Opinião

A transação no contencioso tributário e o Edital n° 11/2021

Autores

  • Mary Elbe Queiroz

    é advogada tributarista sócia da Queiroz Advogados Associados pós–doutora em Direito Tributário (Universidade de Lisboa – Portugal) Doutora em Direito Tributário (PUC-SP) mestre em Direito Público (UFPE) professora e presidente do Conselho Jurídico do Ibrei.

  • Antonio Carlos de Souza Jr.

    é advogado sócio de Queiroz Advogados Associados doutor em Direito Tributário (USP) mestre em Direito (UNICAP) pós-graduação em Direito Tributário pelo IBET/SP professor do Curso de Pós-graduação do IBET membro Fundador da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

23 de maio de 2021, 11h19

A Lei nº 13.988/2020, que regulamentou a transação tributária no âmbito da União, inseriu nos artigos 16 a 22 uma espécie de negociação com a Fazenda Pública denominada "transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica". O instrumento foi regulamentado pela Portaria ME nº 247/2020, contudo, até então não havia efetivamente sido colocado em prática, pois dependia da publicação de edital nos termos do artigo 6º da norma regulamentadora.

Na última terça-feira (18/5) foi publicado o Edital nº 11/2021, que introduziu a primeira proposta de resolução de uma questão relevante e disseminada por meio da transação. O tema escolhido foi relativo às discussões jurídicas envolvendo o pagamento de participação nos lucros e resultados (PRL) a funcionários e/ou diretores para fins de incidência das contribuições previdenciárias, notadamente a vinculação aos requisitos estabelecidos na Lei nº 10.101/2000.

Trata-se de um modelo baseado exclusivamente na adesão conforme a sua própria denominação e tem por escopo encerrar litígios aduaneiros ou tributários, inclusive trazendo a delimitação do conceito de controvérsia relevante e disseminada no parágrafo 3º do artigo 16 da Lei nº 13.988/2020 e no artigo 30 da Portaria ME nº 247/2020.

Considerando a familiaridade dos leitores com a espécie transação na cobrança de créditos, cumpre destacar algumas particularidades da espécie em comento: 1) o desconto oferecido no edital poderá incidir sobre o montante principal do crédito tributário; 2) necessidade de homologação do acórdão e extinção dos litígios existentes sobre o tema, ressalvada a hipótese de cindibilidade da matéria e crédito tributário discutido no processo administrativo e/ou judicial; 3) sujeitar-se o contribuinte em relação aos fatos geradores futuros ou não consumados ao entendimento dado pela administração tributária à questão em litígio contida no edital, ressalvada a edição de novos atos normativos modificando o tratamento da questão ou precedente judicial qualificado em sentido contrário (artigo 927 do CPC), que terá o condão de sustar de modo prospectivo a obrigatoriedade.

O Edital nº 11/2021 contempla vários itens com as condições para adesão, deveres do contribuinte, prazo e descontos (de 30% a 50%), entre outros. Aqui, iremos analisar o item 3.1, que dispõe sobre o percentual do desconto aplicado sobre o principal, juros, multa e encargo legal. A questão, aparentemente simplória, poderá ter reflexos na dedutibilidade dos tributos na apuração do lucro real após a transação, especialmente em virtude do disposto no artigo 352 do RIR/2018 [1], como também a forma do reconhecimento das reduções na apuração do resultado das empresas.

Para ilustrar, imaginemos um crédito tributário no montante de R$ 200, composto por: principal (R$ 100), multa (R$ 50), juros (R$ 30) e encargo legal (R$ 20). Com o objetivo de facilitar a ilustração, suprimimos a antecipação de 5% prevista no edital.

A primeira interpretação (literal) indicaria a aplicação do desconto de modo linear em cada rubrica do crédito tributário transacionado, reduzindo o valor para R$ 100, composto por: (R$ 50), multa (R$ 25), juros (R$ 15) e encargo legal (R$ 10). A segunda interpretação, talvez mais consentânea com o padrão adotado nas transações e até mesmos nos parcelamentos anteriores, seria aplicar em primeiro lugar os descontos para a multa, juros e encargo legal, e, somente em caso de saldo, aplicar o desconto para o principal. Assim, a redução total do débito seria igual (R$ 100), porém, a sua composição no exemplo seria diversa: (R$ 100), multa (R$ 0), juros (R$ 0) e encargo legal (R$ 0), causando impacto fiscal diferente.

Certamente, a aludida questão será respondida pela própria parametrização do programa de adesão que será disponibilizado pela Procuradoria da Fazenda Nacional e pela Receita Federal do Brasil.

Finalmente, aplaudimos o início de utilização da transação tributária para buscar dirimir controvérsias jurídicas que congestionam os nossos órgãos de julgamento e contribuem para disseminação de um estado de permanente insegurança do sistema tributário brasileiro. Devemos ressaltar, todavia, que o instrumento não terá o condão de afastar os problemas subjacentes ao estado de segurança, tema que merece uma abordagem específica.

 


[1] "artigo 352  Os impostos e as contribuições são dedutíveis, para fins de determinação do lucro real, segundo o regime de competência (Lei nº 8.981, de 1995, artigo 41, caput). §1º O disposto neste artigo não se aplica aos impostos e às contribuições cuja exigibilidade esteja suspensa nos termos estabelecidos no inciso II ao inciso V do artigo 151 da Lei nº 5.172, de 1966 – Código Tributário Nacional, independentemente de haver ou não depósito judicial (Lei nº 8.981, de 1995, artigo 41, §1º). (…) §5º Não são dedutíveis como custo ou despesas operacionais as multas por infrações fiscais, exceto as de natureza compensatória e as impostas por infrações de que não resultem falta ou insuficiência de pagamento de tributo (Lei nº 8.981, de 1995, artigo 41, §5º)".

Autores

  • é advogada sócia de Queiroz Advogados Associados, coordenadora do curso de pós-graduação do IBET em Pernambuco, professora, pós-doutora pela Universidade de Lisboa, doutora em Direito Tributário (PUC/SP), mestre em Direito Público (UFPE), pós-graduação em Direito Tributário: Universidade de Salamanca – Espanha e Universidade Austral – Argentina, pós-graduação em Neurociência (PUC/RS), presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários, presidente do Conselho de Notáveis do Instituto das Juristas Brasileiras, membro Imortal da Academia Nacional de Ciências Econômicas e Políticas Sociais, membro do Comitê Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da FIESP (CONJUR), membro do Conselho da Mulher da ACP, consultora da CNC, líder do Comitê Vozes do Grupo Mulheres do Brasil – Recife-PE e tem livros e artigos publicados e palestras no Brasil e exterior.

  • é advogado sócio de Queiroz Advogados Associados, doutor em Direito Tributário (USP), mestre em Direito (UNICAP), pós-graduação em Direito Tributário pelo IBET/SP, professor do Curso de Pós-graduação do IBET, membro Fundador da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro, membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

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