Corte britânica manda advogado reembolsar Promotoria
24 de março de 2012, 7h12
Um processo em tramitação no Judiciário britânico tem provocado debate sobre os deveres dos advogados para com a Justiça. Recentemente, a Corte de Apelo do Reino Unido condenou um defensor a reembolsar os cofres públicos por gastos desnecessários durante processo criminal. A corte considerou que o advogado tentou manipular a Justiça ao requerer desnecessariamente a presença de uma testemunha que morava na Austrália.
A discussão que se trava é definir onde está o equilíbrio entre o dever do advogado em relação ao seu cliente e em relação ao sistema judiciário. O entendimento firmado na primeira instância e mantido pela Corte de Apelo é o de que o defensor precisa comunicar seu cliente que ele tem de obedecer às leis e às regras processuais, ainda que isso signifique revelar a estratégia de defesa. Quando o cliente não concorda, cabe ao advogado abandonar o caso e comunicar o tribunal. Caso contrário, é o defensor que terá de arcar com o desrespeito.
No Reino Unido, uma mudança legislativa feita em 1990 garante que, nos processos penais, uma parte cobre da outra reembolso por gastos desnecessários feitos durante o processo. Como gastos desnecessários entendem-se aqueles feitos como resultados de qualquer ato impróprio, não razoável ou mesmo negligente da outra parte. A ordem de reembolso não é vista pela Justiça como uma punição, mas apenas como uma restituição. Nos processos penais, normalmente, o responsável por restituir é o advogado da parte.
Foi com base nesse dispositivo legal que a Justiça impôs que o escritório britânico SVS pagasse pouco mais de 3 mil libras (cerca de R$ 8,5 mil) para o Ministério Público. O valor refere-se ao custo que o MP teve para levar uma testemunha da Austrália até Londres para depor num processo em que a banca SVS Solicitors representava o acusado. A ida da testemunha se mostrou inútil e a Justiça entendeu que a defesa agiu com má-fé.
A história começou quando três homens invadiram uma casa em Londres e renderam os moradores em busca de dinheiro. Com a chegada da Polícia, os três fugiram. Um deles, Luke Nseki, foi preso e denunciado pelo crime. No momento do crime, além da proprietária da casa e seus dois filhos, estava presente no imóvel um inquilino que alugava um dos cômodos no fundo da propriedade. Ele não foi rendido. Esse inquilino, pouco depois, se mudou para a Austrália. Ficou nas mãos da acusação um depoimento informal prestado por ele.
Antes de Nseki ir a julgamento, o advogado de defesa dele se opôs à leitura do depoimento do inquilino, mas em momento algum explicou o motivo. A acusação então considerou ser fundamental trazer a testemunha da Austrália para depor. Os argumentos da defesa só foram conhecidos no dia do crime. A versão lida em nome de Nseki foi de que ele mantinha um relacionamento homossexual secreto com o inquilino e estava na casa a convite dele. Com a chegada da Polícia, o inquilino pediu que ele saísse pelos fundos e, na fuga, foi preso.
Um desentendimento com o juiz fez com que o advogado de Nseki renunciasse o caso e, num novo julgamento com um novo defensor, o acusado apresentou outra versão. Contou que não entrou na casa. Estava perto do local vendendo maconha e foi preso por engano. O seu novo advogado, então, retirou o impedimento para que o depoimento informal do inquilino fosse lido em Plenário. Tarde demais. O Ministério Público já tinha trazido o inquilino da Austrália para poder depor pessoalmente.
Nseki foi condenado por roubo e o Ministério Público foi para a Justiça pedir reembolso pelos custos com a viagem e hospedagem da testemunha. A primeira instância condenou a primeira banca que defendeu Nseki, a SVS, a reembolsar os gastos considerados desnecessário. A decisão foi mantida pela Corte de Apelo (clique aqui para ler a decisão em inglês).
O escritório já pediu ao tribunal o direito de apelar para a Suprema Corte . Na semana passada, a Ordem dos Advogados britânica avisou que vai pedir para ser ouvida caso a Suprema Corte aceite julgar o recurso. Deve demorar meses até que o tribunal decida contra ou a favor o direito de apelar. A partir daí, mais alguns meses até a palavra final da Suprema Corte.
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