Finalidade da licitação

Transferência de concessão com aval do Estado é constitucional, diz Pertence

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28 de setembro de 2021, 20h55

O artigo 27 da Lei 8.987/1995, que regulamenta a transferência de concessões ou do seu controle societário mediante anuência do poder público, é constitucional. Isso porque a operação ocorre depois da contratação da proposta mais vantajosa, que exaure a finalidade da licitação.

Fábio Rodrigues Pozzebom/ABR
Sepúlveda Pertence disse que proposta de modulação gera insegurança jurídica
Fábio Rodrigues Pozzebom/ABR

É o que afirma o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence em parecer juntado à Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.946, que discute a constitucionalidade do dispositivo. Pedido de vista do ministro Gilmar Mendes interrompeu, em agosto, o julgamento do caso, que estava ocorrendo no Plenário Virtual da corte.

Os ministros Dias Toffoli, relator da ação, e Alexandre de Moraes deram provimento parcial ao pedido para declaração de inconstitucionalidade do artigo. Para eles, a transferência da concessão não poderia ocorrer, pois a "nova" concessionária não teria se submetido ao processo de licitação.

Já a transferência do controle acionário não violaria a exigência constitucional de certame, uma vez que a pessoa jurídica continuaria sendo a mesma da época em que a concessão foi licitada. Na modulação da decisão, Toffoli deu um prazo de dois anos para que todos os órgãos públicos relicitem os contratos que tiverem tido a transferência da concessão.

A Associação Brasileira de Infraestrutura e de Indústrias de Base perguntou a Sepúlveda Pertence se o artigo 27 da Lei 8.987/1995 é constitucional. O ministro aposentado do Supremo afirmou que a transferência da execução de serviços públicos não despreza a licitação promovida anteriormente, com a extinção da concessão e novo procedimento para contratar outro concessionário para prestar o serviço.

Segundo Pertence, a mudança é inevitável e previsível na gestão e execução dos contratos de concessão, que têm prazos longos. E a transferência de concessões ou do seu controle societário, destacou, só pode ser feita com concordância do poder público, com a comprovação de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal, além da garantia de que serão cumpridas todas as cláusulas do contrato. Dessa maneira, não há prejuízo à exigência constitucional da licitação, avaliou o ministro aposentado.

O ministro aposentado do Supremo também opinou que o dispositivo não viola os princípios da impessoalidade, concorrência ou isonomia. De acordo com ele, o para o Estado, o que importa é o cumprimento do contrato de concessão, nos termos da proposta vencedora da licitação. Assim, é indiferente para a administração pública quem executará as obrigações contratuais, desde que tenha capacidade para tanto.

Pertence ainda disse que a proposta de modulação dos efeitos da decisão de Toffoli, de dar um prazo de dois anos para que todos os órgãos públicos relicitem os contratos que tiverem tido a transferência da concessão, gera insegurança jurídica. Isso porque desconsidera o estágio atual das concessões e ignora que as transferências feitas nos 26 anos de vigência da Lei 8.987/1995 foram efetivadas com o cumprimento das normas vigentes à época.

"A arguição de inconstitucionalidade despreza a inafastável mutabilidade do contrato de concessão; faz pouco da exigência de ‘prévia anuência do poder concedente’; e vislumbra mácula aos princípios da licitação ou da administração pública onde não há, à medida que a cessão do contrato ocorre depois da contratação da proposta mais vantajosa, que exaure a finalidade da licitação", declarou Pertence.

"Concluo que é constitucional o dispositivo impugnado e que, na remota declaração de sua invalidade, é preciso modular os efeitos da decisão para preservar os atos de cessão já consumados, sob pena de causar enormes prejuízos aos concessionários de serviço público, à própria administração e aos usuários."

Ação original
A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República em 2003, pelo então procurador Cláudio Fonteles. O artigo em questão dispõe sobre a caducidade da concessão quando ocorrer a transferência da concessão ou do controle acionário da concessionária sem a prévia anuência do poder concedente — admitindo, assim, a transferência quando houver anuência do poder público. A ação argumenta que essa transferência violaria o artigo 175 da Constituição, que proíbe que haja concessão sem prévio procedimento licitatório.

O dispositivo determina que "a transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão". Para combater a eficácia do artigo 27 da lei impugnada, o procurador-geral invocou o artigo 175 da Constituição Federal, segundo o qual "incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos".

Após citar a doutrina que ampara suas alegações, Fonteles advertiu para um contrassenso da lei impugnada: o dispositivo questionado, diz ele, "discrepa da própria lei, pois o artigo 26 do mesmo diploma, ao dispor sobre a subconcessão de serviço público, estabelece expressamente a exigência de licitação".

O PGR apoiou, sobre o tema, o voto proferido pela subprocuradora-geral da República Yedda de Lourdes Pereira, membro da 1ª Câmara de Revisão do Ministério Público. Segundo ela, a Lei 8.987 é criticada pela doutrina face as imprecisões técnicas e desacertos que apresenta". Fonteles pede que seja ouvido o advogado-geral da União e vista para manifestação de mérito, a fim de que ao final, seja declara a inconstitucionalidade da lei impugnada.

ADI 2.946

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