Opinião

Algumas reflexões sobre o PL nº 2505/21: a necessidade do debate

Autor

  • Acácia Regina Soares de Sá

    é juíza de Direito substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios especialista em Função Social do Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) mestre em Políticas Públicas e Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub) coordenadora do grupo temático de Direito Público do Centro de Inteligência Artificial do TJDFT integrante do grupo de pesquisa de Hermenêutica Administrativa do UniCeub e integrante do Grupo de Pesquisa Centros de Inteligência Precedentes e Demandas Repetitivas da Escola Nacional da Magistratura (Enfam).

16 de agosto de 2021, 20h54

Para a configuração de determinados atos de improbidade administrativa, não é necessária atualmente a vontade dirigida especificamente a uma finalidade, ou seja, a presença do dolo, bastando, para tanto, a voluntariedade ou, no caso do artigo 10 da Lei nº 8.429/92, a presença do elemento culposo.

Assim, é importante diferenciar a conduta dolosa da conduta voluntária. Nesse sentido, esta última se caracteriza como uma ação livre de coação, ou seja, o agente é não forçado ou compelido a praticar a atitude, já no caso da conduta dolosa o agente atua intencionalmente com aquele fim.

Superado esse ponto, é importante fazer uma breve síntese acerca dos principais pontos referentes ao Direito Administrativo sancionador, esclarecendo-se primeiramente que não há um conceito definido no Direito brasileiro, uma vez que ainda se trata de um tema relativamente pouco explorado. Segundo Fábio Medina Osório, para se entender o Direito Administrativo sancionador se deve partir do conceito de sanção administrativa [1] para, a partir de então, poder se trabalhar com uma ideia de um conceito para esse ramo do Direito.

Nessa direção, o Direito Administrativo sancionador tem como finalidade precípua sancionar condutas que se encontram sob a regulação estatal. De modo a reprimir as condutas inerentes a funções revestidas de interesse público que não são punidos no Direito Penal ou, ainda que sejam, tenham também a obrigação de uma punição na seara extrapenal.

A sanção administrativa, segundo Fábio Medina Osório [2], prevê a aplicação de medidas de polícia, rescisórias, ressarcimento ao erário, preventivas e coativas e de responsabilidade na gestão, considerando como principais princípios do Direito Administrativo sancionador o devido processo legal, a proporcionalidade (postulado), a tipicidade, a legalidade, o contraditório e a ampla defesa.

Estabelecidas as principais diretrizes do Direito Administrativo sancionador, que, segundo o PL nº 2505/21, é o norteador das alterações na Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), passamos à consideração de alguns pontos que trazem discussões de âmbito genérico, a exemplo da previsão do seu artigo 12, que prevê a retirada do limite mínimo de sanção em caso de condenação em razão da prática de ato administrativa, o que causa insegurança jurídica e, em consequência, instabilidade nas relações, tendo em vista que tal limite dependerá, em grande parte, da critérios subjetivos estabelecidos pelo julgador.

Um outro ponto também a ser refletido se refere à vinculação da caracterização do ato de improbidade administrativa à obtenção do proveito indevido, isso porque retira a possibilidade de aplicação de sanções em razão da prática de atos de improbidade administrativa que se configurem apenas pela violação de princípios administrativos, modalidade de ato administrativo que não pode ser inteiramente afastada, mas apenas adequada de modo a observar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Ainda no campo das reflexões, uma outra questão a ser trazida é a inversão realizada pelo PL nº 2.505/21 em relação ao projeto de lei anterior em relação à perda da função pública, isso porque no projeto anterior a sanção englobava todos os vínculos públicos, no entanto, a versão aprovada na Câmara dos Deputados limita a perda ao vínculo referente ao réu que se valeu para a prática do ato de improbidade administrativa, o que demonstra uma incongruência, tendo em vista que o afastamento do agente responsável pela prática do ato de improbidade administrativa se destina a preservar a Administração Pública de maus servidores e gestores públicos, desse modo, afastá-lo apenas de uma entidade ou esfera da Administração Pública não se mostra suficiente para tanto.

Pelas reflexões acima trazidas, é possível concluir pela necessidade de uma maior discussão acerca do PL nº 2505/21 tanto com operadores do Direito como a sociedade civil organizada, de modo a garantir que cumpra sua função de proteger o patrimônio público e combater a corrupção.


[1] OSÓRIO, Fábio Medina. Direito administrativo sancionador. 6. ed. São Paulo: RT, 2019.

[2] Idem.

Autores

  • é juíza de Direito Substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, especialista em Função Social do Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul, mestre em Políticas Públicas e Direito pelo Centro Universitário de Brasília – Uniceub, coordenadora do Grupo Temático de Direito Público do Centro de Inteligência Artificial do TJDFT, integrante do Grupo de Pesquisa de Hermenêutica Administrativa do Centro Universitário de Brasília – Uniceub e integrante do Grupo de Pesquisa Centros de Inteligência, Precedentes e Demandas Repetitivas da Escola Nacional da Magistratura – Enfam.

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