Metas para todos

"Pacto Republicano viola independência do Judiciário"

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31 de julho de 2011, 9h13

Spacca
Do modo como está concebido, o Pacto Republicano representa uma violação à independência do Poder Judiciário. Afinal, não há em torno do pacto metas que envolvam o Legislativo e o Executivo. A constatação é do desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, ex-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros entre 1998 e 1999 e considerado uma das lideranças na Justiça Estadual do Rio de Janeiro.

“O Pacto Republicano verdadeiro, que eu veria com simpatia, é aquele que envolvesse metas, objetivos e programas dos três Poderes. Supor que só os tribunais precisam de um Pacto Republicano, dirigido ou tutelado pelos outros Poderes, é diminuir o Judiciário”, afirmou, em entrevista concedida à revista Consultor Jurídico.

O desembargador também considera curiosa a existência da Secretaria de Reforma do Judiciário, órgão do Ministério da Justiça. “Existe alguma Secretaria de Reforma do Executivo no Supremo Tribunal Federal? Existe alguma Secretaria de Reforma do Legislativo no Superior Tribunal de Justiça? Por que a reforma do Judiciário tem que ter seus projetos germinados, estimulados e desenvolvidos no âmbito de uma secretaria cujo titular é demissível pelo ministro da Justiça, que por sua vez é demissível pelo presidente da República?”, questiona.

Na entrevista feita durante as apurações para o Anuário da Justiça Rio de Janeiro 2011, Luiz Fernando também esmiúça algumas polêmicas que envolvem a prestação jurisdicional. No segundo grau, fala sobre a aplicação do artigo 557, do Código de Processo Civil, que permite ao desembargador decidir monocraticamente. “É lógico que o advogado, que prefere sustentar, vê na monocrática uma diminuição das possibilidades do devido processo legal. Mas existem outras formas de garantir o contraditório, que seriam exatamente o Agravo interno [recurso interposto contra a decisão monocrática para que seja apreciado pelo colegiado] e a entrega de memoriais aos outros integrantes da turma julgadora”, afirma.

O desembargador também avalia o Judiciário nos últimos 10 anos. “Eu não diria que nós vamos ter um avanço satisfatório tão cedo, se é que vamos ter algum dia. Como um país que tem a necessidade de saúde, educação, moradia, trabalho, que são direitos fundamentais do homem, vai poder aplicar verbas expressivas no Poder Judiciário? Não vai. Sempre vai haver uma defasagem entre a necessidade e a possibilidade.” Para contornar o excesso de demanda e a falta de estrutura, recomenda soluções criativas.

Carioca, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho traz na bagagem 10 anos de militância na advocacia, cinco na Defensoria, além de já ter sido presidente da Associação de Magistrados do Rio de Janeiro e da AMB. Autor do livro Justiça em Mutação — a Reforma do Poder Judiciário, Luiz Fernando preside uma das Câmaras em que mais se debate os processos que são submetidos à sessão de julgamento.

“A 3ª Câmara tende mais para um voto coletivo. Há possibilidade de o desembargador mudar o voto depois de ouvir o advogado ou o colega. Acho que é o que combina mais com o jeito do colegiado. A Câmara é a soma de vontades, de pensamentos, de modo de ver as coisas. Quem julga individualmente é o juiz de primeira instância. Esse não tem jeito. No entanto, o juiz de segundo grau deve tirar do colegiado a possibilidade de enriquecer seus votos. Para isso tem que ter boa vontade e disposição de ceder em um ponto de vista a fim de alcançar o que chamamos de voto médio.”

Leia a entrevista:

