Reflexões Trabalhistas

Validade de cláusula negocial que cria benefício de assistência à saúde

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho consultor jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos entre eles Direito Ambiental do Trabalho e a Saúde do Trabalhador.

27 de janeiro de 2023, 8h24

Das muitas funções dos sindicatos as de representação (CF, 8°, III — "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas") e a negocial (CF, 8°, VI — "é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho") são das mais importantes.

Enquanto isso, das funções da negociação coletiva destacam-se a normativa (criar normas coletivas aplicáveis às relações individuais de trabalho), a econômica (formas de distribuição de riqueza, possuindo um caráter econômico) e a social (permite a participação dos trabalhadores na vida e no desenvolvimento da empresa, com implicâncias diretas nas suas próprias condições sociais de vida e trabalho).

Assim, pode-se dizer que a razão principal dos sindicatos é buscar e conquistar melhores condições sociais, de vida e de trabalho para os seus representados.

O sindicato que não cumpre a função negocial, não busca melhorar as condições de vida dos trabalhadores, não cumpre seu papel.

Mas, ainda existem sindicatos no Brasil, que, não obstante as dificuldades encontradas perante os empregadores nos últimos tempos, nas negociações coletivas, buscam cumprir seu papel e cada ano tentam obter novas e melhores condições de vida e de trabalho para seus representados, sendo o caso, por exemplo, de benefício de assistência à saúde aos trabalhadores, pago pelos empregadores para a prestação de serviços de atendimento médico ambulatorial de baixa complexidade, atendimento odontológico e exames laboratoriais.

Os sindicatos que atuam nessa linha estão cumprindo o seu verdadeiro papel, não havendo irregularidade na criação da cláusula que institui o custeio pelas empresas, do benefício acima aludido, como insinuam alguns.

Ao contrário, entendemos ser até mesmo louvável a assinatura de instrumentos coletivos de trabalho com o setor patronal, criando benefício de assistência à saúde aos trabalhadores, pago pelos empregadores, mesmo que em valores módicos, como ocorre na prática, mas que representam importante conquista social para trabalhadores que recebem parcos salários e não contam com planos de saúde e odontológicos.

Como se sabe, os trabalhadores de baixa renda não têm acesso à assistência odontológica em nosso país (o SUS atende apenas na parte médica e, de forma precária) e também não dispõem de condições financeiras para pagar um dentista, pelo que, o beneficio da assistência odontológica negociado entre as categorias profissional e econômica em alguns casos é de grande importância e de alto alcance social para quem sustenta a atividade lucrativa empresarial, o que, por outro lado, representa um pouco da função social, que é inerente a todo empreendedor econômico.

A Orientação nº 08 da Conalis/MPT trata da questão a respeito da validade de cláusula de Convenção Coletiva que estabelece a obrigação de as empresas repassarem verbas ao sindicato profissional para custeio de fundo social e de determinados títulos e serviços, como ajuda de custo para assistência médica ambulatorial, odontológica e outras. Conforme essa orientação, benefícios prestados por sindicato profissional aos empregados com repasse de dinheiro pelas empresas para seu custeio, por si só, não caracteriza ato antissindical ou inobservância do artigo 2º, item 2 da Convenção nº 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Sua ementa está assim vazada:

"BENEFÍCIOS PRESTADOS AOS REPRESENTADOS PELO SINDICATO PROFISSIONAL. FINANCIAMENTO PELA EMPRESA. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. SUPOSTA
CONDUTA ANTISSINDICAL. CONVENÇÃO Nº 98 DA OIT.
I – A previsão, em norma coletiva, de repasse de verbas para o custeamento de benefícios e serviços aos trabalhadores por intermédio da respectiva entidade sindical profissional que se responsabiliza pela operacionalização e concessão dos benefícios, de acordo com critérios previamente fixados na norma coletiva ou no regulamento da entidade associativa, observada a publicidade aos trabalhadores, não constitui, por si só, ato ou conduta antissindical ou inobservância do artigo 2º, item 2 da Convenção nº 98 da Organização Internacional do Trabalho.
II – Eventual ato ou conduta antissindical deve ser analisada em cada caso concreto, com os demais elementos e condições materiais que lhe são subjacentes, como o caráter vinculado e/ou não das verbas e à efetiva concessão dos benefícios ou serviços pela entidade sindical ou da tentativa/existência de ingerência ou controle do sindicato profissional pelo empregador ou entidade patronal".

Autores

  • é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre eles, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

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