Tentativa de censura

Jornalista é processado por informar supersalário de servidor municipal

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4 de novembro de 2016, 13h35

Por ter publicado o valor do salário de um servidor público que atua como contador na Câmara Municipal de Corumbá (MS), Erik Silva, editor-chefe do site Folha MS, está sendo processado por calúnia, injúria e difamação. O jornalista nada mais fez que colher e interpretar dados que estavam disponíveis no Portal da Transparência. Assim, constatou que o profissional lotado no órgão Legislativo recebeu, em março, vencimentos de mais de R$ 45 mil — acima do teto permitido por lei, de R$ 33,7 mil, correspondente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal.

A ação que tramita na vara criminal foi impetrada quatro dias depois de o texto produzido por Silva ir ao ar, no dia 21 de abril. Um detalhe chama a atenção: o nome do servidor, Júlio Cesar Bravo, não chegou a ser mencionado no texto. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul abriu inquérito para apurar possíveis irregularidades no Legislativo de Corumbá.

A reportagem foi publicada sem o posicionamento do servidor e do presidente da Câmara Municipal, vereador José Tadeu Vieira (PDT), mas o jornalista enfatiza que retornou os contatos com os dois depois de ter divulgado o conteúdo.

“Voltei a me prontificar em divulgar os motivos de tanto dinheiro para o contador e, dessa vez, ouvi do presidente da Câmara que não iria se pronunciar. Porém, em tom intimidador, ele disse que o jurídico tomaria as providências”, contou o jornalista em entrevista ao portal Comunique-se.

Tadeu Vieira não respondeu aos questionamentos de meses atrás, mas aparece como testemunha da acusação no processo movido contra o profissional da imprensa, assim como a servidora — que não teve o nome divulgado até o momento — que se tornou pauta para o veículo sul-mato-grossense por ter recebido em um único mês vencimentos que ultrapassaram os R$ 32 mil.

Ataque orquestrado de juízes contra imprensa
O caso faz lembrar o ataque orquestrado por juízes estaduais do Paraná contra o jornal Gazeta do Povo, por causa de reportagens que informavam à população da existência de salários acima do teto legal no Judiciário local.

Todas as ações dos juízes são idênticas, pedindo direito de resposta e indenizações por danos morais, que somam R$ 1,3 milhão, segundo o jornal. De acordo com a Gazeta, os pedidos são sempre no teto do limite do juizado especial, de 40 salários mínimos. Já houve uma condenação, em R$ 20 mil. Das 36 ações, só duas são de promotores.

Parte da estratégia dos juízes é pedir em juizados especiais. Por lei, antes de as ações serem instruídas, as partes devem participar de audiências de conciliação. E como as ações são em 15 municípios diferentes, os jornalistas autores das reportagens têm de viajar pelo interior do Paraná para comparecer às audiências.

Em julho, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu os processos. Na mesma época, em evento em São Paulo, a ministra Cármen Lúcia afirmou que as ações coordenadas dos juízes contra os jornalistas deram um novo sentido à expressão "censura judicial".

Cármen explicou que, até então, a censura judicial tratava-se de liminares concedidas por juízes para impedir a publicação de determinadas notícias. Agora, com o novo caso, os juízes passaram para o polo ativo do processo.

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