Ouro de tolo

Gilmar Mendes suspende presunção de boa fé de compradores de ouro

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5 de abril de 2023, 8h47

Presumir a boa fé de quem compra ouro atrapalha o controle e a fiscalização de uma atividade que é inerentemente poluidora, uma vez que essa prática não só facilita como incentiva a comercialização de ouro originário de garimpo ilegal.

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Com base nesse entendimento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu a eficácia do parágrafo 4º do artigo 39 da Lei 12.844/2013, que previa justamente a presunção de "legalidade do ouro adquirido e a boa-fé da pessoa jurídica adquirente".

Em decisão liminar, o ministro analisou que o dispositivo inviabilizou o monitoramento ao desresponsabilizar o comprador, "o que incentivou o mercado ilegal, levando ao crescimento da degradação ambiental e ao aumento da violência nos municípios em que o garimpo é ilegal".

Ele afirmou ainda que é preciso paralisar, o quanto antes, "esse consórcio espúrio, formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas".

Na fundamentação, Gilmar destacou jurisprudência da Corte que considerou inconstitucionais normas que, com o pretexto de desburocratizar o licenciamento ambiental, acabavam afastando ou enfraquecendo o controle dos danos causados ao meio ambiente (ADI 5.312; ADI 4.901).

Segundo ele, no caso das alterações promovidas pela lei de 2013, "não é difícil verificar que a simplificação do processo de compra de ouro permitiu a expansão do comércio ilegal, fortalecendo as atividades de garimpo ilegal, o desmatamento, a contaminação de rios, a violência nas regiões de garimpo, chegando a atingir os povos indígenas das áreas afetadas."

Gilmar deu 90 dias para que o poder público adote um novo marco normativo para a fiscalização do comércio do ouro e medidas legislativas, regulatórias e administrativas que inviabilizem a compra de ouro extraído de áreas de proteção ambiental e de terras indígenas.

A decisão será submetida ao referendo do Plenário por meio de julgamento virtual. A decisão de Gilmar se aplica a duas ADIs: uma delas proposta em conjunto pelo PSB e a Rede Sustentabilidade, e outra proposta pelo Partido Verde. As legendas alegavam que o artigo 39 da Lei Federal 12.844/2013 reduz as responsabilidades das DTVMS por irregularidades referentes à origem do ouro da Amazônia, possibilitando o comércio ilegal de ouro ao dispensar mecanismos mais rígidos de fiscalização da atividade.

“A decisão é de extrema relevância porque suspende norma que desestimula o Poder Público a desenvolver seus mecanismos de controle e monitoramento da cadeia de extração e comércio de ouro no país e tenta legitimar o metal recebido nas DTVMs, apagando eventuais irregularidades existentes na da cadeia”, disse o advogado Rafael Carneiro, sócio do Carneiros Advogados, que representa o PSB, autor da ação.

Perdas e danos
Gilmar ouviu órgãos, entidades e autarquias ligadas ao governo federal e à fiscalização das atividades para tomar sua decisão. Ele destacou informações do Ministério da Justiça que dão conta do aumento do garimpo na Amazônia nas duas últimas décadas, em áreas em que essa atividade é proibida.

A diretoria da Polícia Federal opinou que o afrouxamento regulatório promovido pela lei diminuiu a fiscalização das operações de compra e venda de ouro. Também avaliou que a presunção de legalidade só favorece as ações criminosas, uma vez que há grande dificuldade de controlar a origem do metal comercializado.

O Ministério do Meio Ambiente, por sua vez, informou que, além dos danos ao meio ambiente, o garimpo ilegal abre caminho para outros crimes, como tráfico de drogas e armas, assassinatos, prostituição, lavagem de dinheiro e formação de organizações criminosas.

Clique aqui para ler a decisão
ADI 7.345

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