Reflexões Trabalhistas

Adolescente que teve mão decepada por serra elétrica deverá ser indenizado

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho consultor jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos entre eles Direito Ambiental do Trabalho e a Saúde do Trabalhador.

2 de junho de 2023, 8h00

A notícia acima foi publicada no site do TST (Tribunal Superior do Trabalho) anteontem (31/5), a qual chama a atenção e alerta os empregadores, tomadores de serviços e a sociedade no tocante à obrigação de prevenção dos riscos nos ambientes de trabalho.

As consequências de um acidente de trabalho são sempre ruins para empregados, empregadores e para a sociedade, porque provocam, quase sempre, consequências sociais, econômicas e humanas.

É por isso que nossa Constituição de 1988 conclama no artigo 7º que "são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: … XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança".

Nessa linha, estabelece o artigo 19, § 1º da Lei nº 8.213/91 que "a empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador".

Não é difícil inferir da lei que o direito a ambientes de trabalho seguros e adequados e à preservação da saúde e vida é um direito fundamental dos trabalhadores e dever dos tomadores de serviços, que não devem agir com imprudência, imperícia e negligência, porque a mesma Constituição diz no inciso XXVIII do artigo 7º que é direito dos trabalhadores "seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa". 

A notícia menciona que, "aos 17 anos, jovem contratado como auxiliar de escritório estava em desvio de função quando o acidente ocorreu" e teve todos os dedos da mão direita decepados!

Foi verdadeira tragédia para um jovem de 17 anos de idade, no início da carreira profissional, mas também para essa microempresa, em termos financeiros.

A postura da empresa, como constou dos autos, foi de culpa por imprudência, imperícia e negligência, colocando um auxiliar de escritório para operar serra elétrica, máquina perigosíssima, sem treinamento e sem equipamentos de proteção individual.

Por conta disso, a reclamada deverá pagar a esse trabalhador adolescente indenização por danos morais e estéticos em razão do acidente de trabalho.

É realmente triste ver um jovem no primeiro emprego, no terceiro dia de trabalho, ao limpar o sugador de pó de uma serra circular, utilizada para cortar madeira, sem proteção, ter todos os dedos da mão direita decepados!

Essas sequelas certamente marcarão muito a vida desse trabalhador, inclusive no aspecto psicológico, e mudará os rumos da sua atuação e ascensão profissional, porque quem perde todos os dedos de uma mão, principalmente a direita, não poderá mais exercer toda e qualquer atividade.

A perícia concluiu que, por causa do acidente, sua capacidade de trabalho foi reduzida em 60%, de forma permanente. Além disso, o acidente gerou abalos psicológicos no jovem, com impactos em sua autoestima e na sua socialização.

Aspecto interessante no caso é que o juiz de primeira instância verificou que a empresa havia sido negligente na adoção de medidas adequadas de segurança no trabalho, mas também considerou que o trabalhador teria agido de forma insegura, ao não se atentar para o fato de que o equipamento estava ligado ao realizar a limpeza, reconhecendo culpa concorrente de ambos, que foi afastada pelo Tribunal Regional do Trabalho, o qual reconheceu a responsabilidade civil integral da empresa pelo acidente.

A sentença reconheceu o dano moral e estético que o acidente causou ao adolescente. "O acontecimento, por sua natureza, é suficiente para gerar sofrimento, dor, tristeza e angústia", registro a sentença. Com isso, a empresa foi condenada a pagar R$ 200 mil de reparação, o que foi mantido pelo regional, porque ficou demonstrado o desvio de função, uma vez que, apesar de ter sido contratado como auxiliar de escritório, o adolescente realizava tarefas de auxiliar de produção e de operador de máquinas, "tudo isso sem qualquer regular treinamento, qualificação ou contramedida de segurança".

Para o TRT, a dinâmica do acidente revela uma conjugação dos fatores de risco negligenciados pelo empregador, "desde a capacitação do trabalhador para a tarefa até o cumprimento dos padrões de segurança para a realização da atividade".

O TST não deu provimento ao agravo de instrumento da empresa, por ser inviável retomar a análise de fatos e provas nessa corte superior. Todavia, a tramitação do processo continua, porque a turma deu provimento ao agravo de instrumento do trabalhador e vai examinar seu recurso em relação à pensão mensal vitalícia (Proc. RRAg-1335-30.2017.5.17.0141).

Como registro final sobre esse triste caso, cabe alertar para o fato de que qualquer que seja o valor final de indenização a ser imposto à reclamada, uma microempresa, será difícil de suportar e, para o trabalhador, a maior indenização do mundo não vai trazer de volta sua integridade física e psíquica, totalmente abalada pelas graves consequências do mencionado infortúnio.

Então, a lição que fica é: "os tomadores de serviços precisam adotar medidas individuais e coletivas para prevenção de acidentes e preservação da integridade física e psíquica dos seus trabalhadores/colaboradores".

 

é Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP, Professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/Mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Consultor jurídico, Advogado, Procurador Regional do Trabalho aposentado e Autor de livros jurídicos, entre eles, "Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador".

Autores

  • é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre eles, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

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