Os limites da terceirização legalizada
25 de setembro de 2020, 8h00
A terceirização sempre foi considerada um grande vilão na precarização de direitos trabalhistas dos empregados submetidos à prestação dos serviços. A raiz do avanço dos abusos praticados estaria, em parte, no modelo de organização sindical por categoria que separa trabalhadores no mesmo ambiente de trabalho.
A Lei nº 8.987/2005, relativa à concessão e permissão da prestação de serviços públicos, no artigo 25, parágrafo 1º, admitiu que a concessionária contrate terceiros para "o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido". Portanto, trouxe o enfrentamento da jurisprudência do TST, na citada súmula restritiva para a atividade meio.
Depois, vieram as Leis nº 13.429/17 e nº 13.467/17, que estabeleceram normas específicas sobre a transferência da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive a principal (artigo 4º-A, da Lei nº 6.019/74). Assim, após a legalização, desnecessário ou inócuo falar em terceirização em seu conceito de origem na atividade meio, mas em qualquer das atividades do tomador de serviços.
Todavia, a avaliação do modelo e controle dos trabalhadores submetidos à prestação de serviços não resiste à sua legalidade e a utilização do princípio da primazia da realidade se enfrenta entre o formal e o verdadeiro. Em palavras outras, de onde vem o poder diretivo e disciplinar.
Neste sentido, o sítio do TST do último dia 23 veiculou notícia de que, apesar de permitido pela Lei nº 8.987/2005, a "supervisão direta por preposto da tomadora de serviço afasta terceirização de eletricitário", fruto de decisão da Terceira Turma, processo que teve como relator o Ministro Agra Belmonte (processo RR-1012-35.2013.5.04.0203).
A jurisprudência do STF, conforme lembra o relator, nos autos da ADPF 324/DF e do RE 958.252 — Tema nº 725, declarou a inconstitucionalidade da Súmula nº 331/TST, reconhecendo a licitude da terceirização em todas as etapas do processo produtivo, seja meio ou fim. Ao examinar o Tema nº 725 da Tabela de Repercussão Geral, no RE nº 958.252, fixou a seguinte tese jurídica: "É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante". E, ainda, esclarece com destaque que a Alta Corte, ao julgar a ADPF nº 324, firmou a seguinte tese, com efeito vinculante para todo o Poder Judiciário:
"1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada.
2. Na terceirização, compete à contratante: 1) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e 2) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do artigo 31 da Lei 8.212/1993."
Portanto, a terceirização está autorizada por lei e, deste modo, escapa da ilicitude.
Entretanto, a garantia em tese do STF quanto à contratação de prestação de serviços e mesmo o que dispôs a Súmula 331 do TST apontam para a possibilidade de contratação de serviços de terceiros, mas não excluem a análise dos elementos componentes do vínculo de emprego.
A terceirização, pois, pode não escapar do reconhecimento de vínculo de emprego dos trabalhadores que prestam serviços e o tomador se este estiver no exercício do poder diretivo e disciplinar da mão de obra.
Ou seja, o que aparentemente era contrato de prestação de serviços se transforma em terceirização de mão de obra, figura de extrema gravidade e proibida nas relações trabalhistas. Necessário, portanto, que a gestão se limite, não nas pessoas, mas nos serviços prestados. Caso contrário, melhor assumir a relação de emprego.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!