Reflexões Trabalhistas

Incompatibilidade de realização de exame de HIV e toxicológico para contratação

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17 de março de 2023, 9h09

Em recente acórdão publicado anteontem (15/3), os ministros da 1ª Turma do TST (Tribunal Superior do Trabalho), no Ag-RRAg 1760-26.2017.5.06.0121, por unanimidade, conheceram e deram provimento ao recurso de revista do reclamante por entender incompatível com o exercício da função de auxiliar de cozinha, a exigência de exames de HIV e toxicológico, no momento da contratação do empregado.

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O referido acórdão, da lavra do ministro Relator Hugo Carlos Scheuermann, ainda condenou as reclamadas ao pagamento de indenização por danos morais, diante da violação do artigo 1º da Lei 9.029/95.

No caso em apreço, o Tribunal Regional a quo havia entendido ser razoável a realização de exames toxicológicos e de HIV, no momento da contratação do empregado, uma vez que o trabalho seria exercido em navio de cruzeiro marítimo; que o exame toxicológico tem sido exigido para o ingresso em diversas carreiras (como as ligadas à segurança pública); e, que o exame de HIV teve o consentimento do empregado e a observância do sigilo de seu resultado.

Entretanto, a exigência do exame de HIV para o processo de admissão do trabalhador é totalmente abusiva e discriminatória, não havendo qualquer circunstância que justifique o tratamento diferenciado dos tripulantes de navios de cruzeiros, em razão de supostos riscos para a saúde da pessoa portadora de HIV ou de terceiros.

Ademais, para a 1ª Turma do TST, a solicitação de um exame tão invasivo à esfera íntima da pessoa, ainda que com o seu consentimento, tem potencial lesivo de impedir o acesso ao emprego e estigmatizar o eventual portador do vírus HIV.

A exigência do teste toxicológico é igualmente discriminatória posto que as atividades desempenhadas pelo autor (como auxiliar de cozinha) não podem ser equiparadas às atividades de segurança pública ou de motorista profissional.

Irrelevante, portanto, que a realização dos exames tenha ocorrido com a aquiescência do trabalhador, que em razão de sua hipossuficiência, acaba por se submeter às regras impostas pelo empregador.

O fato de o trabalhador ter sido contratado, após a realização dos exames, também não é capaz de infirmar a conclusão acerca do ato ilícito perpetrado. A recusa da contratação, em decorrência de eventual exame positivo, configuraria circunstância agravante. Da mesma forma, nem o poder diretivo do empregador, nem tampouco sua obrigação em garantir um ambiente de trabalho saudável e seguro, seriam justificativas plausíveis para a imposição de tais exames.

Como se não bastasse, a exigência prevista na Lei 13.103/2015 quanto a realização de exames toxicológicos para a admissão do motorista profissional, não é suficiente para justificar que um empregado que atue como auxiliar de cozinha seja obrigado a fazê-lo.         

Por outro lado, a solicitação, recomendação ou exigência do exame de HIV para o processo de admissão do trabalhador também se revela abusiva, tendo em vista não haver lei ou norma regulamentadora específica que indique que o ambiente de trabalho em navios ofereça riscos para a saúde de portador de HIV ou que a sua presença ofereça riscos para terceiros. Se fosse assim, os passageiros dos cruzeiros também deveriam sujeitar-se ao mesmo procedimento.

Por fim, diante da violação à intimidade do trabalhador e ao artigo artigo 1º da Lei 9.029/95, agiu bem o TST ao condenar as reclamadas ao pagamento de indenização por danos morais ao trabalhador.

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