Licitações e Contratos

Fazer upgrade de proposta é prática
ilegal nas licitações

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

10 de março de 2023, 18h23

Uma situação curiosa tem chamado atenção em licitações, especialmente, depois do período da pandemia do Covid-19: a de alegações que chegam ao ponto de pedido para que uma proposta de determinado produto tenha alteração pelo curso do certame.

Spacca
No caso, licitante, recebendo em sede de diligências pelo pregoeiro a informação de que o seu produto antes ofertado não atenderia a especificações, em seguida, aparece com uma carta de fabricante alegando que aquele produto teria sido descontinuado ou substituído por um outro modelo, que atende às regras do edital.

Isso é o que se ousa chamar de "upgrade de proposta", uma aberração jurídica.

Depois da "notícia ruim", não se pode incorrer em manobras para vitória em licitação a qualquer custo, porque a proposta é única e não "mutável" pelo curso do certame, nem sob o rótulo de saneamento, em sede de diligências.

A prática ilícita verificada consiste em licitante surgir, pelo meio dos procedimentos, com carta em nome de fabricante, alegando circunstâncias variadas, repita-se, como pandemia e outras variáveis, para defender que aquele produto que seria rejeitado teria um substituto mais recente.

Mas se assim fosse o licitante já teria a necessidade de ofertar, desde o início, o melhor dos produtos daquele fabricante, sem exposição ao risco de desconformidade que, de modo tardio, pretende contornar, modificando proposta, inclusive, para ficar diferente do que havia postado no campo próprio com sistema compras.gov.br ou outro qualquer.

A troca de modelo por outro não constante da proposta visa, de forma dissimulada, essa aberração chamada de "upgrade de proposta" (algo absurdo e não admitido em lei) para tentar atender, em uma segunda chance, especificações do edital, isso em licitação ainda sendo conduzida (não se trata de situação excepcional de substituição de produtos após contrato e com as circunstâncias excepcionais comprovadas). Aqui o caso é de manobra durante a competição.

Mas não se admite proposta diversa após lances encerrados, após etapa competitiva encerrada.

Isso viola não apenas a isonomia do caput do artigo 37 da Constituição Federal, como também a igualdade de tratamento de licitantes, do inciso XXI, do mesmo dispositivo constitucional, uma vez que a licitante beneficiada acaba com chance ilícita de ofertar uma segunda proposta, de agora de outro objeto, uma dupla chance de competir e isso depois dos alertas nas mensagens de "chat" do pregão, no sentido de que o primeiro objeto, pela análise empreendida, não passaria pelo crivo de aceitabilidade.

Isso viola, ainda, a impessoalidade e a legalidade, do artigo 37 da Constituição Federal.

Nada ampara e nem justifica alterar proposta depois de "jogo jogado".

Nada na Lei nº 14.133/2021 permite que se abra para um licitante, em momento de diligência (artigo 59, § 2º, e artigo 64), a apresentação de "nova oferta", diversa da original.

Por fim, cabe lembrar que, especialmente para produtos que são comercializados globalmente, basta que o pregoeiro verifiquei em inglês, nos sites internacionais dos fabricantes, se aquele produto ainda está em portfólio ou catálogos e entre no sistema de "chatbot" do site do fabricante e "pergunte" quando determinado modelo tem ou terá o seu o fim de fabricação ("EOM — End of Manufacturing"), pois haverá chance muito provável de que o próprio "robô do fabricante" confirme de imediato, além da data limite de fim de fabricação do produto, também, o seu fim de suporte ("EOS — End of Support").

Essas considerações são muito apropriadas para licitações de tecnologia e, como mencionado, para produtos globalmente comercializados, mas tais ensinamentos podem ser adotados para lisura e transparência em licitações de muitos outros objetos.

Licitações precisam de honestidade, sem subterfúgios, devendo cada agente público e privado zelar pela busca da verdade material e sem desvios de conduta.

Todos devem fazer sua parte e cada jogo tem de seguir as suas regras previamente estabelecidas.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!