Justiça e segurança

O poder do Ministério da Justiça: da repressão às drogas às redes sociais

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25 de maio de 2023, 8h23

*Reportagem publicada no Anuário da Justiça Brasil 2023lançado no dia 10 de maio, no Supremo Tribunal Federal. A publicação está disponível gratuitamente na versão online (clique aqui para acessar o sitee à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa (clique aqui para comprar).

Flávio Dino foi escolhido para estar à frente da pasta mais antiga do Executivo Federal. Aos 54 anos, o ministro acumula experiência nas três esferas de poder: foi juiz federal por 12 anos, depois deputado federal pelo Maranhão, estado que também governou por dois mandatos e, ainda, presidiu a Embratur. Eleito senador por seu estado em 2022, está licenciado do cargo.

Em seu discurso de posse no ministério, Flávio Dino apontou os eixos de sua atuação: o combate às desigualdades, a proteção à Constituição e a defesa da democracia, o controle de armas, o combate aos crimes ambientais, a garantia aos direitos digitais e ao consumo e a cooperação federativa.

Na ocasião, fez um chamamento especial aos policiais: “Não pode existir antinomia entre a nossa visão política de estruturação da paz e a ação policial. Ao contrário, queremos que todos os policiais no nosso país considerem este ministério seu. Não importa o voto de ontem ou o voto de amanhã; o que importa é o cumprimento do dever funcional de acordo com os ditames da lei e da hierarquia e da disciplina.”

O recado não foi à toa; veio de uma crescente preocupação com as polícias. Durante seu mandato na Presidência da República, Jair Bolsonaro decidiu acoplar também a pasta da Segurança Pública ao Ministério da Justiça e se vangloriava do contato e da abertura que mantinha com as forças de segurança.

Foi durante a gestão de Anderson Torres no Ministério da Justiça que a Polícia Rodoviária Federal desvirtuou completamente suas funções ao fazer operações atípicas, sobretudo em estados do Nordeste, justamente na data do segundo turno das eleições presidenciais, 30 de outubro de 2022.

Em março, um episódio ainda mais lamentável havia ocorrido: um homem de 38 anos morreu após ser preso no porta-malas de uma viatura da PRF com um dispositivo de fumaça. O caso aconteceu no município de Umbaúba, em Sergipe. Torres, como de costume, limitou-se a fazer uma publicação em uma rede social informando ter determinado a abertura de investigação.

O relatório de gestão mais recente do Ministério da Justiça, já publicado na gestão Flávio Dino, critica a baixa implementação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), previsto na Lei 13.675/2018, e fragilidades no Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSP).

“A gestão pretérita foi totalmente omissa na criação de políticas públicas para atendimento às vítimas da violência”, diz o documento, que cita uma auditoria de monitoramento do Tribunal de Contas da União em que consta a falta de priorização de ações de prevenção à criminalidade na elaboração do PNSP.

Tão logo assumiu o cargo, Flávio Dino enfrentou a tentativa de golpe de 8 de janeiro. Coube a ele coordenar a atuação do governo federal e das forças policiais na repressão ao ataque antidemocrático e a posterior investigação do caso. Para ele, a Polícia Militar do Distrito Federal “não cumpriu aquilo que estava escrito no planejamento operacional da Secretaria de Segurança Pública”.

Por suposta omissão e conivência com os atos terroristas, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres está preso preventivamente desde 14 de janeiro de 2023 – ele havia assumido o cargo de secretário de Segurança Pública do Distrito Federal.

A principal medida adotada pela nova gestão foi determinar o recadastramento de armas de caçadores, atiradores e colecionadores (CACs), que chegou a 80% – equivale a mais de 613 mil armas, a maior parte delas de uso permitido, segundo o ministério. Aquelas que não forem recadastradas ficarão sujeitas a apreensão administrativa e remessa à Polícia Federal. Além da clara restrição à circulação de armas, o processo regulatório se contrapõe ao governo anterior.

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O sistema penitenciário, reconhecido pelo Supremo como um “estado de coisas inconstitucional”, também estará entre as prioridades. Na primeira semana de governo houve uma mudança no Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que foi substituído pela Secretaria Nacional de Políticas Penais. A pasta terá as mesmas competências do Depen, mas contará com nova estrutura regimental. Terá cinco diretorias: Executiva, de Políticas Penitenciárias, do Sistema Penitenciário Federal, de Inteligência Penitenciária, e de Cidadania e Alternativas Penais, além da Corregedoria-Geral.

Flávio Dino defendeu mais de uma vez a manutenção dos presídios federais e reforçou a importância de investimento em aparelhos policiais dos estados. “A questão é o que se passa nos presídios estaduais porque, hoje, as facções criminosas nasceram e se nutrem no sistema penitenciário. Estamos vendo uma escalada, não apenas na quantidade, mas na qualidade, na ousadia da atuação dessas associações criminosas”, afirmou durante participação em evento do Instituto de Advogados de São Paulo (Iasp).

A primeira indicação para comandar a nova secretaria declinou do convite por “questões familiares de natureza pessoal”. Coronel da PM de São Paulo, Nivaldo Restivo enfrentava resistências, dentre outros pontos, por ter participado da operação na Casa de Detenção do Carandiru, em 1992, em que morreram 111 presos – nenhuma morte foi diretamente imputada a ele. Com a desistência, foi nomeado o advogado e policial Rafael Velasco, marcando a primeira vez que um policial penal comanda a pauta penitenciária no Executivo Federal.

O leque de temas sob responsabilidade do Ministério da Justiça é diversificado, dando conta da repressão às drogas até a proteção de povos indígenas. Outra frente será reforçada com foco nas políticas de defesa do consumidor e de repressão a crimes digitais. Neste contexto, o 8 de janeiro acendeu um alerta acerca da instrumentalização das redes sociais para a organização de atos criminosos.

O comandante da pasta faz parte da corrente favorável a ampliar a regulação e as políticas de moderação para impedir que as redes virem espaço isento de punições.

“A liberdade de expressão não está em risco quando se regula. Ao contrário: defender a liberdade de expressão é regulá-la, porque diz respeito ao desenho e ao conteúdo do Direito, é fixar fronteiras entre uso e abuso. Liberdade de expressão sem responsabilidade não é liberdade de expressão, é crime. (…) O algoritmo é humano e por isso mesmo é preciso tratar-se de regulação, que é algo humanamente programado e reprogramável”, disse.

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