Opinão

CNJ não pode virar as costas à advocacia

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26 de abril de 2022, 15h11

Ao Conselho Nacional de Justiça, diz a Constituição, compete o controle dos deveres funcionais dos juízes, inclusive podendo expedir atos regulamentares. A mesma Constituição sintetiza que o advogado é "indispensável" à Justiça e, para concretizar tal texto, a lei veda a hierarquia entre magistrados e advogados, devendo todos tratar-se com consideração e respeito, podendo o advogado dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes, independentemente de horário previamente marcado.

Spacca
O advogado Marcos da Costa

A Loman igualmente refere o dever do magistrado, que realiza um serviço público, em "atender aos que o procurarem". Nesse particular, o advogado é a voz do cidadão, é o profissional para a defesa do direito das pessoas, garantindo o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

Assim, se reunir com o juiz para despachar petições e esclarecer aspectos do processo é o exercício fundamental da advocacia, e a garantia do cidadão em ser ouvido pela autoridade. É a oportunidade de clarear as questões, explicitar os argumentos e melhor narrar os aspectos do caso (o que nem sempre é possível na linguagem escrita).

O Judiciário se vale da oralidade em suas sessões, o mesmo fazendo as Associações de Magistrados que despacham os processos de seu interesse com Ministros, Parlamentares etc. E isso é bom, pois permite ao destinatário ouvir os argumentos e melhor refletir sobre o tema.

Não obstante esse claro direito e prerrogativa legal, é fato que os advogados enfrentam dificuldades diárias em serem recebidos por diversos magistrados, não obstante a maioria preste o atendimento na forma da lei.

A negativa ou a imposição de dificuldades no atendimento é frequente, e algumas vezes o juiz requer a manifestação escrita prévia do advogado (memoriais), para analisar se "haverá necessidade" no atendimento; o que caracteriza o exercício de hierarquia e violação da dignidade profissional.

Por fim, há ainda os que destacam assessores para o atendimento do advogado, o que viola a lei. Afinal, dificilmente o assessor compreenderá todo o tema e repassará o conteúdo exato, pois ele não contra-argumentará as reflexões do juiz. E se ele vai "repassar tudo" ao juiz, por qual motivo o advogado não poderia fazer isso, evitando intermediários que podem deturpar suas observações?

Assim, é fundamental que o CNJ estabeleça medidas que garantam a prerrogativa dos advogados e o cumprimento do dever dos magistrados, de modo a respeitar a lei e evitar conflitos.

Considerando que qualquer do povo pode apresentar propostas e sugestões tendentes à melhoria da eficiência e eficácia do Judiciário, e esse tema é ponto essencial para o exercício da cidadania, não se compreende a rejeição do pedido nº 0009011-48.2021.2.00.0000, em que se pede ao CNJ a adoção de um ato normativo sobre o tema. A ausência da intervenção do CNJ, ao invés de contribuir para a solução de um problema real, que afeta milhares de advogados, apenas permitirá a continuação dos conflitos e o descumprimento da lei.

O CNJ não pode voltar suas costas à advocacia, pois isso é voltar as costas ao cidadão, equivalendo-se à recusa no atendimento que se pretende combater.

Assim, conclamamos ao CNJ que, no recurso interposto, se debruce com maturidade sobre o tema, de modo a construir uma regulamentação que atenda ao cidadão e aos ditames da lei. Isso apenas e tão somente trará o engrandecimento da Justiça, que não se fará efetiva sem a integração digna e ativa da advocacia.

Autores

  • é advogado, foi presidente da OAB-SP nos triênios 2013-2015 e 2016-2018 e presidente da Comissão de Informática Jurídica da OAB-SP nos triênios 1998-2000 e 2001-2003 e da Comissão de Informática do Conselho Federal da OAB no triênio 2001-2003.

  • é advogado, ex-juiz do Trabalho, foi conselheiro do CNJ (2011/2013), vice-presidente da AMB (2008/2010), presidente da Amatra-SP (2004/2006), vice-diretor da Escola Judicial do TRT/SC, PhD em curso pela Universidade de Strathclyde, pós-graduado em Arbitragem Internacional pela Universidade de Aberdeen, mestre em Direito Pela Universidade de Lisboa, autor, parecerista e árbitro.

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