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Venda de nomes de prédios públicos de SP não se choca com a Lei Cidade Limpa

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5 de novembro de 2023, 9h48

O Plenário da Câmara Municipal de São Paulo aprovou no último dia 27 um projeto de lei que autoriza a prefeitura a comercializar os nomes de equipamentos públicos municipais, os chamados naming rights — falta agora a sanção do prefeito Ricardo Nunes (MDB), o que deve ocorrer nesta semana.

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Especialistas defendem limites para venda de naming rights de equipamentos públicos
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O PL 638/2022, de autoria da vereadora Cris Monteiro (Novo) e coautoria do vereador Fernando Holiday (Republicanos), estabelece que poderão ser vendidos os nomes de equipamentos públicos municipais de atividades dirigidas a saúde, cultura, esportes, educação, assistência social, lazer e recreação, meio ambiente e mobilidade urbana. 

A Prefeitura de São Paulo já tinha o programa Adote Uma Praça, regulamentado pelo Decreto 61.170/2022. O programa incentiva a preservação de áreas verdes na capital e promove a participação social para a melhoria de espaços urbanos por meio de parcerias. Atualmente há cerca de 790 praças já adotadas. Outras 4.500 praças e canteiros distribuídos pelas 32 subprefeituras estão disponíveis para adoção.

O escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, por exemplo, “adotou” o Largo São Francisco, que fica diante das Arcadas. A praça e suas esculturas foram restauradas e banheiros públicos instalados — o que o velho centro de São Paulo nunca teve. 

No âmbito estadual, o governo já vem comercializando os nomes de algumas estações de metrô. Essa iniciativa, além da venda dos naming rights de arenas esportivas particulares, tem sido usada como argumento a favor do projeto. Os críticos da ideia, por outro lado, entendem que a aprovação da lei concede ao prefeito o poder de "vender" a identidade da cidade.

A revista eletrônica Consultor Jurídico consultou especialistas em Direito Administrativo sobre o tema. Entre eles, há o consenso de que a legislação vigente já permite esse tipo de iniciativa e que o PL aprovado pela Câmara não entra em choque com a Lei Cidade Limpa (Lei 14.223/2006) — criada em 2006 para combater a poluição visual na cidade. Ainda assim, segundo os advogados, há limites que não podem ser transpostos nem mesmo com a aprovação do projeto.

"A priori, não há qualquer impedimento. Uma nova lei pode alterar a legislação anterior. Entretanto, apesar de a Lei Cidade Limpa não prever expressamente a cessão onerosa dos naming rights, esse tipo de parceria já é possível pela legislação vigente e, inclusive, há instrumentais na própria Lei Cidade Limpa que autorizam a instalação de mensagens indicativas de doações ou cooperações com o poder público, com exploração da imagem do parceiro privado", destaca Mariana Chiesa, sócia do escritório Manesco Advogados.

Já o advogado Gustavo Schiefler ressalta que o PL prevê que os contratos de concessão onerosa dos nomes dos equipamentos públicos possuirão prazo determinado de duração, com pagamento anual, e a inclusão da marca deverá cumprir as regras de comunicação da prefeitura.

"Tecnicamente, esse projeto de lei sobre naming rights não é contrário à Lei Cidade Limpa, desde que respeitadas as regras de comunicação visual e que nomes, símbolos e logotipos sejam incorporados à fachada dos imóveis. No caso dos eventos, a comunicação visual ocorre de modo muito mais flexível e segue normas da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Além disso, é importante considerar que a fixação de anúncios no espaço interno dos imóveis também segue regras muito menos rígidas."

Entendimento parecido tem Mozar Carvalho, fundador do escritório Machado de Carvalho Advocacia: ''A cessão de naming rights não necessariamente viola a Lei Cidade Limpa, desde que as formas de divulgação do nome ou marca estejam em conformidade com as restrições impostas pela legislação, previamente definidas pelo ente legislativo. A Lei Cidade Limpa se concentra mais em publicidade externa, como outdoors e anúncios em fachadas, e não se opõe, a priori, a dar um nome comercial a um espaço público, desde que a sinalização e a publicidade relacionadas estejam em conformidade com seus parâmetros''.

O mestre em Direito Constitucional pela USP Antonio Carlos de Freitas Jr., por sua vez, aponta que o PL encontra respaldo no texto constitucional. "A Constituição incentiva essas modalidades mais criativas de parceria entre o Estado e o mercado, buscando maximizar a oferta de serviços públicos e aumentar a arrecadação financeira sem onerar a carga tributária do contribuinte brasileiro."

Além do respaldo constitucional, o advogado Conrado Gama Monteiro lembra que o Código Civil também já permite esse tipo de concessão. ''Os equipamentos públicos, por exemplo, já são assim definidos pelo artigo 99 do Código Civil e já poderiam ter a concessão de uso autorizada''.

Por outro lado, Raphael de Matos Cardoso, doutor em Direito do Estado e especialista em Direito Administrativo do Marzagão e Balaró Advogados, observa que, apesar da autorização legal, não se deve deixar de lado o bom senso.

''A possibilidade de cessão onerosa do nome de bens públicos não é inconstitucional, mas não pode ser uniforme e abrangente. Algumas categorias de bens públicos, em especial aqueles sujeitos ao regime jurídico de direito público na sua forma mais intensa, não podem ser amplamente negociadas, ainda que aqui se esteja a tratar apenas do nome. É o caso, por exemplo, de bens históricos ou daqueles de identidade comum", sustenta ele.

Nesse sentido, Cardoso explica que a cessão do nome não pode comprometer o patrimônio comum que a denominação do bem público representa, de maneira a torná-lo até mesmo irreconhecível.

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