Fisco recorre para tributar coligadas no exterior
6 de abril de 2011, 18h28
Decidida em favor dos contribuintes nesta terça-feira (5/4), a briga pela incidência do IRPJ e da CSLL sobre saldos positivos de equivalência patrimonial pode estar longe de terminar. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional vai recorrer da decisão do Superior Tribunal de Justiça que declarou a cobrança ilegal, como informou o órgão em nota enviada à ConJur.
A 2ª Turma da corte foi unânime ao declarar que a Instrução Normativa 213, da Receita Federal, ao regulamentar a Medida Provisória 2.158-35, de 2001, avançou sobre a norma e criou a tributação sobre o saldo positivo calculado pelo método da equivalência patrimonial entre os balanços de empresas brasileiras e suas coligadas ou controladas no exterior. De acordo com os ministros, a legislação permite apenas a tributação sobre o lucro efetivo das subsidiárias, e não sobre outros fatores que causem saldo positivo no patrimônio, como variações cambiais e aumento de capital com ágio.
Segundo a PGFN, porém, “a IN SRF nº 213/02 não ultrapassou os limites regulamentares, apenas concretizando a determinação constante do art. 74 da MP nº 2.158-35/01, ainda que esta última norma não tenha feito explícita menção à expressão ‘método de equivalência patrimonial’”, diz a nota. “A Fazenda Nacional continuará defendendo a integral validade da utilização do método de equivalência patrimonial — valendo-se eventualmente dos instrumentos processuais postos ao seu alcance neste ou em outros processos.”
O sistema contábil da equivalência patrimonial é a forma pela qual o fisco federal sabe o quanto empresas brasileiras têm em investimentos no exterior. As subsidiárias e coligadas em outros países informam anualmente a posição de seu patrimônio ao fecharem o balanço. A Instrução Normativa 247, de 1996, da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), define o cálculo da equivalência pelo “valor do investimento determinado mediante a aplicação da percentagem de participação no capital social sobre o patrimônio líquido da coligada, sua equiparada ou controlada”. Porém, entre os fatores de alteração no saldo de investimentos estão elementos que não significam, necessariamente, lucro.
“Uma empresa brasileira que detivesse, em 2001, US$ 10 milhões em investimento em empresa controlada no exterior, a uma cotação aproximada de R$ 2,30 por dólar, teria após um ano e uma cotação de R$ 3,50 por dólar, o resultado da equivalência patrimonial de R$ 12 milhões, mesmo sem ter gerado lucro algum”, explicou, em reportagem publicada nesta terça pela ConJur, o tributarista Daniel Corrêa Szelbracikowski, da Advocacia Dias de Souza. Ele defendeu a empresa Yolanda Participações, do grupo Souza Cruz, no recurso levado pelo fisco ao STJ.
Mesmo assim, ao regulamentar a Medida Provisória 2.158-35, de 2001, a Receita Federal obrigou os contribuintes a recolherem o IRPJ e a CSLL sobre o saldo positivo, ainda que a variação não tenha sido causada por lucro no exterior. “Os valores relativos ao resultado positivo da equivalência patrimonial, não tributados no transcorrer do ano-calendário, deverão ser considerados no balanço levantado em 31 de dezembro do ano-calendário para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL”, diz o parágrafo 1º do artigo 7º da Instrução Normativa 213, de 2002.
Para o ministro Mauro Campbell Marques, relator do caso, o mecanismo contábil da equivalência “permite, em tese, a tributação na empresa investidora do lucro obtido com o investimento em empresas investidas”, mas a tributação “foi vedada pelo disposto no artigo 23, caput e parágrafo único, do Decreto-lei 1.598/1977, para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, e pelo artigo 2º, parágrafo 1º, ‘c’, 4, da Lei 7.689/1988, para a CSLL, mediante artifício contábil que elimina o seu impacto na determinação do lucro real (base de cálculo do IRPJ) e na apuração da base de cálculo da CSLL”. Foi o que ele afirmou em seu voto, em dezembro, acompanhado integralmente pela 2ª Turma nesta terça, após voto-vista do ministro Castro Meira.
“A variação positiva ou negativa do valor do investimento, muito embora tenha impacto sobre o lucro líquido da empresa investidora, não adentra a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, por força de lei”, disse Mauro Campbell. Para ele, apenas o lucro das coligadas poderia ser tributado, com base no que diz a Lei 9.249, de 1995, que deu novas regras ao dois tributos. “Resultado positivo de equivalência patrimonial não corresponde necessariamente a lucro”, acompanhou o ministro Castro Meira na ementa de seu voto-vista.
No entanto, a PGFN aponta reparos necessários ao voto do relator. “A Fazenda Nacional recorrerá do acórdão da 2ª Turma em questão no mínimo para corrigir o equívoco da parte dispositiva do referido acórdão, pois, conforme as conclusões postas no voto do ministro relator (…), deveria haver sido dado ao menos parcial provimento ao recurso especial para reconhecer a invalidade apenas em parte da utilização do método de equivalência patrimonial”, afirma a nota.
Além disso, o órgão lembra que a validade do método de equivalência será discutida pelo Supremo Tribunal Federal. “Há recurso extraordinário da Fazenda Nacional já admitido na origem no caso sob comento (REsp nº 1.211.882/RJ), bem como há recurso extraordinário, igualmente já admitido, da empresa Arnoldo Schneider Participações Ltda. no bojo do REsp nº 946.001/RS.” O último Recurso Especial citado foi rejeitado pela 1ª Turma do STJ sob justificativa de que a discussão é constitucional.
