Conjecturas jurídicas

Legalmente, Trump pode concorrer à Presidência ainda que condenado à prisão

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23 de novembro de 2022, 8h22

Nos próximos anos, o ex-presidente Donald Trump vai enfrentar batalhas em duas frentes — ambas morro acima: pelo menos três acusações criminais, que podem lhe render penas de prisão; e duas campanhas eleitorais acirradas, uma nas primárias, contra outros candidatos republicanos que podem vencê-lo, e outra contra um candidato democrata na eleição de novembro de 2024 para a Presidência dos Estados Unidos.

Isac Nóbrega/PR
O ex-presidente Donald Trump enfrenta
pelo menos três acusações criminais

Assim, desde que Trump anunciou sua candidatura à Presidência, no último dia 15, abriu-se nos EUA a temporada de conjecturas jurídicas: Trump pode disputar as eleições e governar o país se for condenado à prisão? A resposta unânime dos nove juristas consultados pela revista eletrônica Insider é: sim, ele pode.

O argumento é que não há nada na Constituição do país que proíba um prisioneiro de se candidatar a presidente. As únicas exigências constitucionais são as de que o candidato seja nascido nos EUA; tenha pelo menos 35 anos de idade; e seja residente no país nos últimos 14 anos. Nada mais.

Na verdade, dois candidatos concorreram à Presidência no passado mesmo estando atrás das grades: em 1920, o candidato socialista Eugene Debs, que foi condenado por traição por se opor à entrada dos EUA na Primeira Guerra Mundial (e obteve 3,5% dos votos nacionalmente); e, em 1992, Lyndon LaRouch foi candidato depois de ter sido condenado por fraude postal em 1988 (nos EUA, uma pessoa é condenada por fraude postal (mail fraud) quando usa o correio para aplicar golpes em — ou defraudar — outras pessoas. E por fraude eletrônica (wire fraud) quando usa meios eletrônicos para esse fim). Ambos concorreram da prisão.

Trump ainda não foi denunciado por qualquer crime, mas o Departamento de Justiça poderá fazê-lo em dois casos criminais: um por ter desviado para sua mansão na Flórida (Mar-a-Lago) documentos oficiais, carimbados como confidenciais, secretos e ultrassecretos; outro por ter incitado a invasão do Congresso em 6 de janeiro de 2021, na tentativa de impedir a confirmação da eleição de Joe Biden para a Presidência. E um grand jury na Geórgia investiga seus esforços para subverter o resultado da eleição presidencial de 2020 no estado.

Uma condenação pelo ataque ao Congresso seria mais séria, pois poderia acabar com a carreira política de Trump, isso se a Justiça concluir que ele violou a 14ª Emenda da Constituição. Essa emenda barra candidaturas a cargos públicos de pessoas que "se engajaram em insurreição ou rebelião" ou forneceram "ajuda ou conforto" a inimigos dos EUA.

Há um outro obstáculo às pretensões de Trump, mas é disputável na Justiça, segundo a Bloomberg. Uma lei federal proíbe as autoridades de remover ou destruir documentos governamentais. Se isso acontecer, a autoridade pode ser impedida de ocupar cargo público. No entanto, tal lei pode ser considerada inconstitucional, porque essa não é uma das exigências da Constituição para um cidadão se tornar presidente.

Da mesma forma, projetos de lei discutidos em Assembleias Legislativas de 19 estados sobre a exigência de candidatos a presidente apresentarem declarações de Imposto de Renda morreram no nascedouro, porque essa não é uma das exigências da Constituição. Trump nunca divulgou suas declarações de Imposto de Renda, apesar de haver prometido fazê-lo se fosse eleito presidente.

Para mudar ou acrescentar exigências como essa é preciso aprovar uma emenda constitucional. Qualquer emenda deve ser aprovada por dois terços das duas casas do Congresso e ratificada por três quartos das Assembleias Legislativas dos estados. Desde 1789, 11 mil emendas foram propostas, mas apenas 27 foram aprovadas.

Curiosamente, a regra constitucional (da 14ª Emenda) só vale para cargos públicos federais — não para estados e municípios, que estabelecem suas próprias regras. Por exemplo, o ex-governador de Illinois Rod Blagojevich, que foi condenado por corrupção e passou oito anos em uma prisão federal (até ser perdoado por Trump), não pode ocupar cargos públicos estaduais ou municipais, mas pode concorrer a um cargo público do governo federal.

Nas eleições primárias do Partido Republicano, Trump vai enfrentar alguns candidatos fortes, como o ex-vice-presidente Mike Pence; o governador da Flórida, Ron DeSantis; o governador de Virgínia, Glenn Youngkin; o ex-governador de Maryland Larry Hogan; o senador Tim Scott, da Carolina do Norte; o ex-secretário de Estado Mike Pompeo; e a deputada federal Liz Cheney, que não foi reeleita por votar a favor do impeachment do ex-presidente e participar da comissão da Câmara que investiga o ataque ao Congresso, mas que deverá se candidatar apenas para dar trabalho a Trump.

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