Ausência de dolo

TJ-RS absolve acusado de pedofilia por conduta atípica

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27 de fevereiro de 2013, 7h30

Armazenar imagens de crianças em poses sensuais a partir de um computador de lan house não é crime, mas conduta atípica. Foi a conclusão a que chegou a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao prover Apelação de um homem condenado por pedofilia na comarca de São Sebastião de Caí.

No primeiro grau, em atenção à denúncia oferecida pelo Ministério Público estadual, o réu foi condenado por divulgar as imagens. O delito é descrito no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, em sua redação anterior à Lei 11.829/2008.

Para o desembargador Diógenes Hassan Ribeiro, relator, divulgar significa tornar público. Neste raciocínio, o ato de "divulgar" consistiria em oferecer visivelmente a página de internet a quem passasse pelo local. Entretanto, embora tivesse ficado patente que o local em que ficavam os computadores não era restrito, não foi apresentada nenhuma prova de que o réu tivesse mostrado as imagens para terceiros.

Conforme o desembargador Hassan Ribeiro, para a configuração do crime denunciado, é necessário dolo na conduta do agente — o que não ficou comprovado. "Então, a conclusão é pela atipicidade da conduta, por ausência do elemento subjetivo do tipo."

Finalizando o seu voto, o relator disse que conduta do denunciado poderia tipificar outro delito, como o atualmente vigente artigo 241-B, do ECA, que prevê punição a quem possuir ou armazenar este tipo de material. Ocorre que o dispositivo foi incluído pela Lei nº 11.829/2008 — que entrou em vigor em novembro de 2008 —, e a conduta denunciada pelo MP foi praticado em junho do mesmo ano. O acórdão foi lavrado dia 30 de janeiro, com entendimento unânime. Ainda cabe recurso.

O caso
No dia 9 de junho de 2008, no centro do município de Bom Princípio (RS), o réu foi flagrado acessando imagens de crianças no computador de uma lan-house — onde também funciona uma lanchonete. Chamados ao local, os policiais constataram que a página da internet estava aberta ao público, visível para quem ali circulasse.

Durante a abordagem, o homem — casado e com 37 anos à época — foi detido com um pen drive, contendo fotos de meninas em poses eróticas. Na ocasião, ele disse aos policiais que havia copiado as imagens para dentro do dispositivo e que iria transferi-las para o seu computador de casa, que não tem acesso à internet.

Ele contou à polícia que acessou as imagens quando navegava num site sobre modelos infantis, indicado por uma revista semanal — da qual disse não se lembrar o nome. Admitiu que tinha curiosidade em ver as imagens e que, no seu entender, estas se constituem em material artístico e não em pornografia.

O inquérito aberto pela delegacia de São Sebastião do Caí, município vizinho, serviu de base para o oferecimento da denúncia do Ministério Público. Assim, o homem foi denunciado a partir das sanções previstas no artigo 241 do ECA — que criminaliza a divulgação de fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente.

A defensora pública Alice Backes de Leon, que defendeu o acusado, sustentou a inexistência de fato típico. Disse que o réu acessou as imagens, mas não com o intuito de divulgá-las, já que as salvou em seu pen drive com o objetivo de vê-las em casa. Além disso, com base no testemunho policial, observou que somente o réu estava no local, além do proprietário do estabelecimento.

A condenação
A juíza Vanessa Caldim dos Santos, da 2ª Vara da Comarca de São Sebastião do Caí, entendeu que a materialidade do fato e a autoria delitiva estavam comprovadas pela ocorrência policial e pela confissão espontânea do réu.

Além do policial que efetuou a detenção, ela deu destaque para o depoimento do proprietário do estabelecimento que, após receber queixas de frequentadores da lan house e da lanchonete anexa, que a tudo assistiam, confirmou que o réu acessava fotos de ‘‘crianças só de calcinha’’.

Conforme a juíza, para a caracterização do tipo penal previsto no artigo 241 do ECA, basta o emprego de qualquer meio visual eficaz, pouco importando se a divulgação ocorre para um número considerável de pessoas ou não.

Assim, a juíza determinou pena de dois anos e seis meses de reclusão, no regime aberto, e multa de 15 dias-multa à razão mínima. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária.

Clique aqui para ler o acórdão. 

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