Reflexões Trabalhistas

Trabalho em dia de jogo do Brasil na Copa do Mundo de 2022

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11 de novembro de 2022, 8h00

As eleições no Brasil dividiram a população e criaram animosidades nos principais ambientes sociais, seja nos grupos familiares, seja nos grupos de trabalho. Felizmente, a expectativa é que tal divisão se dissipe, ou ao menos diminua, com a Copa do Mundo de 2022.

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O jogo de abertura ocorrerá no próximo dia 20 de novembro e nossa esperança é que os brasileiros deixem as desavenças políticas de lado e se unam em uma mesma torcida.

Os primeiros jogos do Brasil acontecerão nos dias 24 e 28 de novembro, respectivamente contra a Sérvia e Suíça, e no dia 2 de dezembro, contra Camarões.

Nos dias de jogo da seleção brasileira, o país costuma parar. Muitas empresas paralisam suas atividades, o trânsito no horário dos jogos praticamente não existe e os bares ficam lotados de torcedores.

Mas os empregados têm o direito de não trabalhar nestes dias? É obrigatória a concessão de folga aos trabalhadores durante os jogos da seleção brasileira?

Algumas prefeituras já anunciaram que deverão alterar o expediente de suas repartições públicas nos dias de jogo da seleção. Outras determinaram ponto facultativo nestes dias. A Mesa Diretora da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), por exemplo, decretou ponto facultativo ou expediente reduzido nos dias de jogos do Brasil da primeira fase da Copa do Mundo 2022 [1]. Muitos tribunais também alteraram o horário do expediente em seus órgãos, nos meses de novembro e dezembro, em razão da Copa do Mundo.

Porém, apesar de algumas cidades decretarem ponto facultativo, com a dispensa de funcionamento de seus órgãos e do trabalho de seus servidores, a observância desta regra, no setor privado, não é obrigatória já que as empresas podem exigir que seus empregados trabalhem normalmente.

Os dias de jogo da seleção não são considerados feriados e, consequentemente, se o empregado faltar ou se recusar a trabalhar poderá ser advertido; ter o dia de trabalho descontado; além de perder o direito à remuneração do descanso semanal.

Assim, a dispensa total ou parcial do trabalho dos empregados varia, pois as empresas têm autonomia total para decidir quanto à exigência ou não da prestação de serviços.

Algumas empresas podem determinar que o trabalho nos dias de jogo seja realizado em home office; outras podem autorizar que seus empregados assistam aos jogos, durante o expediente, no próprio estabelecimento; outras podem ainda, diminuir a jornada para que os trabalhadores acompanhem os jogos de suas residências. Existem as empresas que vão negociar a compensação do período relativo às horas de jogo; e, aquelas que, simplesmente, irão conceder folga aos empregados, sem exigir qualquer compensação.

De fato, havendo a possibilidade da prestação de serviços de forma remota, nada impede que o empregador permita, que nos dias de jogo da seleção brasileira, os empregados executem suas atividades em regime de teletrabalho. Nesta hipótese, os empregados terão a possibilidade de assistir aos jogos, durante o trabalho, sem os inconvenientes de deslocamento.

Não havendo a possibilidade da execução do trabalho remoto, o empregador, por sua vez, pode permitir que os empregados assistam aos jogos durante o expediente, na própria empresa. Neste caso, os empregados continuarão cumprindo suas atividades, mas terão a liberdade de assistir aos jogos com os companheiros de trabalho. Se a empresa optar pela paralisação das atividades apenas durante o horário de jogo, não poderá exigir de seus empregados a compensação desse período, nem descontar as horas não trabalhadas do salário.

Muitas companhias, por exemplo, alteram o expediente de trabalho, encerrando suas atividades mais cedo e liberando os empregados para que eles acompanhem a transmissão dos jogos. Neste caso, será possível negociar a compensação do período por meio de acordo de compensação de horas.

Segundo o artigo 59 da CLT, o acordo de compensação de horas poderá ser negociado individualmente com o empregado, sem a necessidade da participação do sindicato da categoria. Se a compensação das horas não trabalhadas ocorrer no mesmo mês, o acordo não precisa ser escrito, podendo ser verbal ou tácito. Havendo acordo escrito negociado diretamente com o empregado, a compensação de horas poderá ser realizada em até seis meses. E, se o acordo for firmado entre empregador e o sindicato da categoria profissional, a compensação poderá ocorrer até o limite de um ano.

Vale observar que as horas não trabalhadas em virtude dos jogos poderão ser compensadas mediante o acréscimo de duas horas na jornada de trabalho, sem ultrapassar o limite máximo de dez horas diárias.

Por fim, como a decisão sobre a obrigatoriedade do trabalho durante os jogos compete ao empregador, é importante que os empregados acatem as determinações sob pena de serem advertidos ou, até mesmo, dispensados por justa causa, desde que o ato de desrespeito praticado pelo empregado não seja isolado.

O TST manteve a decisão do Tribunal Regional do Trabalho de origem que afastou a justa causa aplicada ao empregado, apesar de seu depoimento pessoal, no qual afirmou:

"(…) que no dia 02, dia de jogo da Copa, saíram para comemorar, onde ingeriu bebida alcoólica, e não retornou ao serviço; (…) que no dia 02 voltou à empresa, porém não para trabalhar, apenas para pegar pertences, isso por volta das 16h;"

Ao examinar a questão, entendeu a ministra Maria Helena Mallmann que:

"Como se pode observar, o autor não nega a ingestão de bebida alcoólica, mas a testemunha da ré também não confirma que ele tenha trabalhado embriagado.

O ocorrido no dia do jogo da copa do mundo constitui um fato isolado, não se mostrando suficiente para justificar a dispensa do trabalhador por justa causa, mormente se considerarmos que a empresa deixou de observar a gradação das penalidades que podem ser impostas ao trabalhador, adequando-a ao caso concreto" [2]

Portanto, no caso em epígrafe, verifica-se que a dispensa por justa causa imposta ao empregado foi excessiva, seja porque não restou comprovado que o autor tenha trabalhado embriagado, seja porque não foi demonstrada a prática de ato que caracterize a quebra de confiança. Ao contrário, a ausência do autor ao trabalho não se deu por contumácia, sendo um caso isolado que demandaria a aplicação de uma penalidade mais moderada.

 


[2] TST – AIRR: 10010064920185020087, relator: Maria Helena Mallmann, 2ª Turma, data de publicação: 3/5/2021

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