ConJur — Desembargadores reclamam de que há uma quantidade muito grande de recursos para serem julgados. A sessão de julgamento acaba se estendendo e, após tantos casos julgados, fica complicado prestar atenção nos demais. O senhor preside uma Câmara que é conhecida pelos debates. Acha que o aumento da demanda pelo Judiciário vai mudar o conceito do julgamento colegiado?
Luiz Fernando —
A solução já está no Código de Processo Civil. É o artigo 557, que permite ao desembargador julgar monocraticamente quando se tratar de questão repetitiva. Assim, não é necessário levar ao colegiado questões de direito que se repetem a toda hora. Se já há uma posição consolidada, para que levar ao colegiado? É uma aparência de democracia que não corresponde à realidade. Se combinarmos o uso de disposições como o artigo 557 no CPC e institutos como o processo repetitivo no STJ e a repercussão geral no STF, serão julgadas, no colegiado, as questões verdadeiramente controvertidas. Não se imagina que uma causa nova, que vá repercutir para centenas de milhares ou até para milhões de pessoas, deva ser julgada por um único juiz, por mais sensibilidade, cultura, preparo e dedicação que ele tenha. A resposta para o crescimento da população e aumento do número de processos é a combinação equilibrada, bem ajustada, entre aquilo que pode ser julgado individualmente nos Tribunais e as demandas que têm que ser julgadas coletivamente, para surgir no debate coletivo uma decisão melhor.

ConJur — Os advogados criticam a adoção de decisão monocrática na Apelação, pois no Agravo interno, apresentado contra essa decisão, não é permitida a sustentação oral. Impedir a sustentação não viola a ampla defesa?
Luiz Fernando —
Eu diria que reduz o campo de atuação. Violar não, porque quando o advogado formulou seu pedido de Agravo, ele apresentou suas razões e foi ouvido. Se o desembargador decidir em favor do agravante ou apelante, a outra parte também pode formular um Agravo interno e também será ouvida. Pode entregar memoriais para os outros desembargadores que não tinham ainda conhecimento do processo. É lógico que o advogado, que prefere sustentar, vê na monocrática uma diminuição das possibilidades do devido processo legal. Mas existem outras formas de garantir o contraditório, que seriam exatamente o Agravo interno e a entrega de memoriais aos outros integrantes da turma julgadora. O próprio Supremo, chamado a se manifestar sobre isso, decidiu que o artigo 557 do CPC, que permite a decisão monocrática, é plenamente constitucional. Ele não viola as garantias da defesa e do contraditório.

ConJur — No tribunal, também há situações em que algumas Câmaras se dividem em relação a uma tese jurídica. Dependendo de qual é a composição da Câmara no dia do julgamento o resultado é diferente para casos idênticos. Por um lado, existe a independência do julgador; por outro, tem a questão da segurança jurídica. Até que ponto a segurança jurídica não fica ameaçada quando há divergências como essas?
Luiz Fernando —
É possível conciliar isso da seguinte maneira: imaginemos uma questão jurídica quando ela está nascendo, ou seja, quando ela ainda nem se tornou polêmica. Se em nome da segurança jurídica já se firmasse uma posição, nós teríamos um engessamento do Direito. O Direito tem que seguir o dinamismo da vida. A vida não foi feita para o Direito, e sim o contrário. É preciso deixar essas questões evoluírem durante certo tempo, até que, pelo amadurecimento do debate, uma tese jurídica prevaleça sobre a outra. Esse debate é uma construção do pensamento que não se esgota no jurídico, embora, no final, vá assumir uma tradução jurídica. Em algum momento aquilo que foi polêmico e não atendeu à segurança jurídica vai se tornar consolidado em uma determinada tese, que pode resultar da vitória de uma delas e até da conjugação de duas. Essa segurança jurídica, resultante de um debate, é benéfica. A meu ver, é um falso dilema dizer que o fato de existir posições distintas nos Tribunais durante certo tempo fira a segurança jurídica.

ConJur — Quem tem uma demanda negada enquanto o amigo teve o reconhecimento do direito vai achar que fere.
Luiz Fernando —
Vai ferir para quem é leigo em Direito. No Direito Previdenciário, por exemplo, de vez em quando há uma mudança de posição no Supremo, no STJ ou no tribunal estadual. Como explicar para um segurado do INSS que ele teve um benefício garantido e, pior, para o vizinho dele que o mesmo benefício, na mesma situação, não foi reconhecido, porque foi julgado em outro tribunal? As pessoas, evidentemente, não estão preocupadas com a segurança jurídica. Elas estão preocupadas com o que é justo, com o que é normal, com a predominância do seu direito e do que elas pensam que seja o seu direito. Se a preocupação com a segurança jurídica é posta no plano em que deve ser, logo ela não pode nascer em um primeiro momento. Do contrário, a segurança jurídica seria, na verdade, a imposição de uma visão totalitária do Direito.

