Impossibilidade de julgamento da greve política
13 de maio de 2022, 8h02
A Constituição Federal, ao assegurar no artigo 9º o direito à greve e, dispondo que cabe exclusivamente aos trabalhadores "decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender", fixou o direito sem reservas, mas que, certamente, não poderia ser exercido sem qualquer responsabilidade. Neste sentido, a primeira consequência de uma greve, política ou não, é a perda da remuneração dos dias parados (salvo raras exceções), situação que poderia ser superada se os sindicatos criassem o chamado fundo de greve, cuja finalidade é de assegurar aos grevistas a garantia, pelo menos, de parte dos salários durante a greve.
Quanto à intervenção do Judiciário Trabalhista no julgamento dos dissídios, o parágrafo 2º do artigo 114 da CF resolveu sua competência, desde que as partes se manifestem de comum acordo.
Todavia, tema mais complexo para submeter a julgamento é o da greve política e as perguntas a responder seriam: deve ser submetido a julgamento a manifestação política? Até onde pode o Estado-juiz impor condenações à liberdade de manifestação? O objeto da greve de natureza política não é de natureza trabalhista stricto sensu, ou seja, não se pretende que o empregador ou empregadores atendam a reivindicação manifestada que, em geral, ocorre contra mudanças legislativas que possam afetar o direito dos trabalhadores ou de manifestações de solidariedade a uma causa social, regional, nacional ou internacional. A greve nestes casos tem como objetivo tornar público uma denúncia ou ameaça de ato praticado ou a ser praticado e que pode afetar, na percepção dos grevistas, gravemente a sociedade. Neste sentido, na França, em 2018, as manifestações dos chamados "coletes amarelos" (gilets jaunes) foram enfrentadas pelo governo sem intervenção judicial.
Desta feita, considerando que a competência da Justiça do Trabalho está limitada a decidir, quando provocada, sobre movimentos paredistas de cunho essencialmente trabalhista, pareceria que quando a greve é de natureza política, não estaria no seu campo de competência.
Todavia, de fato, é frequente que a Justiça do Trabalho seja provocada para julgar greves de natureza política.
O sítio do TST, em 4/5/22, com a manchete "Greve de rodoviários do Espírito Santo contra reforma da previdência é considerada abusiva", deu notícia de que a Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho no processo ROT-303-39.2019.5.17.0000 "declarou abusiva a greve deflagrada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Espírito Santo (Sindirodoviários), em 14/6/2019, contra a emenda constitucional de reforma da previdência social em tramitação, na época, no Congresso Nacional. De acordo com o colegiado, a paralisação teve motivação política, com pretensões que não poderiam ser atendidas pelo empregador. A decisão autoriza o desconto do dia parado nos salários de quem participou do movimento".
A relatora, ministra Delaíde Miranda Arantes, embora se posicione diferentemente, seguiu o entendimento do colegiado, considerando que a greve tinha cunho político e por esta razão era abusiva e o dia parado deveria ser descontado dos trabalhadores.
O TRT da 17ª Região, anteriormente, se manifestara no julgamento da seguinte forma pretendendo admitir a competência pelo viés trabalhista "No caso concreto a greve foi utilizada como forma de protesto na defesa de interesses profissionais atingidos pela Reforma da Previdência, sendo assim, a referida greve esteve inserida em contexto reivindicativo de direito trabalhista, em sentido amplo, não se tratando de greve político-partidária".
Todavia, conforme reconheceu a ministra, a greve é de cunho político e, assim sendo, talvez não coubesse o julgamento da manifestação política que redundou em paralisação para denunciar os prejuízos decorrentes da reforma da previdência, considerando que manifestações políticas, de natureza pacífica, não deveriam submeter-se a julgamento.
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