrangeira, ou licitação na qual o objeto contratual pode ou deve ser executado no todo ou em parte em território estrangeiro". Mas isso está longe da realidade.

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Todas as licitações "nacionais" com simples permissão de estrangeiros são de competitividade nula, exatamente, porque não se trata de algo simples assim, vez que o edital internacional deve ser moldado em diversos aspectos para a viável e efetiva participação das empresas estrangeiras.

Lembre-se que, nos termos do artigo 52 da mesma lei consta que "nas licitações de âmbito internacional, o edital deverá ajustar-se às diretrizes da política monetária e do comércio exterior e atender às exigências dos órgãos competentes", o que já confirma que edital "nacional" não resolve o que é necessário à competição com empresas estrangeiras, devendo o edital ser um legítimo edital de licitação internacional.

Até porque, atualmente, sem a acessão do Brasil ao Acordo de Compras Públicas da Organização Mundial do Comércio (GPA-OMC), ajustes normativos e operacionais que permitiriam presença de estrangeiros nas licitações nacionais, acabou ficando algo em ideias, sem a prática.

Mas quais são as diferenças básicas do edital da licitação internacional?

1) A designação de "internacional" – Porque assim os robôs de busca de editais no Brasil e no exterior capturam a informação de modo evidente e inquestionável de que naquele caso se tem uma licitação ajustada à efetiva participação de estrangeiros, sendo que a denominação de "internacional" não é apenas uma questão de nomenclatura, pois ela sinaliza, tanto para o mercado interno quanto para o externo, que a licitação foi meticulosamente estruturada para viabilizar a participação de licitantes estrangeiros;

2) Credenciamento de representantes legais no Brasil – O edital de licitação internacional exige diretrizes claras para o credenciamento de procuradores de licitantes estrangeiros, garantindo que possuam autoridade legítima para representar cada empresa estrangeira no Brasil, para validade de atos aqui praticados;

3) Habilitação e validação de documentos estrangeiros – Ao contrário da licitação nacional, na internacional ocorre habilitação adaptada com documentos emitidos por autoridades estrangeiras, o que assegura que empresas de diferentes origens possam competir em um ambiente equitativo, com documentos equivalentes, mas é preciso regrar as formalidades para se aceitar documentos de outros países, por exemplo, em questão de tradução inicialmente livre na licitação e com consularização ou apostilamento e tradução juramentada para assinatura de ata de registro de preços ou contrato;

5) Aceitação de moedas estrangeiras – Isso não existe em uma licitação nacional, mas faz toda diferença e amplia, significativamente, o universo de participantes interessados de outros países, sendo um fator de respeito à eficiência e à economicidade, princípios, respectivamente, dos artigos 37 e 70 da Constituição Federal, bem como da competitividade, do artigo 5º da Lei nº 14.133/21, sendo importante notar que editais internacionais tratam de conversão de câmbio e outros aspectos ligados a isso, na licitação e no contrato;

6) Questões tributárias e eventual imunidade do ente público – A equalização tributária que existe na licitação internacional busca nivelar o campo de jogo entre licitantes nacionais e estrangeiros, sendo que, quando aplicável, como no caso dos entes da administração direta, a imunidade tributária recíproca deve ser claramente definida, e os encargos ajustados com clareza, mas em todo caso, mesmo nas estatais que trabalham com atividade econômica, até mesmo a planilha de composição de custos de brasileiros e de estrangeiros possui diferenças;

7) Conformidade com diretrizes da política monetária e do comércio exterior e exigências dos órgãos competentes – A licitação internacional deve estar em sintonia com regras como as de proibição da moeda estrangeira como meio circulante (pode ser a base do contrato, mas com as necessárias ressalvas sobre câmbio e matérias relacionadas), regras de autorizações de importação com anuência de Anvisa, Anatel e outros entes de regulação, bem como levar em conta exigências como as do Confea sobre trabalho periódico de empresa de engenharia estrangeira no Brasil, além de outros, o que torna o edital diferente do nacional;

8) Modelos de propostas de licitantes brasileiros e estrangeiros – Existem anexos distintos nos editais internacionais, para empresas do Brasil e do exterior, porque isso é essencial a uma aferição realista de custos e formação de preços considerando diferentes realidades, embora com o pressuposto de todas as propostas apontando entregas, por exemplo, para mesmo local de destino;

9) Incorporação de aspectos técnicos de comércio exterior – Em caso de produtos com eventual importação direta por ente público é essencial regrar no edital da licitação internacional aspectos como certificações, NCM, Incoterms, pagamento a estrangeiro via carta de crédito, pontos que um edital nacional não possui, lembrando que estrangeiro, que sequer possui CNPJ, não sendo contribuinte tributário no Brasil, não consegue realizar as transações de uma importação dentro do Siscomex (sempre existe um CPF ou CNPJ lidando com essa parte final, que no caso daquelas licitações legitimamente internacionais, será o CNPJ do ente público, até para assegurar a imunidade tributária, quando for o caso);

10) Anexos específicos – Os editais de licitação internacional devem incluir anexos específicos para licitantes estrangeiros e brasileiros, não somente os de propostas, como mencionado acima, mas também um anexo que permita aos licitantes estrangeiros declarar a impossibilidade de fornecer até mesmo documentos equivalentes, reconhecendo as diferenças documentais entre os países.

Como se verifica, a elaboração de edital de licitação internacional exige apurada "customização", porque, do contrário, não se terá a verdadeira licitação internacional, aliás, aquela que tem como pressuposto elementar a isonomia desde o acesso à informação, com a publicação de aviso também no exterior, especialmente, no www.dgmarket.com e na lista de Setores de Promoção Comercial do Brasil (em embaixadas e consulados por mais de 100 países com presença diplomática brasileira), lista essa atualizada, constantemente, no site do Ministério das Relações Exteriores.

Em conclusão, há uma distância muito grande entre um edital de licitação nacional e um edital de licitação internacional.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

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