Caminho desconhecido

Falta de dados sobre grampos da "lava jato" invalida provas, diz OAS

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21 de janeiro de 2015, 16h51

Não há informações sobre como as mensagens de celular trocadas entre um funcionário da construtora OAS e Alberto Youssef foram interceptadas. Segundo a defesa do empresário, a falta de registros sobre os “caminhos” que essa interceptação percorreu até chegar aos autos a torna ilegal e, portanto, não pode ser apresentada como prova em juízo. As alegações estão na resposta à denúncia apresentada contra José Aldemário Pinheiro Filho, presidente afastado da OAS, que responde pelos atos da empresa.

José Aldemário Pinheiro Filho, conhecido por Leo Pinheiro, é um dos investigados na operação “lava jato”. A investigação é conduzida pelo Ministério Público Federal no Paraná para apurar denúncias de pagamento de propina a diretores da Petrobras na assinatura de grandes contratos. Pinheiro é acusado de integrar um suposto cartel de empreiteiras que combinava quanto cobraria para prestar serviços à estatal.

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A denúncia diz que Leo Pinheiro participou da corrupção de Paulo Roberto Costa, diretor da Petrobras que colabora com a investigação sob o regime de delação premiada. O MPF também diz que Pinheiro lavou dinheiro por meio dos serviços de Alberto Youssef (foto) e apresentou documento falso à Justiça Federal paranaense. Pelas acusações, está preso preventivamente.

Pinheiro, que é defendido pelos advogados Roberto Telhada, Edward Rocha de Carvalho e Jacinto Coutinho, nega todas as acusações.

Youssef é acusado de ser doleiro e de operar as finanças do esquema descrito por Ministério Público e Polícia Federal. Réu confesso, ele colabora com as investigações sob o regime de delação premiada. A conexão entre Youssef e Leo Pinheiro, segundo a denúncia, estaria provada por mensagens de texto trocadas o doleiro e um executivo da companhia.

Mas, de acordo com a defesa do empresário as provas que levaram o MPF à essa conclusão foram colhidas de forma ilegal. A petição entregue nesta quarta-feira (21/1) à Justiça afirma que a Polícia Federal violou a Constituição, leis e um tratado de cooperação internacional entre Brasil e Canadá para interceptar as mensagens de texto que levam a acusação a crer na conexão entre a OAS e Alberto Youssef.

Questão de contatos
O executivo da OAS e Youssef trocavam mensagens por meio de aparelhos BlackBerry. São celulares que têm um sistema próprio para troca de mensagens de texto, chamado BlackBerryMessages, ou BBM. Os servidores que dão suporte ao sistema — e por onde essas mensagens passam e ficam armazenadas — ficam no Canadá. Por isso, em tese, a polícia brasileira não poderia ter acesso ao seu conteúdo.

Segundo a defesa do empresário, para que esse sistema seja interceptado pela polícia brasileira, há todo um caminho burocrático a percorrer: os pedidos de cooperação devem tramitar por autoridades centrais, que avaliam a pertinência e a possibilidade de cumprir com o pedido. No Brasil quem responde como autoridade central é a Procuradoria-Geral da República. No Canadá, o Ministério da Justiça. É uma maneira de manter um “controle da soberania”, diz a defesa.

No caso do executivo da OAS, a Polícia Federal pediu à 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, onde corre a operação, a interceptação telemática dele. Pedia que a Research In Motion (RIM), fabricante do BlackBerry, desse, “em tempo real, acesso ao conteúdo dos diálogos e/ou mensagens dos seguintes aparelhos telefônicos”.

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O juiz responsável pelo caso, Sergio Fernando Moro (foto), estranhou o pedido e pediu esclarecimentos. A princípio, “o destinatário da ordem judicial deve ser uma empresa no Brasil, ainda que representante de outra no exterior”.

Mas a PF respondeu que a interceptação seria “transmitida por canais diretos entre o Departamento de Polícia Federal e a referida empresa”. O contato da RIM com a PF brasileira seria um homem chamado Andrew — até agora sem sobrenome — conforme consta dos autos. E Moro, então, autorizou o prosseguimento da interceptação.

Sem rastro
O grampo resultou em um documento em formato HTML (linguagem de programação usada em sites da internet) gerado pelo próprio Departamento de Polícia Federal.

Aí está o problema apontado pelos advogados. O procedimento burocrático das cooperações internacionais deixa um rastro de ofícios, ordens, pedidos etc.: sai da polícia, para o Ministério Público, para o Judiciário, para o órgão de cooperação internacional, para o órgão estrangeiro e faz todo o caminho de volta. No caso da OAS, não há nenhum registro desse caminho.

Como não há pegadas da interceptação, não há controle sobre como ela foi feita, por quem, quem teve acesso, se o arquivo foi alterado ou editado. Isso torna toda a prova ilegal, já que não há formas de controlar a investigação. Até mesmo a veracidade das mensagens está passível de contestação — e o empresário contesta: “Afinal, não se pode dizer serem os resultados verdadeiros, porque sem controle”.

“Este juízo, tendo a oportunidade de optar por um atuar conforme a legalidade, fez exatamente o oposto, contaminando todo o caso com a ilegalidade e inconstitucionalidade que decorrem da inobservância de regras internacionais e nacionais. As  provas obtidas, então, são ilícitas, bem como as dela decorrentes, devendo ser declarada a nulidade com a extensão a todos os atos subsequetes”, diz a petição.

Por isso a defesa pede que sejam feitas diligências. Os advogados querem saber, por exemplo, que autoridades tiveram acesso às interceptações, como ecquando elas foram enviadas à RIM e por quem, quem as recebeu e quais os telefones atingidos. Também querem ouvir o ministro da Justiça do Canadá e que todas as mensagens grampeadas pela PF sejam listadas e enviadas à defesa.

Clique aqui para ler a resposta à denúncia de Leo Pinheiro.

*Texto autalizado às 19h da quarta-feira (21/1) para correção de informação.

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