Ministros e advogados apontam problemas da demora de indicação para o STF
27 de fevereiro de 2015, 16h33
A demora da presidente Dilma Rousseff em indicar um nome para o Supremo Tribunal Federal já não irrita só os que são apontados como cotados para a vaga. Cada vez que surge uma vaga, a indicação do substituto demora mais. Na sessão da quinta-feira (26/2), os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio reclamaram do empate no julgamento de uma Ação Direita de Inconstitucionalidade. E advogados reclamam de casos parados na corte por falta de quórum para julgamento.
A cadeira da vez foi deixada pelo ministro Joaquim Barbosa. Ele se aposentou em julho de 2014, dez anos antes de atingir a idade para a aposentadoria compulsória e em plena presidência da corte. Não foi uma surpresa para o governo, já que em maio daquele ano ele avisou à Presidência de que sairia antes do recesso do meio ano.
A resposta do governo para não indicar ninguém, na época da saída de Joaquim, foi a do período eleitoral, que começara oficialmente um mês antes de o ministro aposentar. Dilma está eleita desde o fim de outubro. Portanto, lá se vão cinco meses desde que ela já poderia ter indicado alguém. Só que, conforme já até disse o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, “não há pressa” para a indicação.
Os efeitos já são sentidos. Na quinta, a discussão no Supremo sobre a constitucionalidade de uma lei de Minas Gerais empatou. O comentário do decano da corte, o ministro Celso de Mello, foi o de que “essa omissão irrazoável e abusiva da presidente da República já está interferindo no resultado dos julgamentos”.
Para o presidente do Instituto dos Advogados do Brasil, Técio Lins e Silva, a demora “desarruma o princípio republicano”. “Os poderes são independentes, mas são harmônicos. Portanto não é republicano que o Executivo não cumpra com sua parte em relação ao Judiciário.”
Lins e Silva analisa que o momento político também é ruim. O governo federal enfrenta duras críticas e fala-se até em impeachment, e isso é “mais um elemento”, diz o presidente do IAB. Para a imagem da presidente também é ruim: “È desnecessário levar um pito do decano do Supremo Tribunal Federal. A presidente Dilma é uma das poucas pessoas que terão na biografia um carão do ministro Celso de Mello, um homem educadíssimo”, comenta Técio.
O presidente da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Ibaneis Rocha, tem opinião parecida. “É necessário que o Palácio do Planalto perceba que a nomeação se faz imperiosa porque se trata da mais alta corte de Justiça, responsável por assegurar a tripartição dos poderes, a higidez do processo legislativo e a garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos frente ao Estado”, escreveu em artigo publicado no site Diário do Poder nesta sexta-feira (27/2).
Já o presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro, afirma que o caso reflete “indevida interferência do Executivo no Judiciário, decorrente da qualificada omissão da presidente da República”.
Efeitos
Para além das críticas institucionais, há efeitos práticos. O gabinete do ministro Dias Toffoli, por exemplo, contabiliza que no primeiro semestre recebia uma distribuição de 200 a 300 casos por mês, em média. No segundo, já sem Joaquim Barbosa, esse número subiu para cerca de 600 ao mês.
Outros dois gabinetes relataram situação parecida à revista Consultor Jurídico, mas pediram para não ser expostos na reportagem.
Há duas explicações. A primeira é que, se com a corte completa a distribuição é dividida por dez (o presidente não recebe processos), com uma ausência, nove ministros recebem a mesma quantidade de casos. E como a procura pelo Judiciário aumenta a cada ano, um ministro faz muita falta.
A outra explicação é que o ministro Ricardo Lewandowski, que suscedeu Joaquim na presidência do Supremo, estabeleceu como uma de suas metas zerar o estoque da distribuição. São os casos que chegam à Secretaria Judiciária do STF e ficam aguardando para ser distribuídos aos gabinetes.
Lewandowski ainda não atingiu a meta, mas foi sob sua gestão que a média de distribuição deu um salto. Em 2014, 72% dos casos recebidos pelo tribunal foram enviados aos gabinetes. Um ano antes, a média foi de 62%.
Quadra atual
O vice-decano da corte, ministro Marco Aurélio, é um dos sempre críticos de quem ignora os reflexos da atuação de um poder em relação ao outro. Na sessão da quinta, ressaltou “como é nefasto atrasar-se a indicação de quem deve ocupar a cadeira”. Mas há outros problemas.
Na mesma sessão em que os dois mais antigos criticaram a presidente Dilma Rousseff, outros ministros estavam ausentes da sessão: Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Em entrevista à ConJur em dezembro de 2014, Marco Aurélio já criticava a ausência de colegas. Reiterou sua reclamação quanto ao atraso das sessões do Plenário — são marcadas para começar às 14h, mas nunca começam antes das 14h30 — e relatou estar preocupado com “a existência de cadeiras vazias no Plenário”.
Naquela ocasião, contou sobre uma discussão de inconstitucionalidade de lei do Rio de Janeiro que não pôde ser travada porque não havia oito ministros presentes. “À época da velha guarda dificilmente se tinha uma cadeira vaga.”
O ministro atribuiu a situação ao momento vivenciado pelo Brasil. “É uma quadra de abandono a princípios, de perda de parâmetros, de inversão de valores, em que o dito passa pelo não dito, o certo pelo errado. E o Supremo é a última trincheira da cidadania, ele deve dar o exemplo”, afirmou.
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