Opinião

Uso de provas obtidas por meio digital na Justiça do Trabalho

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18 de dezembro de 2023, 20h41

É imprescindível que o processo do Trabalho se adapte à realidade das novas tecnologias, valendo-se de provas também por meios digitais. Para tanto, já se tem visto que a Justiça do Trabalho já iniciou um movimento para o uso de provas obtidas por meio digital, e o que se entende é que há uma maior confiabilidade e precisão desse tipo de prova e que ela pode ser uma boa aliada para a resolução dos conflitos.

Neste sentido, vale destacar uma uma reportagem de 2021 que demonstra a iniciativa da então presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Maria Cristina Peduzzi, e da diretora da Escola Nacional e Magistratura do Trabalho (Enamat), Dora Maria da Costa, quanto ao treinamento oficial de magistrados e servidores para produção de provas digitais. Segundo a ministra, o direito ao recebimento de horas extras, por exemplo, seria confirmado ou rejeitado com geolocalização por celular, já que esta ferramenta poderia atestar ou descartar permanência no local de trabalho. Essa fala da ministra demonstra, claramente, o posicionamento que deverá ser o vetor da Justiça do Trabalho.

A utilização de tais meios ganhou ainda mais importância neste contexto atual de audiências virtuais, que já começa a seguir com a evolução da instituição do Juízo 100% digital por tribunais regionais.

Atualmente, é difícil imaginar relações de trabalho sem estarem atreladas ao uso de diversas ferramentas digitais. A utilização de dados e informações digitais para a demonstração de fatos é quase uma necessidade nos dias de hoje. Por essa razão que a Justiça do Trabalho foi, inclusive, pioneira na utilização de meios eletrônicos processuais, com a adoção de citação via WhatsApp e uso de dados obtidos em redes sociais para elidir controvérsias instauradas nos processos.

Já em 2014, a Justiça do Trabalho se utilizou de provas digitais, de fontes abertas, para comprovar que uma enfermeira usou atestado falso para faltar ao trabalho.

As provas digitais nascem para dar maior eficiência probatória ao processo, por atenderem a uma nova sociedade, digital e interconectada. Se todas as nossas condutas são realizadas em uma seara cibernética, é lá que vamos coletar os registros necessários para fazer prova dessa mesma conduta”, explicou o promotor de Justiça e especialista em provas digitais Fabrício Rabelo Patury.

A ideia é que essas provas objetivas, obtidas de fontes abertas e fechadas, oriundas de fotos e áudios nas redes sociais, geolocalização por celular, e-mails, base de dados, entre outros, sejam usadas com eficiência ou até mesmo como contraprova para verificar possíveis falsos testemunhos.

Certamente, a utilização de prova digital, na Justiça do Trabalho vai trazer muitos pontos positivos, porque vão ser obtidas provas concretas, robustas e confiáveis, que se apresentarão com maior proximidade da verdade real.

A produção de provas é o meio que as partes se utilizam para comprovar ao juízo a verdade dos fatos que por elas são alegados. O artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho diz que o ônus da prova incumbe ao reclamante, quanto ao fato constitutivo de seu direito, e ao reclamado, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do reclamante. Assim, se o reclamante alegar que tem direito a alguma verba trabalhista, ele deve comprovar que realmente tem esse direito. De outro lado, se a reclamada alegar um fato que vai sustar, modificar ou extinguir o direito que o reclamante alega ter, cabe a ela o encargo do ônus da prova das suas alegações.

Os meios de provas comumente admitidos na Justiça do Trabalho são: documentos, áudios e vídeos, depoimentos pessoais, oitivas de testemunhas, prova pericial, inspeção judicial, provas emprestadas. Entretanto, pode o juiz, caso o julgue necessário, tomar a iniciativa de procurar novos meios de certeza, mesmo não requeridos pelas partes.

O magistrado é o dirigente do processo, cabendo-lhe conduzi-lo da maneira que entender apropriada. Em busca da verdade, ele pode determinar, caso a matéria não lhe pareça suficientemente demonstrada, a realização de outras provas. Ademais, reputando o juiz que a questão está esclarecida pelas provas constantes nos autos e considerando o seu livre convencimento, ele não está obrigado a aceitar a utilização de outros meios de provas, em virtude do princípio do livre convencimento motivado, da teoria da persuasão racional e da ampla liberdade na direção do processo de que está investido o magistrado trabalhista, a teor do artigo 765 da CLT.

Isso quer dizer que, na prática, o magistrado pode conduzir todo o processo como melhor entender para descobrir a verdade real dos fatos: pode fazer perguntas, convocar testemunhas, determinar a realização de perícia, indeferir provas e tudo o mais que entender necessário para se convencer do que realmente aconteceu.

Com a crescente expansão da informatização na sociedade, a Justiça do Trabalho tem caminhado para a aceitação da utilização dos meios digitais como prova. As provas obtidas por meios digitais vêm sendo utilizadas como prova material e processual e poderá auxiliar na formação do convencimento dos magistrados, principalmente quando a prova oral demostrar algum tipo de fragilidade.

A possibilidade da utilização desse meio de prova encontra amparo nos artigo 765, da CLT, que disciplina que os juízos terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas, bem como no artigo 369, do CPC, que diz que as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados naquele normativo legal, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

A verdade é que a utilização de provas digitais no processo do trabalho vem ganhando força e validade jurídica, se tornando um meio de comprovar os fatos e garantir os direitos de ambas as partes, com a real demonstração da veracidade das alegações prestadas nos litígios.