A Procuradoria também observa que a decisão dessa terça não impediu a tributação da variação positiva da equivalência patrimonial, salvo nos casos em que o saldo não corresponder a lucro. “O lucro inserido no resultado positivo da equivalência deve ser tributado normalmente. O que não deve ser objeto de tributação são as demais parcelas que integram a equivalência patrimonial, a exemplo da variação cambial do investimento”, diz a nota. “Foi reconhecida, portanto, a invalidade da utilização do método de equivalência patrimonial, previsto no art. 7º da IN SRF nº 213/02, apenas no que exceder ‘a proporção a que faz jus a empresa investidora no lucro auferido pela empresa investida’, nos termos do art. 1º, § 4º, da mesma instrução normativa.”
A cobrança dos tributos sobre saldos resultantes de variação cambial, por exemplo, foi considerada indevida pela própria Receita. A Solução de Consulta 54/2003, da 9ª Região Fiscal, afirma que “a contrapartida de ajuste do valor do investimento em sociedades estrangeiras, coligadas ou controladas que não funcionem no país, decorrente da variação cambial, não será computada na determinação do lucro real”, assim como “não será computada na determinação da base de cálculo da CSLL”. A PGFN afirma que essa foi a única ressalva admitida pela Receita.
Leia a nota da PGFN, e clique aqui para ler a Solução de Consulta 54/2003.
NOTA
Sobre o julgamento ocorrido no STJ na terça-feira (6), do recurso 211.882, a CRJ/PGFN informa que a Solução de Consulta mencionada no julgamento reconheceu apenas que a variação cambial inserida na equivalência patrimonial não corresponde a lucro, de forma que não haveria fundamento legal para a sua tributação.
No entanto, a variação positiva da equivalência patrimonial pode sim corresponder ao lucro apurado pela investida, o qual deve ser tributado. O voto do Ministro Mauro Campbell está bem claro nesse sentido.
Em outras palavras, o lucro inserido no resultado positivo da equivalência deve ser tributado normalmente. O que não deve ser objeto de tributação são as demais parcelas que integram a equivalência patrimonial, a exemplo da variação cambial do investimento.
Dessa forma, a Solução de Consulta nº 54/2003 simplesmente interpretou o art. 7º, § 1º, da IN 213/2002 em conformidade à legislação de tributação universal, ou seja, no sentido de que somente deve ser tributada a parcela da equivalência que corresponda aos lucros auferidos no exterior. A Consulta da 9ª, portanto, não reconheceu a "ilegalidade da IN 213".
Foi reconhecida, portanto, a invalidade da utilização do método de equivalência patrimonial, previsto no art. 7º da IN SRF nº 213/02, apenas no que exceder "a proporção a que faz jus a empresa investidora no lucro auferido pela empresa investida", nos termos do art. 1º, § 4º, da mesma instrução normativa.
A Fazenda Nacional continuará defendendo a integral validade da utilização do método de equivalência patrimonial – valendo-se eventualmente dos instrumentos processuais postos ao seu alcance neste ou em outros processos -, uma vez que:
1. tal método sempre foi aceito pela legislação comercial (vide o art. 248 da Lei nº 6.404/76, referendado pelo art. 21 do Decreto-lei nº 1.598/77) para fins de refletir, no balanço patrimonial das empresas brasileiras, os investimentos em coligadas e controladas, sendo o resultado positivo obtido por meio da utilização desse método, logicamente, o mais adequado para refletir os lucros auferidos por empresas brasileiras por meio de coligadas e controladas situadas no estrangeiro;
2) a IN SRF nº 213/02 não ultrapassou os limites regulamentares, apenas concretizando a determinação constante do art. 74 da MP nº 2.158-35/01, ainda que esta última norma não tenha feito explícita menção à expressão “método de equivalência patrimonial”;
3) o fato de o art. 25, § 6º, da Lei nº 9.249/95 ressalvar que “os resultados da avaliação dos investimentos no exterior, pelo método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto na legislação vigente” – ou seja, não integrariam, naquele momento, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL nos termos do Decreto-lei nº 1.598/77 e da Lei nº 7.689/88 – somente fazia sentido naquele específico estágio normativo, no qual a tributação de lucros auferidos por intermédio de controladas e coligadas no exterior ocorria conforme o regime de caixa, não tendo mais qualquer sentido tal ressalva, à luz do atual marco legal, que prevê a adoção do regime de competência para tributação de rendas no exterior (MP nº 2.158/35/01);
A Fazenda Nacional recorrerá do acórdão da 2ª Turma em questão no mínimo para corrigir o equívoco da parte dispositiva do referido acórdão, pois, conforme as conclusões postas no voto do ministro relator já mencionadas acima, deveria haver sido dado ao menos parcial provimento ao recurso especial para reconhecer a invalidade apenas em parte da utilização do método de equivalência patrimonial.
A questão acerca da validade do método de equivalência patrimonial será submetida ao crivo do Supremo Tribunal Federal, pois há recurso extraordinário da Fazenda Nacional já admitido na origem no caso sob comento (REsp nº 1.211.882/RJ), bem como há recurso extraordinário, igualmente já admitido, da empresa Arnoldo Schneider Participações Ltda. no bojo do REsp nº 946.001/RS, distribuído à 1ª Turma e que teve seu conhecimento negado, por se reputar constitucional a discussão travada naqueles autos.
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