Opinião

Citação por edital nos executivos fiscais tributários

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2 de março de 2023, 6h06

O atual Código de Processo Civil (CPC), em seu artigo 1º, proclama que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil.

A Constituição, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, declara ser direito fundamental, outorgado a todos, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, seja no âmbito judicial ou administrativo.

Buscando dar efetividade a tal mandamento constitucional, direito fundamental, o CPC determinar que é dever [1] das partes manter atualizados seus dados cadastrais perante os órgãos da Administração Tributária, para recebimento de citações e intimações.

A Lei Federal nº 6.830/1980, Lei de Execuções Fiscais (LEF), determinada que o Termo de Inscrição de Dívida Ativa [2] deverá conter, entre outros, o domicílio ou residência do devedor e dos demais corresponsáveis.

De igual modo, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 202, inciso I [3], replica a previsão contida na LEF.

A certidão de dívida ativa tributária (CDAT), que deve conter todos os dados exigidos no respectivo termo de inscrição, goza da presunção legal [4] [5] de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída, uma vez que retrata, no que tange à qualificação do devedor, os dados cadastrais contidos nos órgãos da Administração Tributária, dados esses que são fornecidos pelos próprios contribuintes, que tem, como já dito, o dever legal de mantê-los atualizados.

Além disso, a (CDAT), se reveste da qualidade de documento público, sendo, a princípio, vedado lhe recusar fé [6].

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece a importância da necessidade dos contribuintes pessoas físicas e jurídicas, incluindo os sócios ou administradores dessas últimas, de manterem seus dados cadastrais atualizados junto aos órgãos das Administrações Tributárias Federal, Estadual e Municipal, sendo que, a desatualização de tal cadastro, pode trazer prejuízos aos contribuintes omissos, desleixados.

Segundo o STJ, em tese jurídica vinculante, contida no verbete sumular nº 435 [7], a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, presume-se dissolvida irregularmente.

Assim, nas execuções fiscais tributárias, uma vez frustrada a citação, via mandado, das pessoas físicas ou jurídicas, nos endereços constantes nos órgãos da Administração Tributária, replicados nas CDAT, automaticamente atendidos estão os requisitos legais para o acionamento da citação por edital, em consonância com a tese jurídica firmada pelo STJ, na Súmula nº 414 [8].

Tal assertiva encontra amparo na jurisprudência do STJ, conforme se pode aferir do julgado, exemplificamente, abaixo colacionado:

"Tomadas providências efetivas para a localização do executado, com o deslocamento de oficial de justiça, por duas vezes, a endereço referente ao seu domicílio fiscal, obtendo a informação de que a executada não mais residia no endereço, encontrando-se em lugar incerto e não sabido, apresenta-se válida a superveniente citação por edital, tendo em vista que a citação por carta, no mesmo local, apresenta-se inócua, sendo possível afirmar que foram exauridas as tentativas de localização do devedor. Precedentes: AgInt no AREsp nº 483.803/MG, relator ministro Gurgel de Faria, DJe 11/10/2018 e AgRg no REsp nº 1.565.872/MG, relator ministro Benedito Gonçalves, DJe 26/8/2016". (STJ. AREsp nº 1.347.072/PR, relator ministro Francisco Falcão, 2ª Turma, julgado em 6/12/2018, DJe de 13/12/2018).

Entender de outro modo, data vênia, seria beneficiar o devedor por sua própria torpeza [9], por descumprimento de obrigação legal, ato ilícito, o que não é admitido pelo ordenamento jurídico vigente.

Outrossim, temos sempre que ter em mente que a execução se realiza no interesse do credor, sendo certo que a não localização do devedor no endereço cadastrado nos órgãos da administração tributária, automaticamente dá início à fluição do prazo da prescrição intercorrente [10], acarretando risco de perecimento ao direito do exequente, caso não haja a imediata e célere citação editalícia, que tem o condão de interromper o fluxo tanto da prescrição do crédito tributário [11] [12], quanto da prescrição intercorrente [13].

Desta feita, como a não atualização, pelos contribuintes e seus respectivos sócios ou administradores, de seus endereços cadastrais perante os órgãos da Administração Tributária configura quebra dos deveres da boa-fé [14] e cooperação processual [15], assim como que ninguém pode ser beneficiado por sua própria torpeza, necessário se faz que a citação editalícia nos executivos fiscais tributários seja célere, sendo determinada tão logo se constate a frustração da citação, via mandado, nos endereços constantes nas CDAT.


[1] CPC. Artigo 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo: (…). VII – informar e manter atualizados seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário e, no caso do §6º do artigo 246 deste Código, da Administração Tributária, para recebimento de citações e intimações.

[2] LEF. Artigo 2º. (…). §5 – O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter: I – o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

[3] Artigo 202. O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I – o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros;

[4] LEF. Artigo 3º – A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.

[5] CTN. Artigo 204. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída.

[6] CF. Artigo 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…). II – recusar fé aos documentos públicos;

[7] STJ – Súmula 435: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente. (SÚMULA 435, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/04/2010, DJe 13/05/2010).

[8] STJ – Súmula 414: A citação por edital na execução fiscal é cabível quando frustradas as demais modalidades. (SÚMULA 414, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 16/12/2009).

[9] A ninguém é dado o direito de invocar em seu proveito nulidade a que deu causa, situação não permitida pelo ordenamento jurídico diante do princípio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, segundo o qual a parte não pode se beneficiar da sua própria torpeza. (STJ. AgInt nos EDcl no AREsp nº 1.013.829/RJ, relator ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe de 14/8/2018).

[10] STJ – Tema Repetitivo 566: O prazo de um ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no artigo 40, §§1º e 2º da Lei nº 6.830/80 – LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução.

[11] CTN. Artigo 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;

[12] STJ – Tema Repetitivo 82: A citação válida, ainda que por edital, tem o condão de interromper o fluxo do prazo prescricional.

[13] STJ – Tema Repetitivo 568: A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens.

[14] CPC. Artigo 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.

[15] CPC. Artigo 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

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