Retrospectiva 2022

2022 e a jornada de desafios no Direito Previdenciário

Autor

  • Sérgio Henrique Salvador

    é mestre em Direito Constitucional (FDSM) pós-graduado pela EPD-SP e PUC-SP professor de diversos cursos (graduação pós-graduação preparatórios e atualização jurídica) professor titular do Direito Unopar Itajubá coordenador acadêmico da pós-graduação em prática previdenciária da Escola Mineira de Direito (EMD) escritor com mais de 15 livros publicados em várias editoras integrante do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) Regional da OAB-MG advogado em Minas Gerais membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica tendo integrado a comitiva de pesquisadores brasileiros no 1º Congresso Internacional de Seguridade Social da Faculdade de Direito de Harvard (EUA) em agosto de 2019.

31 de dezembro de 2022, 17h41

Foi o ano de 2022 um período de agigantadas transformações sociais, econômicas, políticas e jurídicas, uma jornada de importantes desafios, notadamente a partir do pós-pandemia.

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Desafios esses igualmente vistos na seara previdenciária em diversificados enfoques.

É que a técnica previdenciária ganhou vez e voz no ambiente constitucional de 1988 e desde então tem procurado evolução no solo pátrio a partir das transformações sociais que a sociedade vive, notadamente a brasileira, de visível complexidade.

Também é fato incontroverso que o sistema jurídico nacional é conhecido pela proliferação de leis, decretos, instruções, portarias etc., razão pela qual o ordenamento jurídico previdenciário foi demasiadamente inovado durante o desafiador ano de 2022.

Por certo que a proteção oriunda do pacto previdenciário detém notável e relevante papel de destaque, tendo em vista que representa uma alternativa institucional de abrigo, tutela e acolhimento dos sujeitos envolvidos em um planejamento protetivo que visa atendê-los em situações de risco.

Assim, uma conquista, um verdadeiro primado, uma das várias premissas e metas da programação de 1988 que busca aprimoramento ao longo dos anos sob a inspiração do bem-estar a que se aderiu na essência da vigente constituição cidadã.

E de novo, o Direito Previdenciário enquanto segmento da ciência jurídica ganhou destaque ao imprimir amoldamento científico a este conteúdo previdenciário de 2022.

Não se pode deixar de registrar que ainda se vive o ambiente do pós-reforma, vale dizer, período de consolidação das novidades eclodidas a partir da Emenda Constitucional nº 103 de 13 de novembro de 2019, nominada por muitos como a "Nova Previdência".

Logo, discussões, estudos, pesquisas, embates, interpretações, judicialização e um emaranhado de controvérsias a respeito ganharam ênfase em 2022, de modo a aprimorar o texto maior e firmar suas polêmicas novidades.

Como exemplo, o excelso STF fez uma discussão parcial sobre as 12 ações de inconstitucionalidades aviadas contra o texto reformador tão logo ocorreu a sua publicação, tendo como relator o ministro Barroso, aliás, que proferiu seu voto pela manutenção da maioria das novas regras estabelecidas, cujo julgamento definitivo em plenário ainda ocorrerá em futuro próximo e certamente toda a sociedade brasileira acompanhará de perto a questão [1].

Ainda, viu-se em 2022 uma nova instrução normativa em substituição a anterior, vale dizer, sobreveio a IN 128/2022 sendo a principal norma de uso por parte do setor administrativo em seus diversos estágios do processo administrativo, seja na relação de proteção, seja de custeio [2]. Aqui uma grande novidade, tendo em vista que aludida instrução trouxe inovações de modo a simplificar os caminhos administrativos e até mesmo há amostras claras de que o INSS se curvou as teses consolidadas pelo Judiciário.

Por outro lado, mesmo que tenha, de fato, ocorrido esforço de muitos a fila do INSS continuou persistindo, tendo diminuição módica, arrastando assim ano a ano este desafiador dilema institucional, demonstrando que a gestão da autarquia deve ser rotineiramente revisitada.

Em recente noticiário [3] se divulgou que em outubro de 2022 haviam mais de cinco milhões de pessoas para serem atendidas pela autarquia, um triste cenário aos beneficiários do RGPS que buscam em cada prestação devida um modo de exercício da dignidade humana.

