Licitações e Contratos

As licitações internacionais e os contratos com carta de crédito

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

13 de janeiro de 2023, 14h55

Muito além da limitada definição de licitação internacional, como sendo aquela "processada em território nacional na qual é admitida a participação de licitantes estrangeiros, com a possibilidade de cotação de preços em moeda estrangeira, ou licitação na qual o objeto contratual pode ou deve ser executado no todo ou em parte em território estrangeiro" (artigo 6º, inciso XXXV, da Lei nº 14.133/2021), é preciso compreender algo fundamental para seu êxito: a carta de crédito.

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Superando as transferências internacionais, a carta de crédito segue como o meio mais utilizado pelos órgãos públicos brasileiros para o pagamento de fornecedores estrangeiros, especialmente em áreas de veículos, aeronaves, produtos para segurança pública e defesa nacional, dispositivos médicos, equipamentos para pesquisa e outras demandas.

Essa posição de meio de pagamento mais adotado se deve à segurança para ambas as partes.

Ente público (importador) não está antecipando um pagamento, mas fazendo uma operação com banco (passando um compromisso de valor do orçamento público em reais para um montante fixo na moeda estrangeira, prevista no contrato), evitando riscos de oscilações cambiais ao longo do tempo, resguardando a operação de comércio exterior e conferindo segurança ao fornecedor estrangeiro (exportador) de que ele não irá embarcar mercadoria sem ter a garantia em banco para cobertura da operação.

Entretanto, a depender de como um edital de licitação tem suas cláusulas relativas a esse meio de pagamento do contrato, o resultado pode ser negativo, afastando competidores estrangeiros.

Nesse contexto, seguem dicas importantes sobre a matéria:

1) não se pode presumir recebimento do objeto importado, no Brasil, porque nenhum banco irá liberar o pagamento se não houver documento que comprove que o objeto teve o respectivo aceite (edital não pode estabelecer que a superação de determinado prazo para o órgão público conferir o objeto gera presunção de que ele foi recebido, pois isso não viabiliza o pagamento pelo banco);

2) as contratações governamentais brasileiras também consideram o regramento a norma UCP 600 ("Uniform Customs and Practice for Documentary Credits"), da Câmara de Comércio Internacional (ICC), mas é importante esclarecer ao licitante estrangeiro que aquele regramento da UCP 600 será respeitado, mesmo que não haja no edital da licitação um modelo de carta de crédito (a informação clara disso tudo tranquiliza o estrangeiro para tomar parte na licitação, ou seja, aumenta a competitividade);

3) inobstante o regramento padrão de carta de crédito, com a segurança que os estrangeiros já conhecem, também é importante informar no edital que o pagamento acontecerá considerando a legislação de compras públicas brasileiras, que tem como base a verificação para o aceite do objeto (pagamento, portanto, posterior);

4) editais até podem mencionar que os custos da carta de crédito devem ser suportados pelo fornecedor estrangeiro, mas as questões precisam estar claras e as taxas variam muito entre os bancos, de modo que participar de licitações em alguns órgãos, a depender de quais bancos eles utilizam, fica mais dispendioso, o que afasta competidores;

5) deve-se avaliar o prejuízo dos vínculos entre bancos e órgãos públicos, pois as taxas podem variar muito, sendo que alguns cobram, além de valor fixo em reais, também percentual de algo como 1,5%, outros 2% ou 3%, conforme se verifica de tabelas dos próprios bancos e, ainda, falta uma negociação mais específica de alguns órgãos públicos com seu respectivos bancos, para reduzir a taxa inicial e a de renovação, o que amplia a competição na licitação;

6) outra questão relevante é a sincronia e o senso de realidade que se deve ter, especialmente, para as entregas de objetos que são fabricados por demanda e envolvem um, dois ou três anos para as entregas, pois, dependendo do banco, se tem multiplicação das taxas para cada ano ou período inferior, e isso sobre o valor total do objeto inviabiliza o contrato, por exemplo, com 2% + 2% + 2%, causando exponencial sequência de perdas econômico-financeiras no contrato; e

7) embora uma mesma carta de crédito possa ser contratada para cobrir operações de comércio exterior de objetos entregues de forma parcelada, o edital deve ser elaborado considerando prazos realistas com as operações de autorizações de importações e exportações, com as autoridades de controle e aduana de cada país, até para evitar que se tenha o danoso efeito de multiplicação de reiteradas renovações de carta de crédito, como tratado no tópico anterior.

Enfim, essas são algumas das balizas elementares sobre custos, prazos e informações relativas à carta de crédito e que fazem muita diferença para dar à licitação pública internacional o potencial de maior competitividade.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

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