CRÍTICAS GENÉRICAS

TRF-4 mantém absolvição de gaúcho denunciado por caluniar procuradora do MPT

Autor

19 de outubro de 2020, 13h43

O artigo 138 do Código Penal (CP) diz que caluniar é imputar, falsamente a alguém, fato definido como crime, ferindo a honra objetiva da vítima. Assim, se o detrator não mencionar fato específico, suficientemente descrito e marcado no tempo, o crime de calúnia não se perfectibiliza.

Movida por este entendimento, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve sentença que julgou improcedente ação penal intentada pelo Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul contra Fábio Quincozes Silva, ex-supervisor de uma empresa de terceirização de mão de obra para serviços de limpeza e portaria.

Durante uma reunião na Prefeitura de Rio Pardo (RS), convocada para discutir terceirização de mão de obra no serviço público, o denunciado teria imputado o crime de corrupção passiva a Thais Fidelis Alves Bruch, procuradora do Ministério Público do Trabalho no Estado (MPT-RS) lotada em Santa Cruz do Sul. Na frente de várias pessoas, ele teria dito, segundo o MPF-RS, que a procuradora do trabalho "estava no bolso do prefeito, foi comprada". Teria afirmado, também, que os empregados da empresa de limpeza poderiam ser demitidos caso "falassem demais" ao MPT.

Sentença improcedente
Na primeira instância, o juízo da 1ª Vara Federal de Santa Cruz do Sul (RS) julgou improcedente a denúncia, uma vez que o MPF gaúcho não conseguiu provar, "acima de dúvida razoável", os fatos narrados na peça acusatória. E, neste caso, deve-se decidir pelo modo mais favorável ao denunciado, fazendo valer o conhecido brocardo latino in dubio pro reo. Assim, Silva acabou absolvido com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (CPP) — falta de provas para amparar a condenação.

Em razões de decidir, a juíza federal substituta Dienyffer Brum de Moraes explicou que o tipo subjetivo do crime de calúnia é o dolo em denegrir a honra do ofendido, imputando-lhe fato criminoso que o sabe inocente — o animus caluniandi. Mas este fato tem de ser definido, específico, para configuração do tipo penal. E tal não ocorreu no caso dos autos.

Segundo apurou a julgadora, um dos informantes ouvido no processo disse que o acusado não falou nada sobre a procuradora no dia da reunião na Prefeitura. A imputação ("estava no bolso do prefeito") teria se dado noutra ocasião, durante reunião na Secretaria de Obras da Prefeitura.

Ela destacou que uma das testemunhas não se lembrava das palavras do acusado à época, mas, após o MPT ler trecho do depoimento dela na fase de inquérito, ratificou as suas palavras. Ou seja, confirmou que teria presenciado a imputação nesta e noutras reuniões. Outras testemunhas alegaram desconhecer os fatos e/ou ouvir "comentários" sobre tal imputação por parte do acusado. Por fim, no interrogatório, o denunciado negou ter feito qualquer comentário em relação à procuradora, responsável pela condução do inquérito civil.

"Conforme se viu da audiência de instrução, a única testemunha compromissada que afirmou ter ouvido diretamente o denunciado falar que ‘a Procuradora do Trabalho estava comprada’ foi o Sr. Dione Alexandre do Nascimento. Contudo, a testemunha inicialmente afirmou que não se lembrava do ocorrido e somente após o Ministério Público Federal ter lido o depoimento prestado em sede policial, a testemunha ratificou os termos do depoimento do inquérito, o que demonstra insegurança quanto aos exatos termos dos fatos testemunhados", concluiu a juíza na sentença.

Animus criticandi
A relatora da apelação criminal na 7ª Turma do TRF-4, desembargadora Claudia Cristina Cristofani, confirmou a decisão de primeiro grau, ressaltando que crime de calúnia não se contenta com afirmações genéricas e de cunho abstrato. Ela também observou que não há ofensa contra a honra na externalização de possível enquadramento jurídico de conduta.

"Pode se dizer que existem, sim, indícios contra o acusado, mas eles são muito frágeis para respaldar um decreto condenatório acima de qualquer dúvida razoável", escreveu no voto. Para Cristofani, o réu não tem obrigação de provar a sua inocência. Antes, cabe ao Ministério Público demonstrar, de forma inequívoca, a culpabilidade do acusado — o que a instituição não conseguiu fazer nesta ação penal.

"Assim, ausente o propósito de atingir a honra de terceiro, inerente à ação de ofender, não há falar em dolo específico. Inexistindo, pois, o dolo específico, quando o autor do fato age com animus criticandi, por exemplo, não há que se falar em crimes de calúnia, difamação ou injúria, devendo ser mantida a rejeição da inicial pela impossibilidade jurídica do pedido ante a atipicidade do fato praticado", resumiu no voto.

O acórdão transitou em julgado no dia 24 de setembro.

Clique aqui para ler a sentença
Clique aqui para ler o acórdão
Processo 5001931-44.2019.4.04.7111/RS

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!