Falsos Heróis

Deltan e Moro deveriam assumir seus erros e sair de cena, diz Gilmar

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15 de setembro de 2019, 11h34

Os integrantes do consórcio formado em torno da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba violaram o Estado democrático de Direito e deveriam assumir seus erros e saírem de cena. O Brasil precisa encerrar o ciclo dos falsos heróis. A declaração é do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo e ao site UOL deste domingo (15/9).

Gervásio Baptista/SCO/STF
Operação "lava jato" deveria assumir seus erros e sair de cena, diz Gilmar a jornal

"Simplesmente dizer: nós erramos, fomos de fato crápulas, cometemos crimes. Queríamos combater o crime, mas cometemos erros crassos, graves, violamos o Estado de Direito", pontuou. 

Na entrevista, Gilmar afirmou que o STF teria que fechar se considerasse popularidade de Moro ao julgá-lo. "A corte não pode se curvar à popularidade do hoje ministro da Justiça para tomar suas decisões. Se um tribunal passar a considerar esse fator, ele que tem que fechar”, disse. 

O ministro afirmou ainda que as mensagens reveladas pelo site The Intercept Brasil e por outros órgãos de imprensa mostram um “jogo de promiscuidade”.

“O conúbio entre juiz, promotor, delegado, gente de Receita Federal é conúbio espúrio. Isso não se enquadra no nosso modelo de Estado de Direito.”

Em relação ao procurador Deltan Dallagnol e a Sergio Moro enquanto juiz, Gilmar explicou que as pessoas percebem que atuaram e tem atuado de maneira devida. "Se nós viermos a anular ou não esses julgamentos, o juízo que está se formando é o de que não é assim que a Justiça deve funcionar. Que isso é errado, que essas pessoas estavam usando as funções para outra coisa. Isso ficou cada vez mais evidente", disse. 

Ataques à democracia
Gilmar Mendes disse ainda que o país entrou "em uma processo de acendrada polarização, no final do primeiro governo Dilma [Rousseff] e no início do segundo governo Dilma". 

"O tribunal, em geral, ficou isolado. A mídia fez esse tipo de eco. O Supremo foi muito vilipendiado nesse contexto, embora o tribunal tivesse um ativo consigo. Foi o tribunal que condenou os mensaleiros, foi o tribunal que levou a cabo sem produzir diatribes processuais, sem produzir violações. Só mandou prender depois do trânsito em julgado", apontou. 

Para Gilmar, é preciso fortalecer a democracia e criticar fortemente aqueles que, de alguma forma, por discurso, por prática, a ameaçam.

"Devemos estar atentos e, a cada sinal, especialmente partindo de pessoas com responsabilidade institucional, devemos criticar ou mesmo reprimir. Clamar pela restauração do regime militar é um crime contra a democracia, contra a segurança nacional. Quando alguma autoridade se investe de um poder incontrastável ou soberano, ela de fato ameaça a democracia", defendeu. 

Gilmar também falou sobre o uso de provas ilícitas em benefício do réu. Para ele, uma informação que isenta alguém de responsabilidade por um homicídio, ainda que tenha sido obtido ilicitamente, deve ser de alguma forma reconhecida.

"Esse é um debate que certamente vamos ter na turma, se chegarmos a esse ponto da questão, sobre o uso das informações vindas do The Intercept. Mas aí uma curiosidade e uma observação: quem defendia o uso de prova ilícita até ontem eram os lavajatistas. Nas dez medidas [de combate à corrupção], estava lá que a prova ilícita de boa-fé deveria ser utilizada.

Mudanças no Supremo
Ao ser questionado sobre a presença de um ministro evangélico no Supremo, o ministro afirmou que é preciso saber, primeiro, ler a Constituição. "É fundamental que tenha a reputação ilibada e notável saber jurídico. O critério religioso não faz parte do texto constitucional. As pessoas podem ter as mais diversas convicções. Poderá vir um ministro evangélico com um notável juiz, mas não deve ser escolhido por isso. Deve ser escolhido por saber aplicar bem a Constituição", disse. 

Sobre o ministro Sergio Moro em uma cadeira no Supremo, Gilmar acredita que deve ser considerado o tempo. "Isso terá que ser considerado no seu tempo. Começamos com o Moro quase como primeiro-ministro, agora já não se sabe mais nem se ele será ministro amanhã, se continua [no governo] ou em que condições continua. Em suma, esse processo é muito dinâmico, e a política é um pouco assim. Nós estamos vivendo tempos de vertigem, de mudanças. Precisamos esperar, mas certamente não será uma indicação muito simples", disse.

Assista a entrevista:

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