Escritos de Mulher

A gradual emancipação indígena e a luta pelos territórios originários

Autor

14 de dezembro de 2022, 8h00

Os indígenas brasileiros convivem, hoje, com os não-indígenas de todos os perfis. Desde os supostamente isolados até os plenamente identificados com a cultura do país, todos eles e elas enxergam os habitantes brasileiros como desejáveis em algumas situações, mas perigosos em outras. E, sim, eles e elas têm razão.

Spacca
Durante muitos séculos, os povos originários da América sofreram nas mãos de invasores europeus que procuravam riquezas de todos os tipos para explorar. As relações iniciais nem sempre foram de brutalidade, houve momentos em que a troca de riquezas naturais do Brasil com as fabricadas pelos europeus tornou possível algum entendimento entre civilizações tão diversas, mas na maioria das vezes houve lutas, disputas, tentativas de escravização e desumanidade brutal por parte da cultura europeia que foi imposta. Passados mais de quinhentos anos, a questão dos direitos indígenas e a luta por seus territórios originários ainda perdura.

Conforme notícias de imprensa, no dia 12 de dezembro último o ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal, pediu destaque e suspendeu o julgamento que analisava uma decisão liminar do ministro Edson Fachin que determinava ao governo federal a adoção das medias necessárias para garantir a proteção integral aos territórios com a presença de povos indígenas isolados e de recente contato.

É de conhecimento geral que determinadas populações indígenas sofrem risco real de extermínio, em consequência das ações e omissões do governo. É inaceitável o desmonte da Funai (Fundação Nacional do Índio), cujo próprio nome se mostra totalmente inadequado, pois deveria chamar-se Fundação Nacional dos Indígenas. Conforme palavras do ministro Fachin, na apreciação do referendo da medida cautelar na ADPF 709, "a proteção da vida, da integridade física e dos territórios desses povos não vem sendo observadas pela administração pública".

Em recente atuação do Ministério Público Federal, os indígenas do sul da Bahia foram e continuam sendo objeto de estudos solicitados pela Procuradoria da República, com acompanhamento do Poder Judiciário Federal, a fim de que se possa determinar as condições de vida e trabalho das comunidades indígenas das Aldeias de Barra Velha e Xandó, no sul do estado. É claro que as medidas a serem tomadas visam benfeitorias para as comunidades locais, porém existem controvérsias a serem sanadas. É compreensível que os indígenas moradores da região apresentem visões diferentes para o desenvolvimento local. Alguns insistem no fato de que precisam ter autonomia para fazer seus próprios negócios, pois não querem viver como antes, quando não tinham uma boa casa para morar, não contavam com alimentação suficiente e não tinham conforto em casa. Já os indígenas "bugueiros" também insistem em obter liberdade para seus negócios e são, em boa parte, favoráveis aos arrendamentos. Está claro para todos que os aluguéis de casas e os arrendamentos proporcionam uma qualidade de vida muito melhor aos indígenas do que o artesanato e o cultivos de pequenas lavouras.

Segundo moradores da aldeia Xandó, ouvidos por mim em visita à comunidade, "a economia geral melhorou, os indígenas passaram a ter acesso a remédios, pagar exames e fazer supermercado, além de melhorarem muito as moradias" (sic).

Em outra reunião da qual também tive a oportunidade de participar, os indígenas se pronunciaram a favor de uma reforma na Constituição Federal a fim de permitir que eles possam fazer parcerias com empresários e arrendar terras, tendo em vista que muitos nativos não possuem recursos para iniciar seus negócios e precisam de não-índios investidores.

Sabe-se que, nos Estados Unidos, os indígenas podem ser donos de cassino. Além disso, podem empreender, gerir seus negócios, produzir artesanato de alta qualidade e praticar o comércio como qualquer outro cidadão.

Não é possível continuar tratando os anteriormente chamados de "silvícolas" como se todos eles e elas não tivessem capacidade de autodeterminação, sem considerar as diferenças. Além disso, compete ao governo federal proteger os ainda vulneráveis de toda sorte de falcatruas e tentativas de exploração, impedindo que eles sejam prejudicados em seus direitos de cidadania brasileira, conforme garantias constantes na nossa Constituição Federal.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!