Projetos em tramitação

TSE adia aplicação de questão racial para 2022 e dá espaço a atuação do Congresso

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26 de agosto de 2020, 9h53

Ao discutir e, por fim, aprovar que a divisão do Fundo Eleitoral e do tempo de TV sejam proporcionais ao total de candidatos negros, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral lidou com a delicada questão do ativismo judicial: como mitigar as omissões estatais e sociais sem descambar para a imposição de escolhas diferentes daquelas feitas pela sociedade ou seus representantes na implementação de políticas públicas.

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Câmara dos Deputados tem PLs em tramitação sobre ação afirmativa eleitoral 
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O limite transpareceu no resultado: se por um lado a corte aprovou essas medidas, por outro refutou a reserva de vagas nos partidos políticos para pretos e pardos, por entender que essa definição de cota racial caberia ao Congresso. E, na aplicação da decisão, abriu espaço para uma definição legislativa: por 4 votos a 3, adiou a ação afirmativa para as eleições gerais de 2022.

Esse adiamento foi proposto pelo ministro Og Fernandes e aceito pela maioria em termos práticos: as convenções partidárias se iniciam em menos de uma semana, em 31 de agosto; e ao menos 11 partidos já estão aptos a receber recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Aplicou-se, por analogia, o artigo 16 da Constituição, que diz que a lei que alterar processo eleitoral entra em vigor na data de sua publicação, mas não vale para eleição que ocorra até um ano da data inicial de sua vigência.

Segundo o ministro Og, a matéria pede "sem sombra de dúvidas, a providência no sentido de se oficiar ao Congresso Nacional para que se debruce sobre o tema das cotas raciais na política".

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Ministro Og Fernandes propôs que se oficie Congresso Nacional para se debruçar sobre o tema das cotas raciais na política TSE

Projetos de lei
Tramitam no Congresso Nacional ao menos dois projetos de lei sobre o tema. O mais recente tem, entre seus muitos autores, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), justamente a autora da consulta decidida pelo TSE.

Primeiro, ela acionou a corte eleitoral, em junho de 2019. O processo foi distribuído em fevereiro e o julgamento, iniciado em 30 de junho recente. Depois disso, em 3 de agosto de 2020, apresentou o Projeto de Lei 4.041/2020 à mesa da Câmara.

O PL modifica a Lei das Eleições e a Lei dos Partidos para assegurar que sejam observadas, no registro de candidaturas e preenchimento das vagas para o Poder Legislativo, a diversidade étnico-racial do país, bem como sejam assegurados recursos e tempos de rádio e televisão equivalentes — não a toa, os exatos termos da consulta levada ao TSE.

A apresentação deste PL está entre os motivos que levaram o ministro Tarcísio Vieira de Carvalho a votar, na terça-feira (25/8), negando completamente a consulta. Vieira ressaltou que, como o tema está em análise no Congresso, não existe omissão legislativa. Eventual incursão do TSE, portanto, "turbaria o genuíno debate instaurado na seara legislativa". Ele ficou vencido.

Conforme destacado pelos ministros, há ainda outro projeto em tramitação: o PL 8.350/2017, que prevê destinação de recursos do Fundo Partidário para a promoção da participação política de afrodescendentes. Ele tramita com outros 15 PLs apensados. Está pronto para ser pautado no Plenário da Câmara, mas sem movimentação desde setembro de 2017.

TSE
Voto vencido do ministro Tarcísio Vieira ressaltou que tema decidido pelo TSE está, às inteiras, em análise na Câmara 
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Vai, Congresso
"A aplicação prospectiva da tese vencedora, a partir das eleições de 2022, permitirá ao Congresso Nacional, com base no projeto de lei de autoria da própria consulente, igualmente, se debruçar sobre a temática, inclusive podendo regulamentá-la em linhas até mais expressivas que aquelas decorrentes das respostas conferidas por este Tribunal Superior", afirmou o ministro Tarcísio Vieira, já vencido, ao se manifestar sobre o adiamento dos efeitos da decisão.

O ministro Sérgio Banhos concordou. Formada a maioria, sugeriu que o Congresso fosse oficiado sobre a discussão do tema no TSE para que considere nas discussões das duas casas legislativas. "Desta forma, privilegiaríamos o Poder Legislativo. E se em face da omissão legislativa, essa corte poderia se preparar melhor para edição de resoluções", opinou.

A ideia de usar resolução para efetivar a proteção à candidatura de negros foi, também, dada apelo ministro Og Fernandes. Ele citou alguns pontos que precisariam de deliberação: auto declaração racial e impugnação; consequências da inobservância do percentual pelos partidos políticos; e eventual doação dos recursos recebidos entre negros e brancos.

"Somente com a edição prévia de uma resolução, cuja elaboração deverá ser precedida de realização de audiência pública como forma de fomentar o debate e a participação da sociedade como instrumento da democracia participativa, é que se alcançará a necessária segurança jurídica", afirmou.

"A resposta à consulta, apesar de fruto de intenso e colaborativo debate entre os eminentes pares, demanda posterior Resolução por esta Corte, de modo a disciplinar o tema, nos termos do art. 105 da Lei 9.504/97, segundo o qual o TSE, atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previamente, em audiência pública, os representantes dos partidos políticos", concordou o ministro Luís Felipe Salomão.

Clique aqui para ler o PL 4.041/2020
Clique aqui para ler o PL 8.350/2017
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