Novo entendimento

Com mudança de voto, 3 ministros validam transferência de concessão sem licitação

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9 de dezembro de 2021, 19h07

O julgamento sobre a constitucionalidade de norma que regulamenta a transferência de concessões e de seu controle societário (artigo 27 da Lei 8.987/1995) foi iniciado nesta quinta-feira (9/12) pelo Plenário físico do Supremo Tribunal Federal e trouxe como novidade a mudança de entendimento do relator. A ação discute se é preciso uma nova licitação antes da transferência da concessão em si ou de sua controladora. Três ministros entenderam que um novo certame é dispensável.

Fellipe Sampaio/STF
Ministro Toffoli, relator, mudou de entendimento Fellipe Sampaio /SCO/STF

O ministro Dias Toffoli, que havia votado anteriormente no Plenário virtual pela inconstitucionalidade da norma, passou a considerá-la constitucional desde que a transferência seja autorizada pelo poder público. Acompanharam o relator, até o momento, os ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques. A ministra Rosa Weber, que presidia a sessão, anunciou que o julgamento será retomado em data a ser marcada posteriormente.

"As transferências da concessão e do controle societário da concessionária previstas são exemplos de instituto que têm a finalidade de permitir a continuidade da prestação de serviços públicos nos casos em que as concessionárias não tenham mais condições de prosseguir à frente dos empreendimentos concedidos", disse Dias Toffoli em seu novo voto.

No julgamento iniciado no Plenário Virtual em agosto deste ano, e que depois foi transferido para o Plenário físico devido a um pedido de destaque de Gilmar Mendes, o relator dera provimento parcial ao pedido para declarar a inconstitucionalidade do artigo. Para ele, que foi acompanhado na ocasião pelo ministro Alexandre de Moraes, a transferência da concessão não poderia ocorrer, pois a "nova" concessionária não teria se submetido ao processo de licitação.

Já a transferência do controle acionário não violaria a exigência constitucional de certame, uma vez que a pessoa jurídica continuaria sendo a mesma da época em que a concessão foi licitada. Na modulação da decisão, o ministro Toffoli deu um prazo de dois anos para que todos os órgãos públicos relicitem os contratos que tiveram a transferência da concessão.

No julgamento desta quinta-feira, o relator disse que, depois de o caso ser transferido para o julgamento presencial, resolveu mudar seu voto também influenciado por um parecer apresentado pelo ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence. Esse parecer foi publicado pela ConJur também em agosto.

Nele, o ministro aposentado afirma que o artigo 27 da Lei 8.987/1995 é constitucional. Isso porque a operação ocorre depois da contratação da proposta mais vantajosa, que exaure a finalidade da licitação.

Respondendo a pergunta feita pela Associação Brasileira de Infraestrutura e de Indústrias de Base (Abdib), Pertence disse também que a transferência da execução de serviços públicos não despreza a licitação promovida anteriormente, com a extinção da concessão e novo procedimento para contratar outro concessionário para prestar o serviço.

Segundo Pertence, a mudança é inevitável e previsível na gestão e execução dos contratos de concessão, que têm prazos longos. E a transferência de concessões ou do seu controle societário, destacou, só pode ser feita com concordância do poder público, com a comprovação de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal, além da garantia de que serão cumpridas todas as cláusulas do contrato. 

Para o advogado Luis Felipe Dalmedico Silveira, especialista na área contratual e sócio do escritório Finocchio & Ustra Advogados, não há  razão para que a transferência de concessão sem licitação seja considerada inconstitucional. "A exigência de licitação para concessão se dá de forma prévia à contratação. A cessão da concessão pressupõe contrato existente. O contrato, portanto, já existe, e o que é transferida é a posição contratual", afirmou.

 Não se trata, assim, de novo contrato. O cessionário da concessão permanece atrelado às condições contratadas originalmente, inclusive àquelas de caráter econômico-financeiro (tarifas, entre outras). O poder concedente, inclusive, só pode anuir à cessão se o cessionário preencher os requisitos que o concessionário original comprovou preencher quando da licitação", concluiu.

Histórico da ADI
A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República em 2003, pelo então procurador Cláudio Fonteles. O artigo em questão dispõe sobre a caducidade da concessão quando ocorrer a transferência da concessão ou do controle acionário da concessionária sem a prévia anuência do poder concedente admitindo, assim, a transferência quando houver anuência da Administração. A ação argumenta que essa transferência violaria o artigo 175 da Constituição, que proíbe que haja concessão sem prévio procedimento licitatório.

O dispositivo determina que "a transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão". Para combater a eficácia do artigo 27 da lei impugnada, o procurador-geral invocou o artigo 175 da Constituição Federal, segundo o qual, "incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos".

Após citar a doutrina que ampara suas alegações, Cláudio Fonteles advertiu para um contra-senso da lei impugnada: o dispositivo questionado, diz ele, "discrepa da própria lei, pois o artigo 26 do mesmo diploma, ao dispor sobre a subconcessão de serviço público, estabelece expressamente a exigência de licitação".

O procurador-geral apoiou, sobre o tema, o voto proferido pela subprocuradora-geral da República Yedda de Lourdes Pereira, membro da 1ª Câmara de Revisão do MP. Segundo ela, a Lei 8.987 é criticada pela doutrina por causa das imprecisões técnicas e desacertos que apresenta. 

Leia o voto do ministro Toffoli
ADI 2.946

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