Violência e superlotação

Problemas das prisões brasileiras ganham destaque mundial

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8 de janeiro de 2014, 14h10

Os problemas do sistema carcerário brasileiro repercutiram negativamente nos últimos dias na imprensa mundial. Jornais dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Espanha e Argentina, afirmaram que a situação dos presos no Brasil é considerada desumana, ao noticiar o caso do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, onde 60 presos morreram em 2013.

Devido a crise no Maranhão, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos pediu nesta quarta-feira (8/1) que as autoridades brasileiras tomem providências para colocar em prática, em todo o país, o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, instituído em dezembro de 2013.

De acordo com o órgão, é lamentável ter de expressar preocupação com o "terrível" estado das prisões no Brasil. Em nota, o Alto Comissariado recomenda a redução da superlotação dos presídios brasileiros — não só no Maranhão — e o provimento de condições dignas aos detentos. "Pedimos que as autoridades brasileiras conduzam investigações imediatas, imparciais e efetivas sobre esses eventos, processem os responsáveis e tomem as medidas apropriadas para colocar em vigor o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura", declarou o Alto Comissariado.

O jornal espanhol El País observa que, apesar de o caso ser no Maranhão, o problema ilustra "o que ocorre na imensa maioria dos 1.478 presídios do país". O jornal informa que a crise maranhense não é uma novidade no Brasil e que o mesmo presídio já havia passado por uma rebelião em 2010, quando uma inspeção do Conselho Nacional de Justiça alertou para o potencial de crise no estado. A notícia espanhola lembra a medida cautelar expedida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), e o apelo da organização para um presídio em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

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De acordo com a ONG Conectas Direitos Humanos, a população carcerária no país cresceu 380% nos últimos 20 anos. Ao todo são 548 mil presos, 207 mil a mais do que o número de vagas no sistema. “Por trás dos números, cultivamos um sistema prisional violador de valores, da lei e de qualquer parâmetro razoável de eficiência. Ou seja, um sistema inaceitável, ilegal e ineficiente”, afirma Lucia Nader, diretora Executiva da Conectas.

De acordo com ela, o sistema é o próprio gerador da violência, “seja por meio das facções — formadas no vácuo e incompetência do Estado — ou pela forma como não recupera, nem ressocializa egressos à sociedade.  Estima-se que tenhamos hoje uma taxa de reincidência de 60%. É assim que cultivamos um barril de pólvora, vendo na prisão a principal ferramenta para inibir a violência e, na prática, só fazendo com que essa aumente”, diz.

Um levantamento feito pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) entre fevereiro de 2012 e março de 2013 em 1.598 estabelecimentos registrou 121 rebeliões e 769 mortes. Uma média de 2,1 morte por dia dentro dos presídios. Além disso, a pesquisa registrou mais 2,7 mil lesões corporais.

No início de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes lembrou que quando presidiu o Conselho Nacional de Justiça, em 2008, encontrou um quadro de desmando completo ao fazer os mutirões carcerários.

Para ele, a situação vai além de ser um problema de direitos humanos, mas de segurança pública. "A omissão do Estado é suprida por organizações criminosas. Os privilégios são dados não pelo sistema estatal, mas pelo sistema informal que se organiza no presídio", disse em entrevista à colunista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo.

Diante da deficiência da Defensoria Pública para atender a demanda e da falta de um modelo estruturado, o ministro propõe um serviço obrigatório para advogados recém-formados. "Poderíamos pensar num serviço civil obrigatório para todo jovem egresso das faculdades de direito das universidades públicas. Eles ficariam um ano fazendo estágio no sistema prisional", explica. Entretanto, o ministro reconhece que as questões corporativas são um entrave à ideia.

Violência no Maranhão
Nesta terça-feira a Anistia Internacional manifestou preocupação “com a escalada da violência e a falta de soluções concretas” para os problemas no sistema penitenciário do Maranhão. Em nota, a ONG destacou que mais de 150 pessoas foram mortas no estado, desde 2007, sendo 60 no ano passado. “Nesse período, graves episódios de violações de direitos humanos foram registrados nos presídios do estado, como rebeliões com mortes, superlotação e condições precárias”, diz o documento.

A Anistia Internacional considerou inaceitáveis os casos de presos decapitados nas penitenciárias e as denúncias de estupro de mulheres e irmãs de presidiários durante as visitas. “É inaceitável que uma situação como essa se prolongue por tanto tempo sem nenhuma atitude efetiva das autoridades responsáveis”.

De acordo com a ONG, a medida cautelar decretada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em 16 de dezembro de 2013, deve ser implementada, sem demora, de modo a assegurar “iniciativas urgentes para diminuir a superlotação vigente, garantir a segurança daqueles sob a custódia do Estado e a investigação e responsabilização pelas mortes ocorridas dentro e fora do presídio”.

Na decisão, a OEA pede que o Brasil adote medidas efetivas para evitar a morte de presos no presídio de Pedrinhas; a redução imediata da superlotação das penitenciárias; e investigação dos homicídios ocorridos. “Após analisar as alegações de fato e direito apresentadas pelas partes, a comissão considera que a informação apresentada demonstra que as pessoas privadas de liberdade no Complexo Penitenciário de Pedrinhas se encontram em uma situação de gravidade e urgência, pois sua vida e integridade pessoal estariam ameaçadas e em grave risco”, diz a CIDH.

A decisão foi tomada após pedido de providências feito pela Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e pela Ordem dos Advogados do Brasil. Com informações da Agência Brasil e Assessoria de Imprensa do Conectas.

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