ConJur — O ministro Cezar Peluso tentou incluir no Pacto Republicano o controle prévio de constitucionalidade de algumas leis, ideia que acabou encontrando resistência no Congresso. Essa avaliação prévia da lei pelo Judiciário seria uma maneira de dar a segurança jurídica sem atropelar esse amadurecimento?
Luiz Fernando —
Em primeiro lugar, para mim, o Pacto Republicano, tal como está concebido, é uma violação à independência do Poder Judiciário.

ConJur — Por quê?
Luiz Fernando —
Porque nós não temos um Pacto Republicano em torno das metas do Poder Executivo, cuidando dos programas e objetivos daquele poder. O mesmo ocorre em relação ao Poder Legislativo. Por que só tem Pacto Republicano para os outros Poderes opinarem sobre as metas do Poder Judiciário? O Pacto Republicano verdadeiro, que eu veria com simpatia, é o que envolvesse metas, objetivos e programas dos três Poderes. Supor que só os tribunais precisam de um Pacto Republicano dirigido ou tutelado pelos outros Poderes é diminuir o Judiciário. É como se o Judiciário reivindicasse para o Executivo e o Legislativo determinadas situações, que, se eles abençoarem, vão constar no pacto. Outra questão interessantíssima e curiosíssima é a Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça. Existe alguma Secretaria de Reforma do Executivo no Supremo Tribunal Federal? Existe alguma Secretaria de Reforma do Legislativo no Superior Tribunal de Justiça? Por que a reforma do Judiciário tem que ter seus projetos germinados, estimulados e desenvolvidos no âmbito de uma secretaria cujo titular é demissível pelo ministro da Justiça, que por sua vez é demissível pelo presidente da República? Não é uma antipatia gratuita, mas sim do ponto de vista de uma filosofia política, que envolveria a necessidade de uma interação entre os três Poderes em igualdade de condições. O que se vê é uma intervenção dos demais Poderes no Judiciário, inaceitável do ponto de vista de harmonia e independência dos Poderes.

ConJur — Por outro lado, congressistas viram na ideia de controle prévio de constitucionalidade uma interferência do Judiciário no Legislativo.
Luiz Fernando —
Eu não vejo no controle prévio um modo de ferir a separação dos Poderes, que é uma cláusula fundamental da República. Imagino que se devesse discutir bastante, por exemplo, a necessidade de haver um quórum muito expressivo ao fazer o controle prévio. Isso porque o Supremo estaria, de certa maneira, freando iniciativas dos demais Poderes. Não poderia ser com uma maioria de 5 a 4 ou 6 a 5. É preciso uma maioria bem qualificada e com uma posição muito categórica para não cair na tentação oposta, ou seja, passar a tutelar os demais Poderes.

ConJur — O presidente do STF também apresentou a chamada PEC dos Recursos, proposta que pretende antecipar a execução das decisões a partir do julgamento do recurso na segunda instância. Como o senhor avalia essa proposta?
Luiz Fernando —
Vejo a proposta como um algo muito saudável do ponto de vista de fortalecer os tribunais dos estados e os Tribunais Regionais Federais. Com isso se fortalece a federação. Quem quisesse levar a demanda para além dos estados teria um obstáculo. Todo mundo sabe que é mais difícil ganhar uma Ação Rescisória do que um recurso. Na verdade, propor que a ação transite em julgado no estado dá a dignidade que um tribunal de segundo grau deve ter. As causas que interessam às pessoas deveriam terminar na segunda instância. Já aquelas que interessam ao país, à coletividade, à nacionalidade e à cidadania é que deveriam chegar aos tribunais superiores.

ConJur — E essas questões, ao serem decididas pelo Supremo ou STJ, teriam que ter um efeito vinculante? Há juízes que não concordam com a decisão do tribunal superior e mantêm o posicionamento deles, mesmo sabendo que já há uma decisão de Brasília no sentido contrário.
Luiz Fernando —
Em relação à Súmula Vinculante isso não pode ocorrer. Quando a Súmula Vinculante estava sendo discutida no Congresso, havia sérias dúvidas sobre a sua eficácia. No entanto, hoje, não posso defender um processo em que haja discussão contrária à Súmula Vinculante. Ignorá-la é violar a Constituição. O juiz pode ressalvar o seu ponto de vista pessoal no próprio processo, mas tem de aplicar o entendimento do STF. Decidir de forma contrária à Súmula Vinculante seria uma heresia, independente do que penso a respeito dela.

