Licitações e Contratos

Edital de licitação não pode criar reserva de mercado

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

14 de julho de 2023, 11h17

Poderia um edital de licitação, com a menção ao termo "desenvolvimento nacional sustentável", criar regras de uma verdadeira reserva de mercado, fechando acesso a estrangeiros?

A resposta será negativa, porque não basta mencionar o termo genérico acima mencionado e que está como princípio do artigo 5º da Lei nº 14.133/21, a nova lei de Licitações e Contratos, nem o objetivo licitatório que está posto no artigo 11, inciso IV, da mesma lei, uma vez que tais normas são de eficácia contida, diretrizes, que dependem de outros expressos comandos, como aqueles que criaram há mais de uma década as preferências nacionais nas licitações, graduando limites percentuais para favorecer bens e serviços nacionais.

Spacca
Isso significa que, quando o Congresso estabelece regras de competências, mesmo para tratar de restrições a bens e serviços estrangeiros, há graduação que depende de regulamentação que decorre de previsão em texto de lei, não edital.

Edital, como mero ato administrativo com foco em contratação pública, não pode quebrar a isonomia entre brasileiros e estrangeiros, nem o postulado da igualdade de tratamento, porque isso vai contra o artigo 37, caput e inciso XXI, da Constituição.

E um fechamento dessa forma seria o mesmo que um ato administrativo violando, diretamente, o princípio da livre concorrência, do artigo 170, inciso IV, da Constituição.

Cabe lembrar que comércio exterior é matéria de competência privativa da União, nos termos do artigo 22, inciso VIII, também da mesma Carta Magna, sendo oportuno lembrar que o caso é de competência legislativa do Congresso, conforme artigo 44, novamente, da Constituição.

De outro ângulo, se existem 16 (dezesseis) anuentes de comércio exterior no Brasil, vários deles com uma função também regulatória bem específica, como se tem nos casos de Anatel, Anac, Anvisa, Exército e outros, não pode o edital de licitação criar barreiras que não constam das leis de regulação dessas áreas, sem esquecer de regulamentos em decretos e outras normas.

Também importante lembrar que se o Decreto Regulamento Aduaneiro, estabelecido pelo Decreto nº 6.759/2009, não fixa barreiras, mas apenas estabelece procedimentos a se observar nos processos de comércio exterior, não pode edital criar barreiras nessa área.

Não se pode esquecer, em outra frente, que a Câmara de Comércio Exterior (Camex) tem suas competências nas matérias ligadas e importações e exportações.

Por fim, o agente de contratação, mencionado, entre outros, nos artigos 6º, inciso LX, e 8º, da Lei nº 14.133/21, possui competências ligadas à condução de processos licitatórios e contratações, mas não competências que avancem para regulação de comércio exterior.

Assim sendo, máxima vênia, edital de licitação não pode proibir e fechar genericamente acesso a estrangeiros, o que leva a uma conhecida reflexão, de que muitos editais "nacionais", que sequer estão preparados para uma efetiva disputa com estrangeiros (não possuem regras sobre NCM, Incoterms, moeda estrangeira, carta de crédito e outras matérias essenciais), no fundo, precisam ser reformulados e haver rumo de licitações internacionais e isso também sem bloqueio ou proibição de estrangeiros na disputa.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!