Opinião

Justiça para todos: Sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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11 de dezembro de 2021, 18h06

Spacca
Na última sexta-feira, dia 10, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, completou 73 anos.

Seu preâmbulo traz a essência dos princípios, muitos ainda hoje ignorados:

"Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,
Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,
Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão,
Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,
Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos fundamentais do ser humano, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla,
Considerando que os países-membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano e a observância desses direitos e liberdades,
Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso,
Agora, portanto, a Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade tendo sempre em mente esta Declaração, esforce-se, por meio do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Países-Membros quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição."

Na Folha de S.Paulo deste sábado (11/11, pág.B6) vimos excelente artigo da doutora Jurema Werneck, diretora da Anistia Internacional do Brasil, também médica e escritora carioca, do qual com muita honra destacamos dois pequenos trechos:

"Milhões de famintos estão na luta por ossos e lixo;o desemprego atinge recordes; há os que estão doentes nas filas do SUS sem previsão de cuidado"

E o final do texto, ao qual aderimos convictos pelo seu grande valor:

"É urgente interromper e reparar as incontáveis violações de direitos humanos causados por ação e inação do Estado brasileiro. O tempo está passando e é urgente que as autoridades entrem em ação e cumpram suas responsabilidades e deveres. Precisamos de justiça e de uma recuperação justa: abrangente, efetiva e urgente."

Na coluna Justiça Tributária, que com grande alegria divido com o professor Fernando Facury Scaff, nosso foco está nas questões fiscais. Isso nos traz o dever de invocar pequeno trecho da página 39 do livro que tem o nome dessa coluna, publicado em 2014 pela editora "Outras Palavras":

"Há notícias sobre a economia que trazem preocupação a todos os brasileiros. Uma delas registra que a carta tributária que suportamos já ultrapassa 35% do PIB e é a maior dos últimos dez anos. Outra assinala que o crescimento do PIB em 2014 provavelmente ficará abaixo de 1% em relação a 2013.Isso significa que pagamos mais tributos, mesmo sem um crescimento econômico que o justifique. Se a economia não cresce, mas a carga tributária aumenta, tudo indica que uma parte crescente de nossas riquezas é apropriada pelo poder público."

A última frase do artigo da dra. Jurema Werneck: "Precisamos de justiça e de uma recuperação justa: abrangente, efetiva e urgente" — em parte coincide com a situação descrita no trecho do nosso livro acima transcrito.

A finalidade do Brasil como Estado democrático de Direito é a descrita no preâmbulo da Constituição: "Assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos…".

Ora, qualquer cidadão, e de forma mais evidente os servidores públicos de todos os poderes, que são pagos com nossos tributos, tem o dever fundamental de cumprir a Carta Magna, seja por juramento ou de forma tácita.

No artigo 145 da Constituição, vemos que os impostos devem ser graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. E não é razoável supor que isso autorize a cobrança da carga mencionada, que absorve 2/5 de toda a riqueza produzida no país! Não podemos nos esquecer que a Inconfidência Mineira foi um conflito que resultou da cobrança de 20% do ouro aqui produzido e que, levado para Portugal, tornou-o um dos países mais ricos da Europa, a permitir a reconstrução de Lisboa depois do terremoto de 1755.

Também não podemos ignorar o artigo 3º da Constituição, onde se afirma que os objetivos fundamentais da nossa República são: "I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e IV – promover o bem de todos…"

Não existe sociedade justa, desenvolvimento social e o bem de todos, com a verdadeira exploração que o contribuinte sofre ao pagar impostos abusivos e de forma muitas vezes ilegal a ponto de tangenciar as raias da criminalidade.Tal forma de atuação estatal serve, ao contrário do ordenamento maior, para aumentar a pobreza, a marginalização e as desigualdades sociais, na medida em que a inflação atinge mais a quem tem menos, e provoca uma verdadeira tragédia nacional, com o aumento do desemprego e dos juros.

Portanto, a Declaração Universal dos Direitos Humanos não está sendo observada no Brasil. E sempre é bom lembrar que Justiça verdadeira só pode existir quando for Justiça para Todos!

Autores

  • é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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