Fator surpresa

Vídeo exibido pelo Ministério Público sem ciência da defesa gera nulidade de júri

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23 de junho de 2023, 16h52

Durante o julgamento, não é permitida a leitura de documento ou a exibição de material que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três dias úteis, dando-se ciência à outra parte.

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IstockphotoTJ-SP reconhece nulidade de júri após MP exibir vídeo do YouTube sem ciência da defesa

Com esse entendimento, a 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a nulidade de um julgamento no Tribunal do Júri e determinou que um homem, acusado de tentativa de feminicídio contra a ex-mulher, seja submetido a um novo júri.

O réu havia sido condenado a seis anos e 26 dias de reclusão, em regime inicial fechado. Ao TJ-SP, a defesa sustentou a nulidade do júri, pois o promotor exibiu em plenário um vídeo publicado no YouTube em que várias mulheres relatavam abusos e crimes que sofreram — e que não foram cometidos pelo acusado. Segundo a defesa, enquanto o vídeo era exibido, os jurados manifestaram espanto e olharam com repulsa para o réu.

Para os advogados do réu, o vídeo influenciou a maior parte dos jurados, levando à condenação por maioria de votos. O relator, desembargador Francisco Orlando, acolheu a preliminar e embasou a decisão no artigo 479 do CPP, que diz que, "durante o julgamento, não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três dias úteis, dando-se ciência à outra parte”.

"A defesa obviamente foi colhida de surpresa com a iniciativa do promotor de Justiça. A parte não está proibida de ler ou exibir em plenário jornal ou outro escrito, mas a lei veda que a iniciativa não possibilite reação da parte contrária. No caso em exame, o representante do Ministério Público não juntou aos autos o material que pretendia exibir com a antecedência mínima de três dias, a fim de que a parte contrária fosse cientificada", disse o magistrado. 

Ele destacou que, nas contrarrazões de apelação, o Ministério Público alegou que o vídeo não tinha relação com a matéria de fato do processo. "Então cabe a indagação: por que razão o promotor de Justiça exibiu o vídeo? Por que exibiu um vídeo de mulheres relatando abusos e crimes praticados contra elas por terceiros durante julgamento que apura fato supostamente praticado, com as mesmas características?", questionou.

Assim, o relator reconheceu o vício e anulou o julgamento, ordenando que o réu seja submetido a uma nova sessão no Tribunal do Júri, "ficando prejudicados os questionamentos defensivos acerca da decisão contrariamente manifesta à prova dos autos e do Ministério Público quanto à dosimetria e regime prisional". A decisão foi unânime. 

Processo 1501797-88.2016.8.26.0223

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