ConJur — O senhor é a favor de se criar patamares para fixação de danos morais? Ou seja, serem estipulados valores mínimo e máximo para determinadas situações?
Luiz Fernando —
Eu não vejo legitimidade em estipular os patamares através de um consenso do tribunal. Isso é uma matéria tipicamente legislativa, porque se está criando uma norma para valer no futuro. E o tribunal, quando cria uma norma no seu julgamento, é para uma situação que já passou e que está sendo julgada agora. Através de lei, eu vejo algumas vantagens, pois o excesso de subjetivismo às vezes atrapalha no arbitramento do dano moral. Poderia haver alguns parâmetros legais, não com tipos muito fechados, mas com tipos passíveis de uma abertura para interpretação do juiz. Isso porque o legislador trabalha com hipóteses abstratas; o juiz, com situações concretas.

ConJur — Na sua opinião, o contato direto com o advogado ajuda ou atrapalha o entendimento do que está no processo?
Luiz Fernando —
Eu acho que ajuda. Pode atrapalhar quando o advogado não tem a compreensão de que o tempo do juiz é muito escasso. Às vezes, vemos o advogado entrar em uma sala de audiência e querer ser atendido na hora. Não é possível, a não ser que seja uma questão de vida ou de morte. De modo geral, o juiz, o desembargador, o ministro, ao atender o advogado, pode colher elementos interessantes e se informar melhor sobre o processo. Isso não quer dizer, em absoluto, que vá criar qualquer tipo de vinculação com o resultado do processo. A própria Constituição coloca o advogado como função essencial à Justiça. O meu gabinete fica aberto o dia inteiro para os advogados. Se eu estou trabalhando em um processo em que eu não possa parar, peço para esperar um pouco, para voltar em uma hora. Mas, em regra, o juiz não deve deixar de atender nenhum advogado. O que acontece é que alguns juízes mais novos não atendem. Passa-se a falar em “juizite”. Vejo como uma espécie de falta de experiência e de maturidade; não atendem porque acham que vão ser colocados em xeque. O juiz não precisa resolver na hora, pode enviar o processo à conclusão para depois estudá-lo. Na verdade, advocacia e magistratura são atividades coirmãs. Não se imagina o juiz sem advogado e nem o advogado sem juiz, e o Ministério Público e a Defensoria Pública.

ConJur — São atividades complementares.
Luiz Fernando —
Sim. Eu me sentia menos juiz quando trabalhava na primeira instância e a Defensoria Pública, na época, estava com tanta deficiência de pessoal que não podia atender uma parte, que, por sua vez, não tinha advogado porque não podia pagar. Eu me sentia mais juiz quando a parte estava assistida por um bom advogado e defensor público. Quando a parte está bem assistida, melhora as condições de se fazer Justiça. Um juiz criminal legaliza a condenação quando o réu foi bem defendido. Quando o réu é bem defendido, o juiz pode, se for o caso, condenar com tranquilidade de espírito, porque foi garantido o direito de defesa.

ConJur — O senhor presidiu a AMB há mais de 10 anos. Como o senhor avalia o Judiciário nesse período?
Luiz Fernando —
Evoluiu bastante do ponto de vista de incorporação de novas tecnologias. Mas ainda há dilemas como, por exemplo, o grande crescimento da demanda, que foi muito superior ao aumento percentual de juízes. Essa explosão de demanda ainda é um problema a ser resolvido. O que se pensa para isso são os meios alternativos, como conciliação, mediação e Juizados Especiais. Sem esses meios alternativos, o Judiciário, sozinho, não aguenta. Existe uma maior consciência de direitos, a Defensoria Pública está se espalhando pelo país todo. Antes, poucos estados tinham Defensoria. Existem áreas, como na Justiça do Trabalho, em que os sindicatos têm departamentos jurídicos que dão assistência gratuita ao trabalhador. Isso é algo que já existe há bastante tempo e é importante. Tem que se fazer um esforço para atender a essa demanda, porque a média de processos que cada juiz recebe, quando comparado com outros países considerados civilizados, é muito maior. A diferença é brutal. De 10 anos para cá eu diria que nós tivemos um avanço, mas de maneira nenhuma ainda é satisfatório. E eu não diria que poderemos ter um avanço satisfatório tão cedo, se é que vamos ter. Como um país que tem a necessidade de saúde, educação, moradia, trabalho, que são direitos fundamentais do homem, vai poder aplicar verbas expressivas no Poder Judiciário? Não vai. Sempre vai haver uma defasagem entre a necessidade e a possibilidade. E nós temos que encontrar maneiras criativas de enfrentar isso.

