Machismo estrutural

Supremo forma maioria contra tese de legítima defesa da honra

Autor

30 de junho de 2023, 12h54

A tese da legítima defesa da honra, ainda usada por acusados de feminicídio, não é, tecnicamente, legítima defesa. Portanto, não exclui a ilicitude do ato. Além disso, tal argumento viola os princípios constitucionais da dignidade humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero, estimulando a violência contra mulheres.

Nelson Jr./SCO/STF
Edson Fachin disse que soberania do tribunal do júri não é absoluta
Nelson Jr./SCO/STF

Com esse entendimento, seis ministros do Supremo Tribunal Federal votaram, nesta sexta-feira (30/6), pela inconstitucionalidade do uso da tese da legítima defesa da honra em casos de feminicídio nas fases pré-processual ou processual penais, bem como no julgamento perante o Tribunal do Júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento. A análise da ação será retomada na primeira sessão da Corte no segundo semestre, em agosto.

A tese admite que uma pessoa (normalmente um homem) mate outra (normalmente uma mulher) para proteger sua honra, em razão de uma traição em relação amorosa.

Em 2021, o ministro Dias Toffoli, relator da ação, concedeu liminar para suspender o uso do argumento. A decisão foi referendada pelo Plenário do Supremo.

Na sessão desta quinta, Toffoli votou pela declaração de inconstitucionalidade da tese. Nesta sexta, o relator aceitou sugestão do ministro Luiz Edson Fachin e tornou o seu voto mais amplo, de forma a permitir recurso contra decisão do júri que levou em conta o argumento da legítima defesa da honra.

Fachin destacou que a soberania do tribunal do júri não é absoluta, e suas decisões devem ter um mínimo de racionalidade. Dessa maneira, o tribunal pode anular sentença dos jurados que levou em conta a tese. Para o ministro, a previsão é um reforço adicional para combater a “tragédia cotidiana” dos feminicídios.

Além de Fachin, o voto do relator foi seguido pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. As ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber sinalizaram que também vão acompanhar o entendimento.

Nunes Marques apontou que os avanços na legislação penal, especialmente com a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), mostram a preocupação do legislador com a proteção da mulher. E chegou a hora de dar mais um passo nesse caminho e barrar a tese da legítima defesa da honra, opinou.

Alexandre destacou que o argumento é reflexo do machismo estrutural da sociedade brasileira. O ministro defendeu que a proibição do uso da tese não deveria se restringir ao tribunal do júri, pois ela também pode ser empregada em processos de violência doméstica, lesão corporal e tortura.

ADPF 779

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!