COMANDO DO MPF

"Em uma força-tarefa, especialistas trazem sinergia indispensável a investigações"

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11 de junho de 2019, 9h00

Antonio Fonseca, subprocurador da República, é um dos entrevistados do dia na série que a ConJur publica a partir desta terça-feira (11/6), ouvindo todos os candidatos à lista tríplice para concorrer à Procuradoria-Geral da República.

3ª CCR
Ph.D. em Direito Econômico pela Universidade de Londres, mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília e especialista em Integridade e Compliance, Fonseca atua no Superior Tribunal de Justiça na área de Direito Público e é membro titular da 5ª Câmara Anticorrupção e instrutor da ESMPU. Também é professor universitário na área concorrencial e de regulação econômica, advogado e membro do Conselho de Ética do Instituto Ética Saúde. Foi conselheiro do Cade, presidente da Fundação Pedro Jorge e coordenador da 3ª Câmara da Ordem Econômica do MPF.

Há 18 anos a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) leva ao presidente da República uma lista com três nomes escolhidos pela classe para comandar a instituição. A votação está marcada para o dia 18 de junho, das 10h às 18h30, por meio eletrônico.

Apenas a primeira lista tríplice, enviada em 2001 ao presidente Fernando Henrique Cardoso, foi descartada. De lá para cá, todos os PGRs estavam entre os três indicados. Apesar da tradição, nada impede que o presidente da República indique para sabatina no Senado um quarto nome.

O mandato da atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge, termina em 18 de setembro, mas, de acordo com a Constituição Federal, ela pode ser reconduzida ao cargo, se for indicada pela Presidência da República. Também decidiu concorrer ao cargo sem participar da lista da ANPR o subprocurador-geral da República Augusto Aras.

Neste ano, dez integrantes da instituição concorrem a uma vaga na lista da ANPR. Seis deles são subprocuradores-gerais da República, o último degrau da carreira. Os demais são procuradores regionais, com atuação nos Tribunais Regionais Federais.

Leia a entrevista com Antônio Fonseca:

ConJur — O MP pode fazer campanha de combate à corrupção? Esse tipo de campanha é compatível com as funções do órgão? Por quê?
Antonio Fonseca —
Corrupção previne-se e se combate. A desconstrução desse mindset requer também um esforço de sensibilização. Fazer o que é certo se aprende graças aos sentidos humanos. Campanhas podem ser um meio promovido ou determinado pelo Ministério Público a influenciar a ordem social. A promoção ou determinação desse tipo de ação poderá ocorrer pelas vias judiciais ou extrajudiciais; poderá decorrer de recomendações ou de qualquer procedimento de solução consensual de conflito. Tudo que é adequado aos interesses sociais é, em tese, compatível com as funções do MP.

ConJur — Os acordos de delação premiada pararam de ser assinados. O modelo sofreu algum impacto com a suspensão do acordo com a JBS?
Antonio Fonseca —
Acordos de delação continuam a ser assinados. Aqueles envolvendo autoridades com foros nos tribunais superiores têm ritmo próprio. Compreensível! O impacto da corrupção é como uma onda: não chega em todos os lugares ou em todas as instâncias com a mesma força. Pelas peculiaridades, o acordo da JBS gerou lições que fazem bem a iniciantes. Assumir e tomar compromissos em geral exigem posturas de colaboração, respeito e lealdade. Nada mais.

ConJur — Faz sentido o MP ser fiscal da lei em casos criminais?
Antonio Fonseca —
Diz-se que o procurador ou promotor é dono da ação criminal. Isso não exclui a atuação de fiscal da lei. O MP que acusa é o mesmo que fiscaliza. Mas o papel de acusador é diverso de quem fiscaliza a aplicação da lei. A segregação de papéis faz sentido em face dos bens jurídicos em jogo no processo criminal. O que importa é a exata consciência que o membro (procurador ou promotor) tem no exercício do seu papel.

ConJur — Como deve ser o relacionamento do MP com a Polícia e com o Judiciário? Como avalia essa relação atual?
Antonio Fonseca —
O relacionamento entre esses atores deve ser respeitoso, cordial e não competitivo. Da boa atuação dos três depende a entrega de valor à sociedade. Algum estresse no passado decorreu de más condições de trabalho e da falta de compreensão dessas funções. O estresse hoje é mínimo, graças ao crescente grau de preparo desses atores e à transparência cada vez mais exigida da sua atuação.

ConJur — O modelo de força-tarefa prejudica o direito de defesa? Por quê?
Antonio Fonseca —
A força-tarefa é um modelo de atuação que facilita a presença de especialistas, que somam suas expertises para desvendar crimes complexos. É muito comum a ocorrência de fraudes e, por exemplo, conluio em licitações. O concurso de especialistas, incluindo profissionais de formação não jurídica, gera uma sinergia extraordinariamente indispensável ao progresso das investigações. A junção de forças depende de decisões de autoridades superiores. Isso permite a atuação da força-tarefa em espaços territoriais para além do local de lotação de cada componente. Assim, a força-tarefa tem alcance regional ou nacional. Não há prejuízo ao direito de defesa. O Direito Penal clássico tem se revelado insuficiente em si para frear a macrocriminalidade. Apesar de saber disso, o advogado é quem se queixa — não o acusado — dos mecanismos modernos de persecução. O advogado especialista na defesa do crime de colarinho branco convive hoje muito bem com a nova dimensão da responsabilidade penal.

ConJur — O MP pode interferir na execução de políticas públicas em nome do combate à corrupção?
Antonio Fonseca —
Em tese, um caso de corrupção poderá afetar uma ou mais políticas públicas. Assim, a atuação do MP poderá afetar a execução de uma política pública, seja para melhorar práticas vigentes ou para corrigir malfeitos. A atuação dos órgãos de controle poderá  interromper, por exemplo, a construção de uma ponte, de uma escola ou do fornecimento de merenda escolar. Mas isso precisa ser acompanhado de medidas saneadoras, paralelas e temporais, capazes de liberar o mais cedo possível a entrega pública do bem ou serviço. Em algumas situações, uma força-tarefa poderá ser implementada com a missão, temporária, bem especificada. A interferência na política pública poderá ser evitada em caso de gestão efetiva da ética e compliance.

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