ConJur — O TJ do Rio vive uma realidade um pouco diferente de outros tribunais, principalmente pelo fato de ter o fundo especial.
Luiz Fernando —
Exato. O fundo especial deu uma certidão de maioridade ao Judiciário. Até então funcionava com o repasse de verbas do Executivo. Para construir um Fórum qualquer tinha que pedir verba do Executivo e esperar a boa vontade. O fundo especial deu uma maioridade no sentido de que, com exceção da verba de pessoal que vem do Executivo, qualquer verba de custeio, de compras de equipamentos, de informática, de construção e reforma de fóruns, tudo isso vem do fundo especial. Isso dá uma margem de atuação. Hoje, se o presidente do tribunal vai a uma comarca do interior e percebe que o fórum não atende mais a população daquela comarca, ele pode resolver construir um novo. Não tem que consultar o governador. Isso é que eu chamo de parcela de autonomia que legitimamente o Judiciário tem. Evidentemente, tem de empregar as regras de maneira equilibrada, condizente com a necessidade. E tem havido um zelo muito grande na aplicação das verbas do fundo, porque, em contra partida, estabeleceu-se que para custeio, obras e reformas, não se pode mais pedir verba ao Executivo. A maioridade implicou uma responsabilidade.

ConJur — E como o senhor avalia o papel do CNJ desde que ele foi criado?
Luiz Fernando —
De maneira positiva, mas ainda está em fase embrionária, dando uns passos em descompasso com a Constituição. Tem exercido, a meu ver, um centralismo exagerado e desnecessário. Às vezes, procura exercer uma atividade legislativa que não é dele. Por exemplo, o Código de Processo Civil diz que o juiz pode se dar por suspeito nas situações que retiram sua isenção, e basta dizer que está suspeito por razões de foros íntimos. O CNJ baixou uma resolução dizendo que o juiz tinha que declarar essas razões. A lei diz que basta dizer que são razões de foro íntimo. Resultado: um ministro do Supremo concedeu uma liminar para suspender a resolução do CNJ. Apesar disso, continuo achando que o saldo é positivo. O CNJ veio para uniformizar certos procedimentos. O Judiciário não tinha um órgão de planejamento central. Mas isso não pode se dar contra a federação.

ConJur — E quanto à punição de juízes pelo CNJ? Isso tem gerado algumas controvérsias. Os juízes estão sendo mais punidos com a atuação do CNJ?
Luiz Fernando —
Não. Isso não existe. Havia uma ideia de que os tribunais protegiam os juízes por corporativismo. Como o CNJ está longe dos fatos e não conhece os juízes, puniria dentro da lei. Mas o CNJ só deveria punir um juiz depois de o tribunal local examinar o processo e decidir. Se o tribunal local protegesse o juiz, o CNJ podia avocar o processo e retirar a proteção. E se o tribunal local, o que às vezes também acontece, perseguisse o juiz, o CNJ poderia avocar o processo e arquivá-lo. Não é o caso do Rio e de muitos outros estados, mas há lugares em que há perseguições bastante severas, injustas e rigorosas com relação a juízes. Na minha visão, o CNJ deveria aguardar a decisão do tribunal e só quando surgisse um indício de perseguição ou de proteção, avocaria o processo e decidiria antes do tribunal. Se não houvesse nenhum indício, ele esperaria o resultado do processo e decidiria em grau de recurso para rever a decisão. Aí sim, cumpriria precisamente o seu papel.

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