Liberdade de expressão

Adriane Galisteu e TV não precisam indenizar empresa

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14 de julho de 2011, 15h45

Opinião negativa sobre o desempenho de um produto, expressa em programa de variedades, sem caráter técnico e sem intuito depreciativo, não gera dever de indenizar. Há somente, neste caso, o exercício do direito à livre expressão, que inclui a crítica, garantido pela Constituição Federal. Foi o que entendeu a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao confirmar sentença que absolveu a TV Record e a apresentadora Adriane Galisteu de indenizar o fabricante do StepDucha. O julgamento do recurso de apelação ocorreu no dia 27 de abril. Cabe recurso.

O caso é originário da Comarca de Pelotas, a 250km de Porto Alegre. O microempresário ajuizou ação de danos morais e patrimoniais. Alegou que o seu produto — conhecido pela marca StepDucha — teria sido ridicularizado no programa de Adriane Galisteu. A emissora chegou a colocar um tarja, em que se lia a palavra ‘‘REPROVADO’’. O programa foi ao ar em 16 de abril de 2002.

Conforme o autor, este fato causou grande abalo na sua imagem e na do produto, com reflexos na vendas. Pelos prejuízos e o sofrimento suportado, pediu direito de resposta, a retratação da emissora e da apresentadora, bem como a condenação ao pagamento de indenização por danos morais e patrimoniais.

A TV Record negou ter ridicularizado o produto. Alegou que não foi mencionada qualquer expressão difamatória durante o programa. Destacou que sequer houve citação do nome do produto do autor. Já a apresentadora Adriane Galisteu sustentou ausência de provas do ato ilícito, pois não fez crítica alguma ao produto. Por fim, disse prestou todas as informações acerca do produto ao público — preço, características e modo de uso.

A apresentadora pediu a transcrição da fita de vídeo do programa e indicou testemunhas. Na audiência conciliatória, as partes não chegaram a um acordo. Após uma sucessão de lances processuais, entre os quais um pedido de impugnação da perícia por parte de Adriane Galisteu, o processo seguiu para a sentença.

O juiz de Direito Gerson Martins, da 4ª Vara Cível, considerou o caso bastante singelo, ‘‘na medida em que não se vislumbra a prática de ato ilícito algum, por quaisquer das demandadas’’. Ele destacou que a opinião das convidadas do programa não teve caráter pejorativo.

‘‘De acordo com a transcrição do programa, às fls. 226/227, não impugnada, vê-se que Elaine, Lívia, Fabiana e Sergio Malandro, ao ser anunciado o teste do produto em questão, consideraram-no, respectivamente, ‘muito interessante’, ‘muito legal’, ‘divertido’ e ‘muito bom’ e ‘maneiro’. Ou seja, foram usados apenas adjetivos positivos’’, citou ele.

O julgador também citou trechos do programa em que o StepDucha foi criticado pela pouca praticidade, como aquele em que Lívia disse frases como: ‘‘é um trabalho para montar" e "eu não compraria’’. A ‘‘maladrinha’’ Sara também reprovou o produto dizendo: ‘‘não gostei, porque tem que ter muito espaço no carro, então… não está aprovado’’.

Com base na transcrição, o julgador também ficou convencido de que Adriane Galisteu, em momento algum, emitiu consideração negativa, tampouco reprovou o produto. Em determinado momento, diz a apresentadora: ‘‘Reprovado pelas malandrinhas!!!’’. Ou seja, se reportou apenas à opinião de duas pessoas que estavam testando o StepDucha no programa, sem veicular qualquer informação equivocada. 

Por fim, ele acrescentou que o programa de Adriane Galisteu é meramente de entretenimento. ‘‘Tivesse a reprovação sido feita por algum órgão técnico ou oficial, a situação, então, seria diferente. Contudo, a reprovação, no caso, constituiu, repita-se, mera opinião, e, demais disso, de duas pessoas leigas, sem poder de influência sobre os telespectadores, já que a celebridade demandada (Adriane) nada referiu de negativo a respeito do produto.’’ Com isso, julgou improcedentes os pedidos do autor.

No Tribunal de Justiça, o autor fez os mesmos pedidos e exibiu os mesmos argumentos da ação inicial. Segundo ele, o manejo errôneo do produto em frente às câmeras de TV minimizou sua utilidade. A apresentadora Adriane Galisteu refutou as alegações e pediu a confirmação da sentença. A TV Record não apresentou contrarrazões.

A relatora do recurso de apelação, desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi, também entendeu que o programa não teve a intenção deliberada de prejudicar, ‘‘sequer tendo sido exibida a marca do invento levado a conhecimento do público e submetido à apreciação de alguns convidados, justamente por sua originalidade’’.

Trata-se, conforme a relatora, do exercício do direito à livre expressão, como se vê no inciso IV do artigo 5º da Constituição. Já o artigo 220 da Carta resguarda a liberdade de informação, não se admitindo sua limitação em qualquer veículo de comunicação social. 

‘‘Não há de se entender (…) que o programa de entretenimento se destinasse a uma exibição técnica do produto ou à busca de mercado de consumo, em verdadeira estratégia de marketing. A crítica desfavorável por certo causa insatisfação, mas não justifica, em absoluto, a pretensão indenizatória veiculada, ao menos se exercida sem abuso ou temeridade, como bem destacado pelo magistrado’’, finalizou a desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi. O voto foi seguido, por unanimidade, pelos desembargadores Tasso Caubi Soares Delabary e Leonel Pires Ohlweiler.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o Acórdão.

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