Na Justiça do Trabalho, a audiência de instrução se reveste de fundamental importância, porque sobrevaloriza o princípio da oralidade, e, por essa razão, a prova testemunhal tem um peso grande na convicção dos magistrados. No entanto, é sabido que os fatos alegados pelas testemunhas muitas vezes não são admissíveis e as condenações são baseadas nesses depoimentos conflitantes e descompromissados com a verdade. Por vezes, há, ainda, condenações pela impossibilidade da parte contrária apresentar contraprova por ausência de pessoas que tenham presenciado os fatos controvertidos.

Assim, é imperioso que a Justiça do Trabalho se adapte à realidade, valendo-se de provas também por meios digitais, que vão identificar a verdade dos fatos com muito mais segurança.

Pode-se dizer que prova digital é tudo aquilo que se apresenta para a comprovação de um fato que tenha ocorrido no mundo digital. Na esfera das relações laborais, são aquelas provas produzidas, por exemplo, em bancos de dados das empresas, filmagens de câmeras de segurança, ferramentas de geoprocessamento, e-mails, biometrias, publicações em redes sociais.

Para Roberta Obino, “a utilização das provas obtidas por meio digitais tende a atuar como um freio à prova testemunhal, garantindo a maior eficácia do devido processo legal, já que a prova oral, muitas vezes, apresenta contradições e má-fé”.

Assim, a utilização de provas obtidas por meio digitais pode ser muito mais eficiente do que a tradicional prova testemunhal. Se o Princípio da Primazia da Realidade tem destacada importância no Direito do Trabalho, tem-se que a verdade é mais fácil de ser alcançada através das provas digitais, já que não apresentam contradições e má-fé, muitas vezes existentes nas provas testemunhais.

Como se tem entendido que as provas digitais se apresentam como uma prova mais próxima da verdade real, elas se tornam mais confiável e que, por via de consequência, trará um resultado mais justo ao processo.

Os prints de conversas em aplicativos, postagens em redes sociais, envio/recebimento de e-mails, entre outros, estão sendo utilizados de forma recorrente nos processos trabalhistas, como forma de comprovar o labor em horário extraordinário ou em dias de descanso, a apresentação de atestado falso ou comprovação de relação de emprego, por exemplo.

Ademais, ainda que as provas obtidas por meio digitais tenham demonstrado mais segurança e confiabilidade quanto à realidade dos fatos, não há nenhuma incompatibilidade entre o uso da prova testemunhal e as provas digitais. Isso porque está autorizado, processualmente, o uso de todos os meios de provas, desde que legítimos e lícitos, e não há nenhuma hierarquia entre eles.

Como já dito, o magistrado é o dirigente do processo e é o destinatário das provas produzidas. Cabe a ele analisar cada caso concreto, para firmar seu convencimento, podendo, inclusive, dispensar a produção de outras provas, como a testemunhal, se ele entender que a prova digital for suficiente para elucidação dos fatos.

O artigo 422, do CPC, dispõe que “qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a cinematográfica, a fonográfica ou de outra espécie, tem aptidão para fazer prova dos fatos ou das coisas representadas, se a sua conformidade com o documento original não for impugnada por aquele contra quem foi produzida”. Dessa forma, cabe a parte que requerer a utilização da prova digital se valer de todos os meios para comprovar a veracidade das informações/fatos trazidos aos autos.

Nos processos trabalhistas, a apresentação de ata notarial já tem sido bastante utilizada, já que faz um registro dos fatos de forma minuciosa e confiável, emitida por cartório, por sua vez dotado de fé pública, além da utilização de site de registros de dados digitais.

Em relação a violação ou não à Lei Geral de Proteção de Dados, já que há a coleta e armazenamento de dados de terceiros, e que tem preocupado e gerado questionamento nos magistrados e nas próprias partes, o que se espera, em primeiro plano, é que esses meios de prova já estejam adequados à LPGD, o que vai garantir a integridade e autenticidade das informações. Além disso, também, não há o que se falar em violação à referida lei, pois, conforme autoriza o artigo 7º, inciso VI, o tratamento de dados pessoais poderá ser realizado para o exercício regular de direitos em processo judicial. A utilização de provas digitais apenas vai garantir a comprovação de matérias fáticas dentro do processo trabalhista.

No mundo tecnológico em que vivemos, é imprescindível repensar e reconsiderar o modelo conservador de produção de provas, baseado, principalmente, na oitiva de testemunhas. A nova forma de trabalho, aliada à interação com recursos tecnológicos no desempenho das atividades laborativas, faz com que a utilização dos registros digitais se torne uma realidade para demonstração dos fatos.

Podem as partes se utilizarem das mais diversas formas de obter a verdade dos fatos, cabendo ao magistrado a busca de provas que retratam, de forma mais verdadeira possível, a realidade do caso em apreço.

A utilização de provas obtidas por meio de digital tem se tornado um meio válido e eficaz para o fim que as partes almejam e já vem ganhando grande visibilidade na Justiça do Trabalho, não restando dúvidas que elas se farão presentes no futuro dessa especializada. São inúmeras as ferramentas e possibilidade de obtenção de provas digitais.

Assim, é possível concluir que as provas digitais vieram para complementar e dar mais veracidade, inclusive, aos meios de provas admitidos. A utilização da tecnologia vai aperfeiçoar e dar mais efetividade a prestação jurisdicional, aliada ao princípio da primazia da realidade.

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