De destaque ainda, o anúncio esperado e oficial da inserção do Direito Previdenciário dentro do Exame Nacional da OAB, uma demanda antiga e que virou realidade com a informação de que o XXXVIII Exame conterá questões objetivas deste emergente e consolidado segmento do saber jurídico [4].

Também, a tese do dano moral previdenciário ganhou destaque em 2022 com sua afirmação no Judiciário nacional em seus variados níveis de jurisdição, com casos do dia a dia dos beneficiários, além de expressivos valores na condenação.

Casos como demora ou ausência na análise, erros do sistema, violações da LGPD, cessações indevidas e outras, são alguns dos cenários possíveis e que foram alvo de sensibilidade do Judiciário no acolhimento da tese, aliás, de origem doutrinária e que ganha cada vez mais força na jurisprudência previdenciária [5].

Ainda neste aspecto, vale o registro de uma recente decisão do Tribunal Regional da 3ª Região e que acolheu a tese do dano moral previdenciária com a condenação do INSS em R$ 400 mil em favor de uma portadora da síndrome da Talidomida, sendo a maior condenação vista em solo brasileiro [6].

Já no fim de 2022 e de forma surpreendente, a Suprema Corte validou a conhecida tese jurídica da revisão da "vida toda" em polêmico e conturbado julgamento finalizado no dia primeiro de dezembro.

A tese, iniciada há muito no Judiciário, ganhou força na doutrina e coro no STJ com julgamento favorável em seu plenário.

Essencialmente, a tese traz em seu bojo a concreção do ideário protetivo, isto é, reflete que seu destinatário possui o incontroverso direito de ser socorrido e amparado pela melhor prestação, melhores regras e, obviamente, a melhor proteção, não podendo e sendo inadmissível que um filiado no sistema, vertendo regulares contribuições, não alcance uma prestação condizente com sua identidade jurídica, pois uma nova regra não pode prejudicar o patamar de seu relacionamento, promover retrocessos e neutralizar as premissas fundantes de qualquer pacto jurídico que envolva direitos fundamentais sociais.

De fato, um importante tema enfrentado pela Suprema Corte na sistemática da Repercussão Geral, ou seja, de vinculação objetiva e subjetiva à todos do Judiciário, afirmando que a regra de transição não pode ser mais prejudicial que a regra permanente reconhecendo que a revisão da "vida toda" é constitucional [7].

Portanto, aqui um breve relato de grandes marcos previdenciários de 2022 confirmando não somente que o Direito Previdenciário se trata de um emergente campo do saber jurídico, mas sim, um consolidado segmento de estudos da pretendida transformação social sonhada por todos.

Miguel Reale registrou que: "Uma visão integral do direito, em suma, pressupõe uma complementariedade entre os valores da pessoa humana e da justiça, atuando esta como mediação daquela para possibilitar a ordem social correspondente à dignidade do homem de ciclo histórico" [8].

Por certo que essa transformação social há de continuar a inspirar o Direito Previdenciário de modo a possibilitar a evolução da sociedade a partir das premissas do bem-estar, conferindo ferramentas que busquem implementar o pacto protetivo previsto no projeto de 1988 enquanto ele existir.

Em 2023, quando a Previdência Social brasileira completará cem anos, espera-se que esses ideais continuem vivos e impactando concretamente seus envolvidos.

 


[8] REALE, Miguel. Nova Fase do Direito Moderno. São Paulo: Saraiva, 1990. p.40.

Autores

  • é mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM), pós-graduado pela Escola Paulista de Direito (EPD-SP) e pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professor universitário da graduação, pós-graduação, cursinhos preparatórios e extensão/atualização jurídica, professor titular de Direito na Universidade Norte do Paraná (Unopar Itajubá-MG), coordenador acadêmico da pós-graduação em Prática Previdenciária da Escola Mineira de Direito (EMD), ex-conselheiro da OAB-MG (23ª Subseção), integrante do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) Regional da OAB-MG, advogado em Minas e membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica.

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