UTILIDADE PÚBLICA

ZH não ofendeu agentes penitenciários em notícia sobre celulares em presídios

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28 de outubro de 2020, 7h18

Sem a demonstração de conduta ofensiva a direitos de personalidade assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição (intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas), não há dever de reparação moral.

Por isso, a 2ª Turma Recursal Cível, dos Juizados Especiais Cíveis (JECs) do RS, negou o pagamento de indenização por danos morais a três agentes penitenciários que se sentiram ofendidos com a reportagem intitulada "Um celular é apreendido a cada 72 minutos nos presídios do Rio Grande do Sul", publicada no dia 20 de agosto de 2018 no jornal Zero Hora, pertencente ao grupo RBS.

A relatora do recurso inominado, juíza Elaine Maria Canto da Fonseca, disse que o jornal apenas reeditou informações, sem nenhum direcionamento à pessoa dos autores. Assim, entendeu que não houve abuso do direito de informar, mas mero exercício de liberdade de imprensa. Além disso, observou, os autos não trazem prova de que a veiculação da notícia tenha causado prejuízos de ordem moral aos demandantes.

"Cabe observar que a reportagem jornalística, na forma como publicada, não infringiu direitos constitucionais fundamentais (…), porquanto tornou público somente um fato grave, consubstanciado na corrupção de alguns agentes penitenciários, sem que houvesse a completa identificação dos autores, assumindo, a notícia, meramente caráter informativo, cumprindo serviço de utilidade pública", escreveu no acórdão que reformou a sentença, lavrado na sessão telepresencial de 30 de setembro.

Responsabilidade civil
Na ação indenizatória por responsabilidade civil, os autores alegaram que o veículo utilizou dados do pesquisador Marcos Rolim (jornalista, ex-deputado federal pelo PT e militante dos direitos humanos). Dentre estes dados, um aponta que, "hoje, 90% dos aparelhos vêm de servidores [leia-se, agentes penitenciários], que vendem para preso".

Há um trecho da fala de Rolim, pinçado pelo jornalista Hygino de Vasconcellos, que assina a reportagem, que é emblemático, segundo a petição inicial: "As apreensões se repetem e renovam o mercado. Basta um agente corrupto. Há clientela e tem quem forneça. Esse material não entra por visita, mas por nítida prática de corrupção. Hoje, 90% dos aparelhos vêm de servidores que vendem para presos. Entre 2008 e 2017, apenas cinco agentes da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) foram punidos por terem sido pegos com celulares em presídios. A Susepe não pune ninguém. A maioria das investigações é arquivada."

Sentença procedente
O juízo da Vara Adjunta do JEC da Comarca de São Luiz Gonzaga julgou procedente a demanda indenizatória, por entender que a reportagem — mesmo sem citar o nome dos autores — maculou a imagem da classe dos agentes penitenciários. Afinal, o texto não trouxe a versão destes servidores nem a palavra de cada diretor de presídio instalado no estado, para o exercício do contraditório.

Para a juíza leiga Anaméli Justen da Costa, o ZH agiu de forma negligente e imprudente ao responsabilizar agentes da segurança pública pelo ingresso de celulares nos presídios, sem verificar a fonte dos dados informados. É que, em São Luiz Gonzaga, cidade de apenas 35 mil habitantes, as pessoas sabem quem trabalha no presídio local. Por isso, atribuir aos agentes penitenciários, mesmo de forma genérica, a conduta de facilitar o acesso ou mesmo entregar aparelhos celulares aos presidiários causa grande repercussão e denigre a imagem da classe. Enfim, segundo justificou na proposta de sentença, a conduta da ré causou dano moral presumido nos autores.

"Evidenciada a má prestação do serviço, ante a desídia da Empresa Demandada e a falta de precaução no momento da vinculação da notícia, gerando inúmeros transtornos e prejuízo aos Demandantes, sequer dando causa a eles, deve-se, assim, reparar a violação dos direitos de personalidade da parte Autora", concluiu Anaméli.

O juiz de direito Thiago Dias da Cunha homologou a proposta de sentença, que arbitrou o quantum reparatório em R$ 4 mil para cada autor, totalizando RS 12 mil.

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9001338-25.2019.8.21.0034 (Comarca de São Luiz Gonzaga)

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