Crise institucional

Após massacre, governo anuncia verba para construir um presídio em cada estado

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5 de janeiro de 2017, 15h40

Após o massacre de 56 presos em Manaus no último domingo (1º/1) gerar uma crise institucional em relação à administração dos presídios brasileiros, o presidente Michel Temer anunciou nesta quinta-feira (5/1) um repasse de R$ 800 milhões para a construção de pelo menos uma penitenciária em cada estado. Ao falar sobre as mortes, Temer classificou a chacina como um "acidente pavoroso".

Marcelo Camargo/Agência Brasil
Para Temer, massacre foi "acidente pavoroso". Já o ministro da Justiça afirmou que a responsabilidade é da empresa que administra o presídio. Marcelo Camargo/Agência Brasil

Os recursos fazem parte do R$ 1,2 bilhão do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) liberado pela União no final de 2016. O presidente disse ainda que outra parte do montante, R$ 150 milhões, será para a instalação de bloqueadores de celulares em pelo menos 30% dos presídios de cada estado.

A medidas foram anunciadas em entrevista coletiva que marcou o primeiro pronunciamento do presidente após o massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj). Segundo Temer, não houve “uma responsabilidade objetiva, clara e definida dos agentes estatais” no episódio de Manaus, uma vez que os presídios da capital amazonense têm serviços terceirizados.

“Claro que [as autoridades] tinham de ter informações e acompanhamento. Os dados foram acompanhados pelo Ministério da Justiça desde o primeiro dia. [O ministério] Colocou todos os dispositivos federais por conta do presídio de Manaus”, afirmou o presidente.

Segundo Temer, mais R$ 200 milhões (recursos extras) serão destinados para a construção de cinco presídios federais, além dos quatro prontos e um em obra. O Ministério da Justiça informou que prevê a liberação de R$ 1,8 bilhão para o sistema penitenciário ainda neste primeiro semestre.

Troca de acusações
Na mesma entrevista coletiva, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, disse que a “responsabilidade visível e imediata” do massacre ocorrido no Compaj é da empresa Umanizzare, responsável pela administração do presídio.

“O presídio é terceirizado. Não é uma PPP [parceria público-privada]. É terceirização dos serviços. Basta verificar os fatos para ver que houve falha da empresa. Não é possível que entrem armas brancas e armas de fogo, e que todos saibam antes, pela internet, por meio de selfies de presos. Quem tinha a responsabilidade imediata para verificar essa entrada e a festa de final de ano é a empresa que faz a segurança”, disse o ministro em entrevista coletiva no Palácio do Planalto, minimizando o papel do poder público no episódio.

Em resposta à declaração do ministro, a empresa Umanizzare informou que, contratualmente, a segurança e vigilância da unidade prisional são funções exclusivas do governo do Amazonas.

Punitivismo é a causa
Em entrevista à ConJur, os ministros Marco Aurélio e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, além de juízes e advogados, afirmaram que as mortes em Manaus têm como causa, em última instância, o punitivismo do Estado.

Questionado pela ConJur sobre o caso de Manaus, Marco Aurélio lembrou da ADPF 347, na qual a corte proibiu a União de contingenciar o dinheiro do Fundo Penitenciário Nacional: "[O Estado] Deve atentar para a obrigação constitucional de preservar a integridade física e moral do preso que um dia voltará ao convívio social. É dele a responsabilidade pelo estado de coisas inconstitucional existente, como ressaltei em voto na ADPF da qual sou relator".

Entidades se manifestam 
A Anistia Internacional no Brasil pediu que as autoridades façam uma investigação imediata, independente e completa do massacre. A seccional amazonense da Ordem dos Advogados do Brasil também se envolveu e entrou com um processo contra o estado do Amazonas por causa das péssimas condições de seu sistema penitenciário. A entidade argumenta em ação civil pública que o problema está na ausência de ações emergenciais concretas.

Entidades que representam a magistratura divergem sobre a melhor forma de evitar novos massacres em unidades prisionais. Enquanto a Associação dos Juízes Federais do Brasil propõe mais investimentos em presídios federais — “verdadeiras ilhas de excelência em um sistema falido” —, a Associação Paulista de Magistrados declarou que essa seria uma forma de enfraquecer o Judiciário estadual.

Reprodução/TV Globo
Rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, começou no dia 1º de janeiro e registrou 56 mortos.
Reprodução/TV Globo

PCC x FDN
A rebelião no Compaj começou na tarde de domingo e terminou na manhã da segunda-feira (2/1). Segundo o secretário de Segurança Pública do Amazonas, Sérgio Fontes, a chacina é resultado da rivalidade entre duas organizações criminosas que disputam o controle de atividades ilícitas na região amazônica: a Família do Norte (FDN) e o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Aliada ao Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, a FDN domina o tráfico de drogas e o interior das unidades prisionais do Amazonas. Desde o segundo semestre de 2015, líderes da facção criminosa amazonense vêm sendo apontados como os principais suspeitos pela morte de integrantes do PCC, grupo que surgiu em São Paulo, mas já está presente em quase todas as unidades da federação.

O secretário de Segurança Pública afirmou que o estado, sozinho, não tem condições de controlar uma situação como essa. Agentes penitenciários da empresa terceirizada Umanizzare e 74 presos foram feitos reféns. Parte desses detentos foram assassinados, e ao menos seis, decapitados. Corpos foram arremessados por sobre os muros do complexo.

Poucas horas antes do início da rebelião no Compaj, dezenas de detentos tinham conseguido escapar de outra unidade prisional de Manaus, o Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat). O próprio secretário chegou a afirmar a jornalistas que a fuga do Ipat pode ter servido como “cortina de fumaça” para acobertar a ação no Compaj. Com informações da Agência Brasil. 

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