Inquérito sigiloso

Inglaterra julga caso sobre corrupção em ajuda para o Iraque

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25 de março de 2014, 16h49

A Suprema Corte do Reino Unido vai julgar nesta quarta-feira (26/3) um caso que envolve os conflitos no Iraque, denúncias de corrupção em associação de caridade e a liberdade de imprensa. O julgamento, que deve ser anunciado pela manhã no horário de Londres, vai dizer se a agência reguladora de caridade britânica é obrigada a revelar para um jornalista documentos sobre uma campanha contra as sanções impostas ao Iraque.

Os juízes vão decidir se a lei britânica que garante o acesso à informação, chamada de Freedom of Information Act 2000 (Foia), tem alguma brecha para que investigações internas conduzidas pela agência reguladora não sejam reveladas. Quem briga pelo direito de ter acesso à informação é o jornalista Dominic Kennedy, do jornal The Times. Caso a Suprema Corte decida a favor da liberdade de informação, é possível prever novos escândalos e inquéritos públicos.

A história que está por trás do pedido de Kennedy começou na década de 1990. O Iraque vivia um período difícil por conta das sanções impostas pela ONU ao governo de Saddam Hussein. Em 1998, um político britânico chamado George Galloway resolveu começar uma campanha contra essas sanções. A proposta era oferecer medicamentos e tratamento médico para os iraquianos que sofriam sem a ajuda dos outros países. A campanha foi chamada de Mariam Appeal, em referência a uma criança que foi levada do Iraque para a Inglaterra para tratar leucemia.

O apelo durou até 2003, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque e deram um fim ao governo de Saddam. O fim da campanha foi marcado por denúncias de corrupção envolvendo seu fundador, George Galloway. Ele teria usado dinheiro arrecadado para pagar viagens de integrantes do movimento. Galloway ainda foi acusado de receber ilegalmente dinheiro destinado ao programa da ONU Oil for Food, que permitia que o Iraque vendesse petróleo para outros países em troca de comidas e remédio.

Com o fim da Mariam Appeal e a enxurrada de acusações publicadas pela imprensa, a Charity Commission, agência que regula as entidades de caridades no Reino Unido, resolveu abrir um inquérito sobre a campanha. Foi quase um ano de investigação. Em maio de 2004, o relatório final foi divulgado. A grande questão é que a campanha nunca foi registrada como uma entidade de caridade, mas a agência considerou que isso foi um erro de orientação dado a Galloway sem maiores consequências. Sobre o desvio de verba, foi considerado que não havia evidências de que o dinheiro arrecadado tenha sido usado de maneira inapropriada.

O problema do inquérito conduzido pela Charity Commission é que, por a campanha nunca ter sido registrada como uma entidade, não manteve registro de caixa. Com seu fim, todos os documentos foram, pelo menos teoricamente, perdidos e qualquer prova, apagada. George Galloway, que é deputado, foi alvo de inquérito também no Parlamento e acabou suspenso por 18 sessões, mas a história se encerrou aí. Ele nunca admitiu qualquer irregularidade na campanha.

Desde então, o jornalista do Times Dominic Kennedy tenta ter acesso a todo inquérito conduzido pela Charity Commission. Ele defende que, por lei, tem direito de vasculhar todos os documentos recolhidos pela agência. Em 2012, a Corte de Apelação rejeitou o pedido de Kennedy. O tribunal considerou que a legislação sobre o assunto não obriga uma entidade a revelar inquérito conduzido por ela mesma. Clique aqui para ler a decisão em inglês.

Nesta quarta-feira (26/3), a Suprema Corte do Reino Unido vai julgar se essa brecha encontrada pela Corte de Apelação existe mesmo. E, se sim, se ela deve ser aplicada para garantir o sigilo de inquéritos conduzidos no país.

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