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Justiça determina que União faça licitação para compra de medicamrnto de hemofilia

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8 de novembro de 2021, 19h49

Em uma parceria de desenvolvimento produtivo (PDP), o Poder Público não se compromete com o quantitativo de produtos, mas com a viabilização de receita ao parceiro do SUS, a fim de que, mediante o plus entre o custo de aquisição e o preço de revenda, o laboratório brasileiro possa arcar com suas obrigações na transferência da tecnologia oriunda do exterior.

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Com a decisão, outras empresas poderão fornecer medicamentos para hemofílicos

Com esse entendimento, a 24ª Vara Cível Federal de São Paulo obrigou o Ministério da Saúde a promover licitação para comprar medicamentos para o tratamento de hemofilia, doença hereditária que dificulta a coagulação sanguínea e cujos pacientes são atendido unicamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).  A liminar pode ajudar a economizar pelo menos R$ 100 milhões anualmente dos cofres públicos.

Atualmente, toda a compra do Fator VIII Recombinante é feita por meio de uma PDP entre o Ministério da Saúde, a Hemobrás (Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia) e a farmacêutica japonesa Takeda, firmada há quase dez anos. O acordo determina que o governo compre diretamente (sem licitação) 500 milhões de UIs (Unidade Internacional) do medicamento por ano. 

Porém, a demanda pelo medicamento aumenta ano a ano e excede o valor contemplado no contrato original. Este ano, por exemplo, foram necessários 260 milhões de UIs a mais. A compra desse excedente também era feita sem licitação. 

Foi nesse cenário que a farmacêutica Bayer entrou com uma ação na Justiça Federal pedindo a limitação das compras com dispensa de licitação no âmbito da PDP ao quantitativo previsto no projeto executivo, com a promoção de licitação para aquisição do quantitativo excedente.

De acordo com a empresa, apesar de possuir registro de produto na Anvisa e ter ofertado seu medicamento ao Ministério da Saúde, não foi em nenhum momento contatada para apresentar preços de Fator VIII Recombinante, que precifica em R$ 0,98 por UI, mais em conta do que o contratado no âmbito da PDP (R$ 1,37), por um produto mais moderno, que exige menos infusões ao paciente e lhe confere maior qualidade de vida.

Quantitativo e preço
O juiz federal Victorio Giuzio Neto destacou que o artigo 24, inciso XXXII, da Lei 8.666/93, inclui a dispensa de licitação aos contratos de fornecimento de produtos estratégicos para o SUS durante as etapas de absorção tecnológica, residindo na extensão dessa dispensa a controvérsia dos autos.

Segundo o magistrado, tal dispositivo não estabelece os quantitativos que devem ser adquiridos pelo Poder Público com dispensa de licitação. Isso não quer dizer que a existência da PDP confira carta branca para a aquisição com dispensa de licitação, independentemente de limites temporais e quantitativos.

Desse modo, os quantitativos são estabelecidos, em princípio, como um piso mínimo. No caso, a PDP de Fator VIII Recombinante foi firmada para abastecer a demanda integral do SUS, de modo que não se visualiza irregularidade na aquisição de quantitativo superior ao estimado, desde que respeitada a adequação do preço e o prazo da PDP, ressaltou.

Em relação à adequação do preço, o juiz explicou que o valor do produto adquirido no âmbito da PDP deve estar de acordo com seu projeto executivo, em termos reais, isto é, corrigido pela inflação ou pelo câmbio no caso de insumos importados, resguardada a revisão para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro.

No caso, o preço fixado no contrato, de R$ 1,37 por UI, foi reputado como justificado para variação cambial desde a última contratação em que se fixou preço unitário, em 2019, dado que o aditivo de 2020 não alterou os valores que, à época já estariam defasados, na perspectiva de recomposição no contrato subsequente.

Porém, a informação contida em nota técnica da Coordenação de Licitações e Análise de Mercado de Insumos Estratégicos para Saúde dá conta de que o Ministério da Saúde não tem informações suficientes para aferir a vantagem da aquisição com dispensa de licitação e não há a discriminação da parcela do preço unitário que é destinada à remuneração da transferência da tecnologia.

Assim, o magistrado concluiu que a limitação pretendida pela Bayer em relação ao quantitativo de produtos a ser adquirido com dispensa de licitação revela-se necessária para que seja preservado o interesse público. Para ele, não há risco de inviabilização da PDP desde que respeitada a aquisição mínima.

A União deverá promover, previamente a qualquer futura contratação, seja mediante dispensa de licitação ou por licitação, pesquisa de preços junto a todos os detentores de registro de Fator VIII Recombinante perante a Anvisa, inclusive para obter subsídios que permitam analisar a vantajosidade e economicidade de proposta da Hemobrás em relação ao quantitativo previsto na PDP.

Outro lado
A farmacêutica Takeda encaminhou nota à ConJur e disse que que a PDP, firmada em outubro de 2012 com a Hemobrás, continua vigente. Ressaltou que essa parceria permite que pacientes brasileiros hemofílicos possam fazer um tratamento de forma 100% gratuita pelo SUS.

"A PDP prevê, ainda, um investimento da Takeda de até US$ 250 milhões para a instalação de uma fábrica em Goiana (PE), já em construção. A planta será destinada à montagem da linha de produção e embalagem do produto no Brasil, e faz parte das atividades necessárias para conclusão da transferência de tecnologia."

"A intenção da Takeda é garantir que mais pacientes tenham acesso ao medicamento por meio da nacionalização da produção do Fator VIII recombinante e recebam o melhor tratamento possível por meio de parcerias estratégicas e inovação tecnológica, reafirmando o compromisso da empresa com a saúde e bem-estar da população", finalizou a empresa.

Com relação à decisão da Justiça Federal de São Paulo, a Takeda salientou que "ainda é preliminar, não havendo até a presente data decisão definitiva sobre o assunto".

*texto atualizado às 15h30 de 10.nov.2021

Clique aqui para ler a decisão
5017586-75.2020.4.03.6100

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