Paradoxo da Corte

CAM-CCBC e o crescente prestígio da arbitragem

Autor

  • José Rogério Cruz e Tucci

    é sócio do Tucci Advogados Associados ex-presidente da Aasp professor titular sênior da Faculdade de Direito da USP membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e do Instituto Brasileiro de Direito Processual e conselheiro do MDA.

16 de agosto de 2022, 8h05

Não há dúvida, como já afirmei em vários artigos, que a arbitragem se consolidou em nosso país, sobretudo pela credibilidade e pela segurança que infunde no ambiente empresarial e societário, como bem evidencia a nossa realidade, destacada pelo significativo aumento de processos arbitrais nestes últimos cinco anos.

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O preparo e a dedicação da grande maioria daqueles que se dispõem a exercer a função de árbitro constitui relevante pressuposto de interesse desse importante meio de resolução das controvérsias.

Esse inequívoco sucesso é também devido em considerável parte pela confiança e respeito que os nossos tribunais estatais têm reservado à arbitragem, resultante de uma constante interação e efetiva colaboração com os tribunais arbitrais.

O profissionalismo e aparelhamento dos órgãos de gerenciamento dos processos arbitrais é igualmente fator de grande relevância para o sucesso do instituto da arbitragem.

Dentre estes, como é notório, destaca-se o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canada-CAM-CCBC, sob a experiente direção atual da doutora Eleonora Coelho, que acaba de publicar consistente documento abrangente do biênio 2020-2021. Apenas para recordar, o CAM-CCBC é uma instituição latino-americana de referência em resolução de disputas domésticas e internacionais, com sede em São Paulo.

Intitulado "Fatos e Números", o relatório que agora veio a lume visa a promover transparência, fornecendo ao público interessado dados concretos das conquistas e das principais atividades do CAM-CCBC, inserindo, de forma deveras cuidadosa, estatísticas detalhadas e inclusão institucional.

O reconhecido prestígio alcançado pelo CAM-CCBC, segundo consta do relatório, deve-se à experiência contínua, haurida ano a ano, desde 1979, resultando em: a) uma fórmula única de gestão de casos, certificada de acordo com a ISO 9001; b) um conjunto de regras e regulamentos constantemente atualizados de acordo com as melhores práticas internacionais e as necessidades e expectativas dos usuários; c) administração de processos de acordo com as Regras de Arbitragem da UNCITRAL; d) infraestrutura completa em São Paulo, sem custos extras – incluindo salas de audiência de última geração, salas de mediação e espaços para reuniões; e) escritórios no Rio de Janeiro; f) case managers especializados com dedicação integral, fluentes em variados idiomas e treinados na fórmula de gestão de casos do CAM-CCBC; e g) lista de árbitros e mediadores composta por especialistas reconhecidos de diversas jurisdições.

Ademais, ainda como se extrai do relatório, todas as atividades do CAM-CCBC foram construídas sobre cinco grandes pilares, quais sejam, imparcialidade, independência, eficiência, transparência e melhoria contínua do sistema de gestão.

Os dados fornecidos revelam sensível crescimento de novos casos por ano na última década. Este aumento reflete a expansão do CAM-CCBC, com foco em contratos baseados na América Latina.

Ao longo de 2020, o CAM-CCBC administrou um total de 418 arbitragens. Em 2021, o número de arbitragens gerenciadas ao longo do ano saltou para 427.

Alinhada com as melhores doutrina e prática, a Lei de Arbitragem brasileira reafirmou, em 2015, a possibilidade de participação da administração pública em procedimentos arbitrais. Ao longo desses anos de desenvolvimento, o CAM-CCBC já garantiu uma posição sólida neste setor promissor. Em 2020, o CAM-CCBC recebeu seis novos casos nos quais a Administração Pública figurou como parte, cinco arbitragens e uma mediação. Ao longo de 2021, o CAM-CCBC registrou dez novos casos envolvendo a administração pública, nove arbitragens e um dispute board. Neste mesmo ano, foram registrados 42 processos arbitrais em andamento com partes de diversos níveis da administração pública brasileira.

Em 2021, dos 427 processos em andamento, foram proferidas apenas três decisões sobre impugnações de árbitros. Em dois desses casos, o comitê especial decidiu sobre a impugnação de dois integrantes do tribunal arbitral, sendo que em todos eles os árbitros foram confirmados.

Importa salientar, outrossim, como bem asseverado pela doutora Patrícia Kobayashi, secretária-geral do CAM-CCBC, "os procedimentos virtuais e as audiências remotas têm garantido uma economia substancial de tempo e despesas. Os processos nunca foram tão rápidos, ecológicos e eficientes".

Com efeito, segundo estatística apresentada no relatório, a duração média dos processos encerrados em 2020 e iniciados entre 2017 e 2020 é de 18 meses, considerando o período entre o termo de arbitragem e o encerramento do procedimento. Para as arbitragens encerradas em 2021, a duração média de processos registrou uma pequena redução para 16 meses, considerando as arbitragens iniciadas entre 2018 e 2021.

De fato, todas estas informações agora prestadas pelo indigitado relatório vêm comprovar a ótima impressão que os profissionais que atuam em processos arbitrais, de um modo geral, têm do CAM-CCBC. Tal percepção — posso afirmar sem receio de me equivocar — é praticamente unânime.

Diante desse profícuo panorama, que merece todos os encômios, é que aproveito para voltar a criticar o Projeto de lei nº 3.293/2021, que tem a finalidade de alterar a Lei nº 9.307/96, apresentado pela deputada Margarete Coelho (PI) e que se encontra em tramitação perante a Câmara dos Deputados.

Reiterando aquilo que já afirmei em outra oportunidade, a pretexto de "aprimorar a Lei de Arbitragem, com o objetivo de prover limites objetivos à atuação do árbitro e otimizar o dever de revelação às partes", como se colhe da respectiva exposição de motivos, observa-se que, a rigor, o deliberado escopo de quem o redigiu é o de "desmontar" o sistema arbitral brasileiro. Sem margem para dúvida, do projeto, nada se aproveita!

Por esta razão é que conclamo, uma vez mais, as entidades e órgãos especializados em arbitragem a se manifestarem imediatamente contra tal iniciativa legislativa, para que seja ela imediata e definitivamente arquivada ou, quando não, rejeitada por esmagadora maioria!

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