Licitações e Contratos

Contratos governamentais e os prejuízos do atraso no pagamento

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

7 de abril de 2023, 11h32

Em países integrantes do Agreement on Government Procurement, conhecido como GPA ou Acordo de Compras Públicas, da Organização Mundial do Comércio, há um rigor de prazos para verificação de quantidade, qualidade e demais requisitos de um objeto entregue, para aferição de conformidade com o contrato, além de prazos de pagamento.

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Apenas como exemplo, o Federal Acquisition Regulation (FAR), o regulamento de aquisições do governo federal dos EUA, há menção ao prazo de sete dias para aceitação (verificação e recebimento do objeto), mais 30 dias para pagamento, como regra geral, havendo prazos menores, como 14 dias em contratos de construção, além de outros ainda mais curtos, de dez ou sete dias, a depender de certos itens de alimentação e outros específicos.

No Brasil, o artigo 55, inciso IV, da Lei 8.666/1993, prevê que o contrato deve ter cláusula com prazo de observação e recebimento definitivo, mas o artigo 73, parágrafo 3º, chega ao extremo de mencionar que pode haver prazo de recebimento definitivo de até 90 dias.

Se esse prazo for somado aos 30 dias para pagamento, do artigo 40, inciso XIV, alínea “a”, mais 90 dias para suspensão ou rescisão pelo contratado, em caso de atraso de pagamento, como consta do artigo 78, inciso XV, daquela lei, pode-se passar de um semestre entre objeto entregue e efetivo pagamento.

Por tais razões o Brasil paga tão caro em contratações públicas, em comparação com outros países, especialmente, integrantes do GPA, nos quais os pagamentos ocorrem em torno de 15 dias, em grande parte dos contratos.

Toda a demora verificada no Brasil milita contra o princípio da economicidade, do artigo 70 da Constituição Federal, vez que as empresas contratadas precisam ter em conta altos custos de financiamento de capital de giro e, algumas outras, além disso, contratos de seguro de câmbio (hedge), a depender do objeto.

Feitas essas considerações, cumpre lembrar que a Lei 14.133/2021, a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, estabelece em seu artigo 92, inciso VII, que o contrato deve ter cláusula com prazo de observação e recebimento definitivo, mas, ao contrário da lei anterior, não há menção expressa a um limite de tempo (isso será definido em regulamento ou no contrato, conforme o artigo 140, parágrafo 3º, da lei).

Também não há um prazo expresso para pagamento, mas a lei traz menções várias a respeito do que deve constar dos instrumentos formais do processo:

1) critério de pagamento no termo de referência (artigo 6º, inciso XXIII, alínea “g”);

2) definição de condição de pagamento na etapa de planejamento da licitação (artigo 18, inciso III);

3) condição de pagamento como regra obrigatória de edital de licitação (artigo 25);

4) condições de pagamento semelhantes às do setor privado, isso considerado desde a etapa de planejamento das compras (artigo 40, inciso I); e

5) cláusulas obrigatórias em todo contrato sobre condições de pagamento (artigo 92, inciso V) e prazo para pagamento (artigo 92, inciso VI).

Por fim, o direito de extinção de contrato está previsto para o caso de atraso de pagamento superior a dois meses, conforme o artigo 137, parágrafo 2º, inciso IV, sendo ainda oportuna a menção ao direito de suspensão de execução no parágrafo 3º, inciso II, do mesmo dispositivo.

Por que a nova lei definiu direitos contra o atraso que ultrapasse dois meses de vencimento do pagamento, mas não definiu o que seria prévio e essencial, ou seja, o prazo máximo aceitável para pagamento?

É preciso ponderar que nem mesmo a diversidade de objetos serve como justificativa para o que ocorreu, porque deixar isso para regulamentos e contratos levará todos a uma grande insegurança jurídica, por falta de prévio parâmetro “legal”.

Pelos mais diversos países a definição de limite para pagamento está em texto de lei, mas o Brasil pagará o preço dessa mencionada insegurança jurídica, por ter deixado a matéria livre para regulamentos dos mais diversos, pelo país inteiro e caso a caso (até dentro de cada contrato), sem um parâmetro de base para exercício do controle de direitos e obrigações.

E quanto mais aberto ficar o prazo de pagamento, mais a economicidade se afastará.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

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